Enquanto a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, declarava em Porto Alegre a intenção do Governo Federal de negociar, com os deputados, emendas à proposta de Código Florestal que tramita no Congresso Nacional, o presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia (PT/RS), anunciava a votação para os dias 3 e 4 de maio. A precipitação em votar o projeto ainda neste semestre, defendida também pela presidenta Dilma Rousseff, vai de encontro ao pedido de mais tempo para debater o tema, como querem representantes do movimento ambiental e de agricultores familiares gaúchos.
Na opinião do deputado federal Elvino Bohn Gass (PT), mentor da audiência realizada no último dia 19, há várias razões favoráveis às propostas apresentadas pela ministra. “Fica faltando apenas a prorrogação do prazo para a averbação da Reserva Legal” que, pelo Decreto 7029, em vigor, vence no próximo dia 11 de junho. “Há uma enorme possibilidade disso ocorrer”, comemora. Depois de votado pela Câmara, o projeto vai para o Senado.
Durante a audiência em Porto Alegre, a ministra repetiu a necessidade de corrigir a legislação, adequando-a a cada ecossistema. “Criamos uma proposta de consenso”, anunciou a ministra, se referindo ao encontro com os ministros Antônio Palocci (Casa Civil), Wagner Rossi (Agricultura), Afonso Florence (Desenvolvimento Agrário) e Luiz Sérgio (Relações Institucionais), além do deputado Maia e do relator do projeto, Aldo Rebelo (PCdoB/SP). A ideia é que os pontos que o Executivo considera importantes sejam incorporados ao texto de Rebelo, que se diz "disposto a acolher quase tudo".
Maia admitiu que não haverá um acordo total sobre o parecer, mas acredita que “atenderá a 99% dos dispositivos do Código”. Ele informou ainda que, na próxima semana, os ministros da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário e do Meio Ambiente devem explicar, aos líderes e bancadas, a posição conjunta do Governo sobre o Código.
Aplausos e vaias
Entre aplausos e vaias, a pressão do público perdurou durante toda a manhã no lotado auditório Dante Barone. Participaram da audiência pública mais de mil pessoas, entre agricultores familiares, ambientalistas, políticos, dirigentes de órgãos públicos e estudantes.
Na conferência, a ministra defendeu o “olhar para o futuro”, incluindo no Código Florestal a ocupação de áreas de risco urbanas, “cuja decisão é do Estado”, assim como o zoneamento ambiental a ser feito em todo o país, “acolhendo, no Código Florestal, todos os Brasis”, declarou Izabella. Ela cita, como orientação do Governo à proposta do substitutivo, a regularização ambiental que impeça a produção ilegal; a rejeição à anistia para quem desmatou; e a desburocratização de licenciamentos e cadastros, a partir de uma autodeclaração de APP (Área de Preservação Permanente) e de Reserva Legal. “A regularização ambiental está vinculada à adesão ao cadastro”.
Inclusão da agricultura familiar
Para Izabella, a agricultura familiar terá destaque no Código Florestal, por ser considerada área de interesse de proteção da sociedade. Ela explica que a riqueza de biodiversidade, sob domínio do produtor, pode gerar renda a partir da regularização do uso de RL. “A lei tem que tratar a inclusão, não a exceção, até porque a situação do RS não é a mesma da Amazônia, tampouco do Vale do São Francisco”, comparou.
A RL será somada às APPs, atingindo 96% das propriedades rurais, ou 24% do território ocupado pelo pequeno e médio produtor. Além disso, a ministra garante a dispensa de averbação da RL, exceto quando em compra e venda da propriedade. “O produtor redige um Ato Declaratório da APP ou RL e a competência de averbar é dos estados. A função é estadual”, frisou. Para a ministra, com a declaração facilitada, a restauração das APPs “surge ao natural”.
De acordo com o novo projeto, 50% da RL podem ser recompostas com espécies exóticas, assim como as margens de rios, APPS que admitem, por lei, a restauração de 15 dos 30 metros de preservação. A admissão de plantio de espécies exóticas em RL gerou críticas. “É um retrocesso. Se isso for permitido, que seja somente nas áreas de agricultura familiar, limitadas em quatro módulos fiscais”, observa Vicente Medaglia, do InGá Estudos Ambientais, ONG que integra o Fórum em Defesa do Código Florestal.
Já a manutenção das APPs, consideradas “joias da coroa” pelo Governo Federal, garante condições ambientais para margens de rios e encostas de morros. “O governo coloca APP no projeto de lei e reconhece os usos consolidados, excluindo, deste segmento (de APP), as plantações de parreirais do RS, maçãs de SC e cafés de MG”, disse Izabella, ao explicar que usos consolidados são áreas de interesse social, de utilidade pública ou de baixo impacto. “Com essas medidas, estamos excluindo muitos agricultores da ilegalidade”, diz.
Políticas à preservação
Ainda no dia 19, em almoço no Palácio Piratini, o governador Tarso Genro entregou à ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, proposta do Estado para a realização do Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE) no RS. Parte dos recursos destinados ao zoneamento já está prevista na carta consulta ao Banco Mundial. O restante será do Governo Federal. A ministra colocou uma equipe técnica à disposição do Governo gaúcho, para ajustar a parceria.
Mantendo a pressão sobre o Governo Federal a respeito da votação do Código Florestal, que deve ocorrer no início de maio, a Rede de ONGs da Mata Atlântica promove, na próxima quinta-feira, dia 28, o ato Todos em Defesa do Código Florestal, a partir das 10h, na escadaria da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
No RS, a Assembleia Permanente de Entidades de Defesa do Meio Ambiente (Apedema) mantém encontros semanais, debatendo inclusive a reapresentação do Projeto de Lei 154/2009, que descaracteriza toda a legislação ambiental do Estado.
Além da Apedema, diversas outras instituições entregaram manifestos para a ministra Izabella Teixeira apresentar ao Governo Federal e negociar com os deputados. A presidenta da Câmara de Vereadores, Sofia Cavedon (PT), entregou uma moção, que será encaminhada também à presidenta Dilma Roussef e aos deputados federais, solicitando mais tempo ao debate com a sociedade. “Também queremos que o Governo retire o prazo de averbação das APPs, que vence no próximo dia 11 de junho”, anuncia Sofia.
Técnicos da Fundação Zoobotânica do RS lançaram um manifesto, que pode ser acessado pelo http://pt.scribd.com/doc/53031724/Manifestacao-dos-Tecnicos-da-FZB-sobre-Codigo-Florestal .
A Sociedade Brasileira de Pesquisa e pela Ciência (SBPC) também se manifestou pelo http://www.sbpcnet.org.br/site/arquivos/arquivo_294.pdf .
Em resumo:
Entre as propostas a serem apresentadas pelo Governo Federal aos deputados estão o reconhecimento de que a agricultura familiar cumpre uma função social, é de interesse público e de baixo impacto ambiental; a manutenção da exigência de Reserva Legal com permissão para os produtores familiares somarem às APPs; a garantia do pagamento por serviços ambientais a quem preserva; o reconhecimento da legalidade dos cultivos consolidados em áreas de encostas; a permissão para que o produtor familiar cadastre sua área de RL sem necessidade de averbação em cartório; e a decisão de não anistiar quem cometeu crimes ambientais.
(Por Adriane Bertoglio Rodrigues, para EcoAgência Solidária de Notícias Ambientais, 25/04/2011)