Em meio à crise atômica do Japão, a União Europeia (UE) anunciou nesta terça-feira que imporá controles de resistências em suas 143 usinas nucleares e realizará testes para ver como reagem em emergências como eventuais terremotos, tsunamis e ataques terroristas.
As mais de 100 autoridades reunidas em Bruxelas também debatem a decisão da chanceler alemã, Angela Merkel, de ordenar nesta terça-feira o fechamento imediato de todos os reatores nucleares do país que entraram em atividade "antes do fim de 1980" - um total de sete, que deverão permanecer desligados durante três meses.
"Vamos iniciar um exame da segurança de todas as centrais nucleares", disse a chanceler. "Os reatores que começaram a funcionar antes do fim de 1980 serão desligados durante a moratória", explicou.
Apenas 13 dos 27 países do bloco europeu usam energia nuclear, mas qualquer acidente sério rapidamente envolveria todas as nações.
Na segunda-feira, Merkel havia anunciado que vai suspender por três meses a decisão previamente adotada por seu governo de prolongar a vida das centrais nucleares mais antigas da Alemanha. A Suíça também decidiu suspender temporariamente seus projetos de reforma das centrais, à espera de "normas de segurança mais estritas".
O que acontece no Japão, onde as autoridades tentam por todos os meios evitar uma catástrofe nuclear na central de Fukushima, segundo Merkel, "muda a situação e na Alemanha, também". "Não podemos fazer como se nada tivesse acontecido. Digo isso muito claramente: não há tabu algum no que diz respeito à análise das condições de segurança", disse a chanceler na segunda-feira.
"O que acontece no Japão é claramente um acidente nuclear muito grave e o risco de uma grande catástrofe não pode ser descartado", disse a ministra francesa do Meio Ambiente, Nathalie Kosciusko-Morizet, cujo país cobre 75% de suas necessidades energéticas com suas centrais. "Queremos o nível de segurança o mais elevado possível e determinar se a energia nuclear é ou não controlável", afirmou a ministra, que considerou também que não é o momento de se precipitar.
Sem subestimar a "importância do debate sobre a segurança", Elena Salgado, vice-presidente do governo espanhol, pediu que seja mantida uma "perspectiva global" e lembrou que as centrais no Japão, "até o momento, estão resistindo graças às medidas de proteção".
Advertência
Na segunda-feira, a Áustria, que se opõe à energia nuclear, lançou uma advertência ao restante dos europeus: "Queremos segurança máxima para a nossa população e todos os nossos vizinhos devem poder garantir a das suas", declarou o ministro do Meio Ambiente Nikolaus Berlakovitch.
Para a ministra do Meio Ambiente italiana, Stefania Prestigiacomo, "a catástrofe no Japão suscita muitas preocupações". "Desejamos entrar no sistema nuclear da UE, mas esperamos informações sobre a situação das centrais," indicou Prestigiacomo, cujo país abandonou esse tipo de energia em 1987. No bloco europeu, a maioria dos países tem centrais nucleares, principalmente a França (19 centras e 58 reatores), a Grã-Bretanha (9 e 19), a Alemanha (12 e 17), a Suécia (7 e 16) e a Espanha (6 e 9).
Diante do acidente do Japão, o governo da Índia determinou a revisão dos sistemas de segurança de todas as usinas nucleares do país para a comprovação de que podem resistir a catástrofes naturais. Nesta terça-feira, o país também ordenou a análise do nível de radiação dos alimentos que chegaram durante os últimos dias procedentes do Japão.
Um dos novos projetos atômicos da Índia está na zona de Jaitapur, na região ocidental de Maharashtra, em uma área de atividade sísmica. No país, há ao todo 20 reatores nucleares, com capacidade de 4.780 megawatts, mas 18 deles têm sistemas de fabricação local e apenas dois possuem tecnologia similar à da usina de Fukushima, informa a agência indiana "Ians".
Nos EUA, o jornal americano The New York Times publicou uma matéria em que dizia que o acidente nuclear no Japão coloca em xeque o apoio a esse tipo de programa de energia no país.
Na Rússia, o primeiro-ministro Vladimir Putin ordenou nesta terça-feira um exame completo sobre o futuro do setor nuclear na Rússia. O premiê pediu a ministros que "analisem a situação atual das centrais e as perspectivas para o futuro" do setor, "apresentando suas conclusões em um prazo de um mês".
Além disso, autoridades do país disseram que os níveis de radiação aumentaram ligeiramente no extremo leste do país por causa do acidente nuclear no Japão, mas o índice ainda continua dentro do que é considerado normal.
Brasil
O Brasil se disse preparado para enfrentar acidentes nucleares e não deverá retroceder nos planos de aumentar o seu parque nuclear por causa do acidente no Japão, de acordo com o assessor especial da presidência da Eletronuclear, braço da Eletrobras, Leonam Guimarães. "Esse problema sem dúvida vai causar perturbação em todos os planos (de novas usinas). Mas o que aconteceu no Japão não muda os cenários individuais de cada país que levam à necessidade da geração elétrica nuclear", afirmou Guimarães à agência Reuters.
Para o representante da Eletronuclear, decisões como a da Suíça, que anunciou ter suspendido a aprovação de novas usinas nucleares, "são puramente emocionais" e um país que necessita de energia não poderá agir dessa forma. "O fato de ter ocorrido esse acidente não muda em nada as necessidades e os critérios que levaram vários países do mundo a recorrer à energia nuclear."
O Brasil pretende decidir este ano o local para a construção de quatro novas usinas nucleares de 1 mil megawatts cada, que devem estar prontas até 2030. O país finaliza também a usina Angra 3, a terceira usina nuclear brasileira, com capacidade para gerar cerca de 1,3 mil MW.
Além do Brasil, Argentina e México, os outros países da América Latina que operam usinas uncleares na região, descartaram o risco de catástrofe nuclear.
Na Argentina, o gerente de Controle de reatores da Autoridade Regulatória Nuclear, Rubén Navarro, disse à AFP que as usinas de Atucha e Embalse têm "diferenças fundamentais" em relação às do Japão. Distantes do mar e da zona de junção de placas tectônicas, elas não correm o risco de serem afetadas por terremotos ou tsunamis, e possuem um desenho diferente dos modelos construídos no Japão. "As usinas argentinas têm um circuito de refrigeração entre o núcleo e o setor externo. As japonesas não têm", disse Navarro, para quem a situação no Japão não deverá motivar medidas extraordinárias nas usinas argentinas.
Já Epifanio Ruiz, especialista em Ciências Nucleares da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), lembrou que não há falhas geológicas nas proximidades de Laguna Verde, o que torna improvável a ocorrência de um maremoto. “No caso de furacões, os reatores são desligados gradualmente", explicou Ruiz.
As usinas de Laguna Verde são alvos de críticas por terem sido instaladas em uma região exposta à ação de furacões. No ano passado, o furacão Karl tocou a terra a apenas sete quilômetros das usinas e causou a desativação dos reatores.
A crise nuclear no Japão não deve se tornar em outro Chernobyl, o pior acidente nuclear da história, disse o chefe da agência nuclear da Organização das Nações Unidas (ONU). É "improvável que o incidente se desenvolva" como ocorreu em Chernobil, disse Yukiya Amano, diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Ele apontou para algumas diferenças, entre elas o projeto e a estrutura das usinas nucleares.
(AFP, Reuters e EFE, 16/03/2011)