O projeto de criação da maior Unidade de Conservação marinha do País, a UC Cordilheira Submarina Vitória – Trindade, com 350 mil km², ganhou mais um aliado. A Sociedade Brasileira de Silvicultura (SBS), em carta à ministra do Meio Ambiente, Isabela Teixeira, manifestou apoio integral à iniciativa. Se criada, a UC englobará toda a cordilheira marinha na região, se tornando a maior UC marinha do Brasil.
A proposta, apresentada por André Ruschi, biólogo e diretor da Estação Biológica Marinha Ruschi, em Santa Cruz, norte do Estado, foi protocolada em dezembro de 2010, no Ministério do Meio Ambiente. A ideia é a criação de um mosaico de unidades, prevendo-se inclusive explorações minerais.
Entre os ambientalistas, a proposta é classificada como um sonho possível de biólogos, oceanógrafos, geógrafos, geólogos e representantes da sociedade civil organizada. A informação é que as características da região são elementos de pesquisas atuais.
A região, segundo a proposta, é a verdadeira fronteira climática entre o norte e o sul do Brasil. Ao todo, o arquipélago de Trindade está a 1.600 km de Vitória e a defesa de André Ruschi é que, se criada a UC, além do País e do Mundo, serão beneficiados inclusive os municípios de Vitória, Vila Velha, Serra, Fundão, Guarapari e Aracruz, entre outros do litoral capixaba.
Esta cordilheira submarina, associada aos movimentos da Corrente do Brasil, fluxo do Rio Doce e variações estacionais, provoca diversos fenômenos físicos e biológicos, caracterizando região submersa rica de relevos, vales, abismos, fendas, bancos de algas, área de reprodução de inúmeras espécies de peixes e crustáceos de importância econômica, ecossistemas de altíssima biodiversidade, já estando assinaladas as maiores taxas de biodiversidade de peixes, algas e corais zoantídeos do País.
“Basta citarmos três de seus correspondentes para entendermos sua importância: Galápagos, Abrolhos e Fernando de Noronha. Entre Vitória e Trindade, podemos assinalar pelo menos uns 10 locais equivalentes a Abrolhos em riqueza de espécies e beleza submarina quase que totalmente desconhecidos da ciência”, diz o projeto apresentado ao Ministério do Meio Ambiente.
O estudo sobre a região diz ainda que a importância da Ilha de Trindade para a ciência mundial é enorme, pois se trata de situação similar às Ilhas Galápagos, porém localizada no oceano atlântico, sendo portanto fundamental para a compreensão dos elos evolutivos da vida na parte leste do continente sul-americano, em função do seu período de origem geológica.
A importância da criação da UC se dá, sobretudo, pela necessidade de impedir a degradação na região, que segundo o estudo, passa por um massacre continuado, devido à inserção de cabras e animais domésticos na ilha, assim como incêndios.
Além da preservação, a conservação oficial da região permitirá o desenvolvimento de pesquisas sobre manejos autossustentáveis dos recursos marinhos, exploração de recursos minerais e mapeamento do solo e subsolo da área, assim como a realização de um levantamento biológico na região, prevenção do tráfico via marítima e, inclusive, a implantação de um sistema de previsão de maremotos na costa do Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo.
A criação da UC também amplia a chance de estudos científicos na região, o estabelecimento de normas de segurança e a retirada de animais exóticos da ilha.
Tombamento
Em janeiro de 2011, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) tombou provisoriamente a Ilha de Trindade. A medida menciona o processo de tombamento em tramitação desde 2007 e reconhece o valor histórico e paisagístico da ilha. Com isso, toda intervenção na Ilha de Trindade terá que passar pela avaliação do instituto.
A ilha, considerada um marco natural no Atlântico, é a mais distante e oriental porção do território nacional emersa em águas oceânicas, o que lhe confere relevante valor simbólico. A excepcionalidade paisagística do local reside na singular formação geológica, resquício do cone de um grande vulcão submarino.
Com a proteção federal, fica portanto reconhecido o excepcional valor histórico e paisagístico da ilha, a ser inscrita nos Livros do Tombo Histórico e do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, após ser submetida ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural.
O que se sabe sobre a Ilha é que, apesar das tentativas de implantar uma Unidade de Conservação (UC), como foi proposto por meio do projeto para implantação da Reserva Ecológica de Trindade-Martins Vaz, a região já sofreu muitas intervenções humanas que impedem o reconhecimento como uma UC.
A Ilha da Trindade é citada na literatura e na historiografia desde 1501, quando foi localizada pelo navegador galego João da Nova. Um ano depois, recebeu o nome da Trindade, dado por outro navegador português, Estevão da Gama, que até hoje conserva. Após períodos de utilização do local por ingleses, o Brasil obteve a reintegração de posse em 1895. Desde então, as ocupações estiveram ligadas às duas guerras mundiais, para finalidades de defesa do País. Desde 1957, a ilha é uma base permanente da Marinha.
Estudos indicam que a ilha surgiu há aproximadamente três milhões de anos, da zona abissal do Atlântico Sul, por atividades vulcânicas. As profundidades oceânicas do seu redor atingem 5.800 metros. A parte emersa atinge até 620m, cobrindo 9,28 km². O clima é do tipo oceânico tropical, com temperaturas entre 25,2° C e 17,3°C.
Até 1850, a ilha era coberta por uma floresta de árvores colubrina granulosa, hoje inexistente. Abriga uma diversificada fauna marinha com recifes de algas calcáreas, invertebrados, peixes, aves e tartarugas marinhas. Desde 1957 é guarnecida por um posto da Marinha do Brasil, com cerca de 40 homens, membros da guarnição e dois oficiais (comandante e médico), que permanecem na ilha por períodos de quatro meses. Viagens de reabastecimento são realizadas a cada dois meses, para troca de metade da guarnição. Trindade possui uma estação meteorológica que diariamente envia dados para a Diretoria de Hidrografia e Navegação.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 29/03/2011)