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acidente nuclear passivos da energia atômica desastre de chernobyl
2011-03-22 | Mariano

O desastre atômico no Japão, ainda sem previsão de ter fim, já causa uma mudança política importante na Europa. Na última terça-feira (15/03), enquanto mais explosões ocorriam na usina de Fukushima, a primeira ministra da Alemanha, Angela Merkel, anunciava uma reviravolta nos planos de prorrogar o uso das usinas atômicas do país.

A coalisão dos Democratas Cristãos com os Liberais determinou depois de uma reunião com governadores dos estados onde existem usinas nucleares, uma moratória de três meses no prolongamento do funcionamento de oito das 17 usinas atômicas do país. Isso significa que até fins de Maio as usinas de Neckarwestheim I, Philippsburg I (no estado de Baden-Württemberg), Biblis A e B (em Hessen), Isar I (na Bavária), Unterweser (na Baixa Saxônia), Brunsbüttel e Krümmel (no estado de Schleswig-Holstein) ficarão desligadas do sistema elétrico, aguardando uma reavaliação de segurança.

O critério para tal moratória é a idade dos reatores. Sete das usinas foram construídas antes de 1980. Só a usina de Krümmel é mais recente, de 1983, mas vem enfrentando panes e paralisações consecutivas há pelo menos dois anos.

Oportunismo eleitoral

Políticos da oposição e ambientalistas acusam a medida de eleitoreira e oportunista, pois não representa qualquer compromisso efetivo com o abandono da tecnologia nuclear para a geração de energia. No último fim de semana (19-20/03) ocorreu a eleição no estado da Saxônia-Anhalt, com a coalisão do governo federal perdendo 6% dos votos, em comparação com a eleição anterior de 2006. Em poucas semanas ocorrerão eleições no estado de Baden-Württemberg, um dos que mais possui usinas instaladas, e onde o movimento anti-atômico se mostra mais forte.

A primeira ministra responde em tom sereno, propondo a moratória para dar espaço a um velho debate. A Alemanha determinou por lei, em 2002, que nenhuma nova usina nuclear seria construída no país, e que todos os reatores em operação seriam desligados num prazo de 32 anos desde o início do seu funcionamento. Em Outubro do ano passado a atual coalisão alterou essa lei, prorrogando esse prazo em até 14 anos.

“Desligar as usinas atômicas na Alemanha, para comprar energia atômica de países vizinhos não é uma solução para nós”, reiterou Merkel em Berlim. Atualmente 23% da energia consumida pelos alemães é de origem nuclear. O carvão sozinho responde ainda pela maior fatia do bolo do consumo, 43%. As chamadas energias regenerativas, ou “ecológicas”, principalmente eólica e solar já respondem por 16% do total. Um bom avanço, mas ainda longe de quebrar a hegemonia das outras fontes não renováveis.

Compromisso exportador
Outra questão sensível para os europeus é a exportação da tecnologia nuclear. Areva (França), Siemens (Alemanha) são dois dos maiores grupos do mundo interessados no assunto. E o Brasil, como cliente, entrou na roda da discussão esta semana. No projeto de Angra III, o governo alemão é avalista no empréstimo de mais de um bilhão de Euros para a construção da usina. “É perverso que Frau Merkel queira exportar esse perigo apocalíptico”, trombeteou no final da semana a deputada verde,Ute Koczy, fazendo coro com oposicionistas e ONGs que querem que a Alemanha se retire do empreendimento.

Segundo informações da matriz do Greenpeace em Hamburgo, a operação dos reatores brasileiros é crítica, sofrendo panes consecutivas, e sem as mínimas condições de segurança. “A única estrada para evacuação em caso de acidentes está muitas vezes intransitável”, exemplifica Heinz Smital, físico nuclear da ONG. Isso sem falar na falta de um depósito minimamente adequado para o armazenamento do lixo atômico da usina.

"Esta é uma política externa escandalosa, hipócrita e cínica”, concorda o deputado social democrata, Sascha Raabe, argumentando que o interesse por lucro de uma empresa alemã não pode estar acima da segurança de milhões de pessoas. Políticos e ambientalistas alemães estão agora preocupados que as duas maiores cidades do Brasil (Rio de Janeiro e São Paulo) ficam a apenas 100 e 240 quilômetros de distância da usina, respectivamente.

Catástrofe em andamento

Independente do resultado dessa queda de braço política, o fato é que as informações sobre o desenrolar dos acontecimentos em Fukushima continuam pra lá de confusas. Entre as bombas humanitárias que começaram a cair na Libia, o Banco Mundial divulgou um release no Domingo (20/03) atualizando suas previsões para a economia da Ásia após a catástrofe no Japão. O novo estudo diz que o “PIB japonês deve diminuir seu crescimento por um período limitado, devido aos esforços de reconstrução”.

Porém, o banco prevê que na segunda metade do ano a economia do país deve voltar a crescer, justificando o otimismo em experiências passadas, onde o impacto de tais eventos foi sentido apenas por um curto prazo. Sobre o acidente em Fukushima o relatório, fechado poucas semanas antes do terremoto, e atualizado às pressas por conta da catástrofe, diz apenas que “existem incertezas decorrentes da situação envolvendo os reatores da central atômica”.

E são abundantes as incertezas. Depois de anunciar o “upgrade” retroativo na classificação da gravidade do acidente (do nível quatro para cinco, numa escala até sete), o governo japonês e a empresa Tepco responsável pela operação da usina buscavam desesperados por boas notícias.

Já na sexta-feira (18/03) anunciavam o religamento da eletricidade na usina, coisa fundamental para o sistema de resfriamento dos reatores. Não explicavam porém, que quatro dos seis reatores do complexo já estavam bastante comprometidos, e que a volta da eletricidade era apenas o primeiro passo para uma nova tentativa de controlar todo o problema. A notícia da Folha dizia até que “trata-se da última ação, em uma corrida contra o tempo, para evitar um grave acidente nuclear”. Como se a explosão do prédio de um reator em sí já não fosse algo gravíssimo.

Passado o fim de semana, mais uma vez técnicos e bombeiros tiveram que ser evacuados por conta de “uma fumaça cinza” que saía do reator três. Sobre a composição da fumaça, ou a causa desse novo sinal de incêndio nenhuma palavra.

Ao mesmo tempo, ficam cada vez mais claros os sinais da contaminação radioativa. Na segunda (21/03) o governo assumiu que água, leite e espinafre em um raio de 120 quilômetros da planta haviam apresentado níveis de radiação muito acima do normal. Apesar da garantia de segurança dada pelo governo, o notíciário internacional corrobora para a idéia de que algo está fora de controle. “Não há motivo para pânico, já que os testes mostraram que a vagem contém apenas 11 Becquerels (Bq) de iodo e 1 Bq de césio-137 por quilo --ambos bem abaixo dos níveis máximos permitidos”, declarou uma autoridade em Taiwan sobre uma carga de alimentos importada do Japão, assegurando contudo que, “por precaução, toda a carga seria destruída.”

Nada de novo
Há alguns dias autoridades norte-americanas vinham criticando a falta de informações por parte do governo do primeiro ministro Naoto Kan. Outras análises apontavam inclusive para “quantidades muito pequenas de radiação” oriunda da usina japonesa em diversos pontos de território dos EUA, próximo à costa do Pacífico. Quer dizer, se o problema já havia sido detectado a 8 mil quilômetros de distância, que dirá na região próxima.

O parágrafo de uma reportagem do The New York Times atribui essa tendência da mídia de “blindar o governo” na cobertura do acidente a dois fatores básicos. Um, a natureza técnica e complexa da questão, onde o grau de incerteza tanto das causas, quanto dos efeitos do ocorrido é muito grande. O outro fator, remete à natureza e à estrutura da cobertura jornalística em sí. “Repórteres que cobrem agências governamentais e ministérios estão organizados em clubes de imprensa, tendo laços diretos com autoridades e decidem a partir disso o que reportar e o que não”, explica o texto.

De fato, ao contrário do que muitos “especialistas” e jornalistas vêm afirmando desde a explosão do primeiro reator no Sábado (12/03), o acidente nuclear da usina de Fukushima já é o segundo mais grave da história. Seja pelo número de reatores com problemas, ou pela quantidade de radiação liberada, ou pelo número de pessoas afetadas, ou pelas implicações econômicas.

E o mais grave, 10 dias após o início, ele ainda continua fora de controle. Como paralelo, em Chernobyl o único reator que explodiu ficou queimando por 10 dias, antes do incêndio ser “controlado”. Vale lembrar que ao contrário de um incêndio convencional, o fogo nuclear não se extingue. Ele segue ardendo por muitos anos, embora sua temperatura possa ser estabilizada. No caso da Ucrânia, por exemplo, o coração do reator enterrado sob o “sarcófago” ainda arde. Claro, o tipo de reator e a estrutura de segurança nos dois casos são incomparáveis, mas o imprevisto em Fukushima botou de joelhos todo o domínio tecnológico da terceira maior economia do mundo.

Por Mariano Senna, Ambiente JÁ, 21/03/2011


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