Em instalações novas em folha, em Caiena, meia dúzia de engenheiros estão com os olhos pregados nas telas de seus computadores. Todos preparam a campanha, na costa da Guiana Francesa, da plataforma 8503 da empresa americana Ensco, contratada pela britânica Tullow. “Ela está chegando na área”, comemora Joachim Vogt, representante local da Tullow, mostrando em um mapa marítimo a rota da plataforma, que partiu no dia 10 de fevereiro do Texas para a Guiana Francesa.
Durante três meses, um consórcio conduzido pela Tullow, acionista com 27,5% do projeto, associada à anglo-holandesa Shell (45%), à francesa Total (25%) e à norueguesa Northpet Investments (2,5%), deve realizar, a 150 quilômetros da costa guianense, uma perfuração de exploração a 2 mil metros debaixo d´água, e depois a 4.300 metros de profundidade, em busca de uma possível jazida de hidrocarbonetos. Nesse estágio, a probabilidade de sucesso é de 20%. Mas a jazida é promissora: fala-se em um número de 500 milhões a 1 bilhão de barris de petróleo.
Em Caiena, as associações de proteção ambiental estão preocupadas. “A consideração de uma possível poluição não é satisfatória”, lamenta Christian Roudgé, coordenador da federação Guyane Nature Environnement. “As medidas do plano local de combate à poluição marítima não se baseavam em uma perfuração no mar, e sim no acidente de um petroleiro”, reconheceu Daniel Férey, administrador da Guiana Francesa, à Guyane Première Radio. “Nós devemos adaptar totalmente nosso dispositivo, mas é também responsabilidade da empresa nos fornecer os meios para intervir em um problema desse tipo.”
“A prudência é essencial”
“Há muito em jogo”, explica Christian Roudgé. “O litoral guianense faz parte do maior cinturão de mangues do mundo e possui uma biodiversidade muito rica.” “O Platô das Guianas é um dos maiores lugares do mundo para postura de ovos da tartaruga Luth, espécie em risco crítico de extinção na lista vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), e a temporada da postura coincide com esse projeto”, lamenta Laurent Kelle, diretora da WWF na Guiana Francesa. Em um comunicado coletivo, oito organizações ambientais pediram pela “suspensão imediata” do projeto “em um contexto internacional e regional onde a prudência é essencial, após o acidente da plataforma da BP em 2010 no Golfo do México”.
As associações ecologistas têm razões para estarem desconfiadas. Em dezembro de 2010, a Guyane Nature Environnement alertou sobre o fato de que o método de perfuração previsto pela Tullow, utilizando óleos sintéticos nos dejetos, era ilegal nas águas francesas. A pedido do Estado, a operadora teve de passar para um método na água. Em meados de janeiro, quando Tullow havia até então afirmado que não havia risco de maré negra para o litoral guianense em caso de acidente, o estudo do impacto concluiu que existia um risco reduzido. “Em caso de grande catástrofe, há 1% de chance de que o litoral seja atingido, de Sinnamary, na Guiana Francesa, até Paramaribo, no Suriname”, reconhece Joachim Vogt. “Nossos procedimentos levaram em conta as lições do acidente do Golfo do México, e nós temos um plano de prevenção com respostas imediatas em todos os casos possíveis”, garante o representante local da companhia.
“Existe material de combate à poluição na plataforma, barcos de apoio e bases em terra, além de helicópteros, e aviões para dispersar produtos para ajudar a biodegradação das manchas de óleo, ou ainda um sistema de imagens por satélite para acompanhar possíveis manchas de petróleo”, acrescenta.
Os parlamentares, por sua vez, se preocupam mais com possíveis repercussões econômicas do projeto. A deputada (PRG) Christiane Taubira critica a falta de tributação sobre uma possível exploração offshore na Guiana Francesa, sendo que isso foi previsto no caso de Saint-Pierre-et-Miquelon, onde uma modificação do código da mineração permite tirar dela uma receita para a sociedade.
(Le Monde, UOL Notícias, EcoDebate, 10/03/2011)