O governo japonês especulou nesta quarta-feira (30/03) lançar mão de uma série de soluções alternativas para o desastre nuclear de Fukushima, como cobrir os reatores com tecido especial, jogar uma resina sintética sobre os destroços ou enviar robôs para fazer o trabalho mais arriscado.
A pressão por soluções inusitadas cresce. Passadas quase três semanas do desastre, a empresa Tokyo Electric Power Company (Tepco), operadora da usina, admitiu não ter ideia de quando a pior crise nuclear desde Chernobyl estaria sob controle.
Uma medida, paliativa e provisória, divulgada pela mídia local, prevê cobrir as três unidades de reatores danificadas com lonas especiais e filtros de ar para limitar a radiação. Outro plano é ancorar um navio-tanque vazio ao lado do reator 2, para onde os trabalhadores possam bombear grandes quantidades de água altamente radioativa da unidade, segundo a imprensa local.
Nesta quinta-feira, as autoridades devem começar a jogar uma resina sintética solúvel em água sobre os destroços da central nuclear de Fukushima. A resina poderia impedir que o vento disperse partículas de poeira contaminadas com radioatividade.
“Estamos numa situação sem precedentes, por isso precisamos pensar em estratégias diferentes, além das que normalmente consideramos”, afirmou um funcionário do governo. O porta-voz do governo, Yukio Edano, disse que autoridades e especialistas nucleares estão discutindo todas as possibilidades, incluindo as mencionadas na imprensa.
Tepco só quer desativar quatro dos seis reatores
O governo japonês afirmou que não pretende permitir que os seis reatores em Fukushima voltem a funcionar. “É muito claro, quando consideramos as circunstâncias sociais”, afirmou Edano. O grupo nuclear Tepco, porém, não descartou que os reatores 5 e 6 possam voltar a funcionar. A Tepco quer inicialmente apenas desativar permanentemente as quatro unidades danificadas, do reator 1 ao 4.
No momento, o Japão enfrenta um dilema para conter a crise nuclear. Os técnicos bombeiam água para os reatores para evitar um superaquecimento. Como consequência, ocorrem vazamentos de água altamente radioativa, que provocam a suspensão dos trabalhos de reparo e ameaçam o meio ambiente.
Os níveis de iodo radioativo detectados nas águas do Oceano Pacífico, perto do local da usina, subiram para um novo recorde, atingindo 3.355 vezes o limite legal. O nível detectado em medição anterior, realizada dias atrás, era 1.850 vezes mais alto que o máximo permitido.
Com funções importantes da sala de controle de Fukushima ainda desativadas, os peritos não podem detectar exatamente o que está acontecendo dentro dos reatores. Alguns especialistas internacionais emitiram alertas de que um derretimento nuclear dos reatores já pode estar acontecendo. Um deles é Richard Lahey, que foi chefe de pesquisa de segurança para reatores de água fervente na General Electric, quando a empresa participou da instalação das unidades de Fukushima, e que foi citado pelo jornal britânico The Guardian.
AIEA e Greenpeace querem ampliar área de evacuação
O grupo ambientalista Greenpeace divulgou ter feito medições próprias, nas quais determinou altos níveis de radioatividade também além da zona de evacuação, em alguns casos mais altos do que dentro dela. A organização considerou os resultados tão preocupantes que reivindicou do governo japonês uma ampliação da área de risco dos atuais 20 quilômetros em torno da usina para 40 quilômetros.
Medições do Greenpeace e da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) identificaram altos níveis de radioatividade na pequena cidade de Iitate, a cerca de 40 quilômetros da central de Fukushima. Por isso tanto o Greenpeace como a AIEA recomendaram ao governo japonês que ordene a evacuação da cidade de 7 mil habitantes.
O especialista em radiação do Greenpeace Jan van de Putte pediu que o governo japonês tome medidas mais agressivas para evacuar os residentes dos arredores da usina, alertando para as consequências para a saúde pública a longo prazo. “Expor um grande número de pessoas a esse nível de radiação cria um risco coletivo que é muito significativo a longo prazo, em termos de anos. Nossa preocupação principal é um aumento da incidência de câncer”, disse.
Crise mina saúde de trabalhadores
O nervosismo cresce entre os trabalhadores, em face de inúmeras dificuldades. Eles têm se queixado de falta de comida, de locais para descanso e de cobertores. Os homens estão chegando ao limite do esgotamento e temem sofrer danos permanentes à saúde, segundo um gerente de uma empreiteira contratada pela operadora Tepco, em entrevista ao jornal Asahi Shinbun.
Conforme estimativas de especialistas, pode levar meses até que uma derretimento nuclear de reator seja controlado. A Tepco prometeu melhorar as condições de trabalho.
A tensão da crise parece ter também atingido a saúde do presidente da Tepco, Masataka Shimizu. O executivo, de 66 anos, foi hospitalizado na terça-feira à noite, com pressão alta e tonturas. Ele não aparece em público há mais de duas semanas.
As ações da empresa caíram para cerca de um quinto do valor que tinham antes do terremoto, em meio a críticas pesadas. As mais recentes afirmam que a companhia havia ignorado alertas para o perigo de danos causados por tsunami.
Robôs americanos para o Japão
Os Estados Unidos emprestaram ao Japão robôs de um modelo testado em batalhas no Iraque e no Afeganistão. As máquinas podem filmar e limpar escombros nos prédios dos reatores danificados, em lugares que não podem ser penetrados por pessoas, por causa dos altos níveis de radiação.
O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, prometeu ajuda contínua durante conversa com o primeiro-ministro japonês, Naoto Kan, pela terceira vez desde o desastre, que deixou mais de 11 mil mortos confirmados e mais de 16 mil pessoas tidas como desaparecidas.
“Os Estados Unidos estão decididos a apoiar o povo do Japão em seus esforços para lidar com os efeitos devastadores da tragédia, tanto a curto como a longo prazo”, disse Obama.
Uma equipe de peritos da Areva, fabricante estatal francês de reatores, chegou nesta quarta-feira ao Japão para assistir os técnicos da Tepco.
(Deutsche Welle, EcoDebate, 31/03/2011)