Como primeiro chefe de Estado estrangeiro a visitar o Japão após a catástrofe de 11 de março, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, exigiu nesta quinta-feira (31/03) em Tóquio padrões internacionais de segurança para as usinas nucleares.
Sarkozy sugeriu ainda a realização de uma conferência internacional sobre o tema, que deverá reunir as 20 principais economias do mundo (G20) em Paris, em maio próximo. Com 80% da energia produzida em seu país por usinas nucleares, Sarkozy tem bons motivos para tratar da questão.
Logo após a catástrofe nuclear em Fukushima, o presidente francês deixou claro que uma desistência da energia nuclear estaria fora de cogitação em seu país. Afinal, os reatores franceses seriam os mais seguros do mundo, assegurou Sarkozy. E o ministro francês da Indústria, Eric Besson, completou: os franceses terão que enfiar a mão mais fundo no bolso caso o país venha a produzir menos energia nuclear.
Pouco antes, os verdes franceses haviam proposto um referendo para decidir sobre a desistência nuclear – uma novidade na França, onde a Areva, maior empresa local de energia nuclear, com participação majoritária estatal, é quase intocável.
"Na França, tivemos a sorte de realizar a maior parte do programa nuclear numa época em que a opinião pública queria reagir à crise do petróleo", disse Bertrand Barré, que foi diretor de comunicação científica na central parisiense da Areva e hoje é conselheiro da empresa.
Segundo o ex-diretor da Areva, entre 1974 e 2000 o programa nuclear francês teve o objetivo de produzir energia independentemente do petróleo. Havia um grande consenso em torno disso, afirmou. "E como a energia nuclear funcionava bem, como não existiam dramas, as pessoas se acostumaram."
Eles se reuniram em torno da sigla Criirad – Comissão de Pesquisa e Informação Independentes sobre a Radioatividade, na sigla em francês. O físico Roland Desbordes dirige esse centro de pesquisa e informação independente e único na França.
Segurando uma amostra de 40 gramas de terra, ele afirma que até hoje se pode comprovar a presença da radiação de Tchernobyl no país. "Isso aqui é césio 137", diz Desbordes, apontando para a amostra, "com uma meia-vida de 30 anos, como detectamos em laboratório. Depois de 25 anos, sua atividade não diminuiu nem pela metade. Ainda contém cerca de 60% da radioatividade de 25 anos atrás".
Cidadãos nunca foram consultados
Em Lyon, terceira maior cidade da França, está a central de Sortir du Nucléaire (sair do nuclear), uma rede que reúne quase 900 associações em todo o país. Todas dividem o mesmo objetivo: a desistência da energia nuclear. Elas exigem que os 16 reatores franceses mais antigos, ou seja, aqueles com mais de 30 anos de funcionamento, sejam desativados.
O vice-coordenador do grupo, Xavier Rabilloud, aponta para o mapa de um país abarrotado de usinas nucleares, em funcionamento ou desligadas, com depósitos de lixo nuclear, minas de urânio, instalações de processamento, reatores de pesquisa e instalações militares nucleares, bem como portos para submarinos nucleares ou o porta-aviões nuclear Charles De Gaulle.
"É realmente verdade que o setor nuclear na França se encontra completamente fora da zona de influência democrática", constata Rabilloud. "É preciso que se saiba que os cidadãos franceses jamais foram consultados sobre o programa nuclear, nem de forma direta tampouco através de seus deputados."
Extensão de vida útil para 40 anos
O bloco 1 da central nuclear em Tricastin, no Ródano, teve sua vida útil prolongada para 40 anos em dezembro de 2010 – foi o primeiro caso do tipo na França. Atualmente, uma prorrogação da vida útil de todos os reatores franceses para 50 anos está em discussão entre a Areva e as autoridades de segurança nuclear.
E isso levando em conta que a França produz mais energia do que precisa, diz Rabilloud. A indústria nuclear, por outro lado, vê a situação de forma diferente: quando as usinas alemãs forem desativadas, os nossos vizinhos precisarão de mais energia – que será fornecida por nós. Ou seja, um negócio lucrativo.
(DA DEUTSCHE WELLE, 14/04/2011)