O gaúcho, gremista e fumante inveterado Curt Trennepohl, assumiu a presidência do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) com a promessa de acelerar o licenciamento das obras do PAC e de aumentar a fiscalização do desmatamento.
Advogado, doutor em direito ambiental e com três livros publicados na área, Trennepohl é procurador federal e chefiava a corregedoria do Ibama. É funcionário do órgão desde sua criação, em 1990, e é "respeitado pela casa", nas palavras de um ex-presidente do Ibama.
Seu nome é indicação da ministra Izabella Teixeira. Em entrevista à Folha de S.Paulo, 26-02-2011, ele defendeu o pacote que o governo prepara para facilitar o licenciamento e a polêmica concessão da licença para o canteiro de obras de Belo Monte.
Eis a entrevista.
Qual é a sua prioridade para o Ibama, num momento em que o órgão parece estar mais do que nunca na berlinda?
Eu não diria isso. Eu diria que a continuidade do Ibama como órgão federal de meio ambiente é o principal papel.
E como isso se coaduna com essa sanha licenciatória do governo?
(Risos) Essa expressão é sua! O licenciamento ambiental tem regras. Essas regras têm de ser seguidas. Evidentemente o processo de licenciamento ambiental pode sofrer um certo retardamento quando o volume de projetos a serem licenciados é grande. O aumento da demanda, evidentemente, se traduz numa menor celeridade. Se é necessário acelerar o processo, evidentemente dentro de todos os parâmetros legais, deve-se procurar dar uma estrutura maior ao órgão que faz o licenciamento. Não se trata de pular etapas, e sim de colocar mais jogadores em campo.
A sua intenção, em português claro, é aumentar o quadro.
O efetivo do licenciamento. E a fiscalização do desmatamento. São as duas diretrizes da ministra [do Meio Ambiente] Izabella [Teixeira].
O sr. acha que o licenciamento está lento?
Eu não diria que ele está lento; ele está sobrecarregado. O próprio crescimento do país nos últimos dois anos resultou num incremento muito grande de atividades de competência do Ibama para serem licenciadas. E a estrutura da diretoria de licenciamento não cresceu na mesma proporção da demanda. E como não se pode, no licenciamento ambiental, pular etapas ou desrespeitar normas, precisa-se de mais jogadores em campo.
Como o sr. enxerga esse pacote de decretos para acelerar o licenciamento ambiental que o governo está preparando? O embaixador Rubens Ricúpero criticou a falta de transparência desse processo.
Eu li o artigo do Ricúpero. O que ocorre é o seguinte: decretos regulamentam leis. A legislação ambiental no Brasil é relativamente recente, começou praticamente em 1981, com a lei nº. 6938 [da Política Nacional de Meio Ambiente]. Então ela está ainda em evolução, e por isso tem partes que são pouco claras. Isso faz com que grande parte dos processos de licenciamento sejam judicializados. Busca-se que o Judiciário esclareça as lacunas da lei. Eu acho que os decretos em elaboração buscam estabelecer procedimentos. E isso é salutar na medida em que tira um pouco dessa subjetividade, dessa discricionaridade de interpretação, que normalmente retarda o processo de licenciamento ou lança dúvidas sobre ele.
O Ministério Público do Pará moveu uma ação contra a União pelo que eles chamam de licença fracionada para Belo Monte...
Não se trata de uma licença fracionada. Trata-se do licenciamento de instalação de uma etapa. Hoje faz-se um licenciamento prévio de uma ferrovia de São Luís do Maranhão a São Paulo. Os aspectos ambientais de toda a linha são analisados como um todo. O mesmo aconteceu em Belo Monte. No entanto, até a obra é proposta em etapas. E, em Belo Monte, não houve fracionamento, mas licença de instalação para o canteiro de obras.
Como corregedor, qual era o principal problema que o sr. detectava na máquina do Ibama? Os desvios têm crescido?
Não. Desde a Operação Curupira [2005], talvez até em razão de um maior controle, têm diminuído em número as apurações de denúncias. Talvez também em razão do desmembramento do Instituto Chico Mendes, que reduziu as atribuições do Ibama.
O Ibama perde poder de fiscalização de desmatamento na Amazônia, certo?
Mas analise da seguinte forma: se o desmatamento na Amazônia é uma questão nacional, ela não sai da competência do Ibama.
(IHU-Unisinos, 28/02/2011)