No dia 27 de janeiro de 2011 a mídia nacional divulgou a seguinte notícia: "Pesquisa indica que 51% dos paulistanos querem se mudar de São Paulo e o fariam se pudessem” (O Estado de São Paulo).
Demonstração óbvia de uma trágica tendência: os paulistanos não crêem mais no futuro de sua cidade. Chegando a São Paulo de avião nos defrontamos com uma enorme chaga na mãe-terra. Quem assiste noticiários de TV ou Rádio, ou navega pela internet, testemunha que qualquer chuva forte faz São Paulo atolar na merda, transformando muitos irmãos paulistanos na constrangedora situação de escaravelhos.
E a cada ano que passa o fenômeno vem se repetindo com mais freqüência. Entretanto, para os Governos e para boa parte da sociedade urbana iludida e alienada, aquilo é a "locomotiva” do Brasil. Mas, a maioria dos paulistanos, principalmente os pobres, encara, a triste realidade, profetizando o fim próximo da "locomotiva”. Não vê ali futuro para si e seus filhos.
Infelizmente, o Governo não vai de encontro a esta realidade angustiante de quem procura um futuro de esperança. Prefere levar outros povos e comunidades que vivem felizes, com um futuro lindo diante de si, ao mesmo desespero dos paulistanos. Veja o que fez com os Waimiri-Atroari (Kiña), na BR-174, Manaus – Boa Vista por causa do minério e da Hidrelétrica de Balbina; com o povo Parakanã/PA por causa da Hidrelétrica de Tucuruí; com a "Ilha da Viúva” dos índios Tuxá de Rodelas na Bahia que era um verdadeiro sonho de esperança para toda a humanidade (provavelmente foi ali que Antonio Conselheiro se inspirou para criar Canudos), onde a Hidrelétrica de Petrolina acabou com este refúgio de felicidade. A mesma ditadura, com seus grandes projetos "irreversíveis”, ameaça hoje o futuro feliz dos Kaiapó, com Belo Monte; de comunidades rurais e indígenas de Rondônia e da Bolívia, com Girau e Santo Antônio/RO; dos Enawene Nauê e Pareci, com as PCHs do Alto Juruena/MT; e com o futuro de milhares de agricultores dos vales dos rios Uruguai e Chapecó, maiores produtores de alimentos do país com uma série de hidrelétricas. Rouba-se o futuro independente e feliz para substituí-lo pela dependência do Estado através de bolsas de alimentos, produzidos à base de perigosos agrotóxicos e transgênicos.
Por tudo isso e para ir de encontro a angústia da maioria consciente dos paulistanos, propomos a seguinte questão: por que não promovemos a construção de uma grande barragem no Rio Tietê, logo na saída da cidade de São Paulo, barragem que inunde de preferência toda a "locomotiva”, aniquiladora do futuro de seus filhos? Assim, de imediato, o Governo, sempre pronto em alimentar a "leseira” urbana com ilusões de cimento e asfalto, terá recursos para fazer a Reforma Agrária nos latifúndios que se estendem de São Paulo à Amazônia, também eles destruidores da esperança, enquanto aniquilam a biodiversidade, envenenam a terra com agrotóxicos e transgênicos.
Vamos implantar ali uma Reforma Agrária, como foi o nosso sonho petista até 2003.
Assim, se abrirá um horizonte cheio de esperança aos paulistanos atingidos pela barragem do Tietê. Seu futuro se iluminará com a luz da independência e da abundância. E a "locomotiva” definitivamente atolada na lama, também voltará a produzir frutos de esperança, encorajando as mentes para a tomada de decisões em favor da vida no planeta, ansioso por novos paradigmas de organização. As águas do Tietê, hoje devoradoras de gente, descerão a Serra do Mar, amigas, aterrando o asfalto e o cimento com a lama da fertilidade. Sementes brotarão recobrindo edifícios e arranha-céus de cipós. Plantas variadas e árvores cheias de frutos devolverão a biodiversidade e a abundância ao vale do Tietê para alimentar a festa do povo. Assim, os paulistanos, hoje sufocados por água, lama e fezes, e iludidos pelos homens de Estado, verão os seus filhos, netos e gerações intermináveis, voltarem para sua casa com paneiros cheios de felicidade.
Paulistanas e paulistanos, brasileiras e brasileiros vamos às ruas, estradas e rios, exigir que o orçamento da "locomotiva”, os 30 bilhões de Belo Monte e os 110 bilhões destinados ao agronegócio sejam transferidos para a Reforma Agrária e atendendo prioritariamente os paulistanos atingidos pela barragem do Tietê.
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Dedico esta proposta à memória de Doroti, minha querida companheira de 32 anos, falecida em 03-12-10, que sempre sonhou com a Reforma Agrária e que teve a ousadia de abandonar o núcleo comercial de Blumenau/SC para se transformar em indigenista, mãe e agricultora apaixonada na Amazônia. Por isso, mereceu, por ocasião da missa de 7ºDia, dos acadêmicos de 11 entidades, esta homenagem póstuma: "Agradecemos à Doroti por nos nortear e semear vida! Dos amigos e amigas acadêmicos que tanto aprenderam com sua sabedoria tradicional. Embrapa, INPA, UFAM, IFAM, IDAM, INCRA, UEA, REATA, Fórum Amazonense de Agroecologia, Associação Brasileira de Agroecologia, Sociedade Brasileira de Sistemas Agroflorestais.” Enquanto distribuíam sementes o povo cantou: "Põe a semente na terra e não será em vão, não te preocupe a colheita, plantas para o irmão”.
(Por Egydio Schwade, Adital, 02/03/2011)