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mídia e sustentabilidade imprensa e meio ambiente
2011-02-22 | Tatianaf

Conta-se que um dia o editor pediu a um repórter para escrever sobre Jesus Cristo, e o repórter, prudentemente, perguntou: "Contra ou a favor?" É uma brincadeira, naturalmente, mas revela um aspecto da informação, o de que pode ser abordada por diferentes ângulos. Com a informação ambiental não é diferente.

Como não existe neutralidade em nada na vida, não existe também na informação. O olhar do observador muda o objeto da observação ensinou Einstein na Teoria da Relatividade. Cada um de nós carrega uma história de vida, uma formação e auto-formação profissional, valores, utopias, ética, que nos torna únicos em relação aos demais.

Por isso, informar é fazer escolhas, o que só pode acontecer onde existir liberdade, como nas democracias. Em ditaduras, o que existe é a verdade única dos dominadores. Além da liberdade, precisamos de ética para definir o que devemos divulgar, pois nem sempre podemos tudo o que queremos. Uma informação pode encobrir mais que revela. Dependendo do observador, um aspecto da informação poderá estar sendo mais revelado que outro, e ambos podem ser verdadeiros - ou tendenciosos, ou falsos.

Escolher significa que uma informação pode ser tratada pelo seu lado técnico ou político, pelo lado da cidadania ou da educação ambiental, e assim por diante. E mesmo quando se escolhe abordar pelo lado técnico, aí também poderá admitir variações, pois tanto pode tender para a biologia, ou engenharia, ou direito, etc. Mas, por qualquer ângulo que se resolva abordar uma informação, sempre existirão outros ângulos que não foram percebidos ou foram deliberadamente deixados de lado. Informar é envolve escolher lançar luz sobre aspectos da realidade que consideramos importante e deixar os demais aspectos nas sombras, como se nosso olhar fosse uma espécie de farol. Muitas vezes é aí que um profissional se destaca dos demais e ganha o respeito do público, quando vai além de onde ou outros já foram e revela um aspecto da informação que estava oculto nas sombras.

E é esse fato que coloca o profissional da comunicação numa posição estratégica na sociedade. Assim como se espera que um médico seja capaz de diagnosticar um problema e aplicar o tratamento da maneira mais eficaz possível, se requer o mesmo de um profissional da comunicação em relação à verdade. Ele deve reunir as competências e a qualificação para revelar a verdade dos fatos, ainda que a verdade tenha a tendência de se ocultar nos vãos. Por que podemos perceber a verdade, mas sempre que a vamos transmitir o fazemos através de nós e tendemos a alterar a verdade ao falarmos ou escrevermos sobre ela.

Por exemplo, vivemos numa sociedade injusta, dividida entre dominadores e dominados. A informação pode se prestar a ser um instrumento de libertação ou de alienação, pode promover a manutenção do modelo ou provocar mudanças. Isso é especialmente importante na informação ambiental diante de um mundo dividido entre dois modelos e estilos de vida, um que trouxe a humanidade até a beira de um possível colapso ambiental, e outro que propõe o caminho da sustentabilidade.

Se enquanto cidadão, não existe neutralidade, enquanto profissional é preciso saber manter um distanciamento dos fatos para conseguir transmitir uma informação a mais próxima da realidade. Será preciso ouvir e cruzar as fontes envolvidas na questão, e não apenas os lados que nos agradam. Cabe ao público escolher, e não ao profissional. Não se trata de tarefa fácil, pois a realidade está mais para cinza que para preto e branco, e o espaço ou o tempo da noticia são bem curtos e o interesse do publico também.

Não se requer de um jornalista que cubra a área de esporte, por exemplo, que seja também um atleta. Mas na área ambiental, somos todos cidadãos, e o jornalista, por sua própria profissão, precisa ser um crítico da realidade, o que pode reforçar sua cidadania e a tendência em engajar-se em causas que enquanto cidadão considera importantes. O desafio é não deixar que este engajamento comprometa seu desempenho profissional, por exemplo, tendendo a ouvir mais as fontes que o agradam enquanto cidadão e distorcendo ou exagerando as declarações das fontes que o desagradam. Um jornalista engajado com a defesa do meio ambiente tenderá a valorizar muito mais aos ambientalistas, como fontes, que aos poluidores. Entretanto, o público tem o direito de saber de todos os aspectos envolvidos nos fatos, pois cabe a ele, e não ao jornalista, fazer as escolhas. Para um jornalista engajado não disposto a fazer concessões, existe o caminho profissional em instituições dedicadas à defesa do meio ambiente, que cada vez mais valorizam profissionais que 'vestem a camisa' de suas causas. Já na mídia de massa, não especializada em meio ambiente, o engajamento poderá não ser tão bem acolhido.

Um dos maiores patrimônios de um profissional da comunicação é a sua credibilidade. E assim como é bem difícil construí-la é bem fácil perdê-la. Basta ser descoberto, por exemplo, envolvido na divulgação de mentiras ou meias verdades, para beneficiar um lado em detrimento do outro. Ou quando diz uma coisa e pratica outra. O que faz a diferença entre um bom e um mau profissional não é o seu talento e capacidade, mas sua credibilidade. Um profissional sem credibilidade pode ter um texto brilhante ou um tom de voz imponente, mas dificilmente conquistará o respeito do público, das fontes e dos colegas de profissão. A credibilidade permite, entre outras vantagens, construir uma sólida rede de fontes, e que irá acompanhá-lo aonde for. E isso poderá fazer toda a diferença. Por mais brilhante e superdotado que um profissional seja, diante da complexidade da realidade, jamais será capaz de saber tudo. Então, não tem de assumir a postura arrogante de quem acha que domina um assunto, pois o impedirá de estabelecer parcerias e relacionamentos com técnicos e cientistas que dominam melhor o assunto e que quase sempre ajudam de bom grado, desde que sejam procurados e tratados com o respeito que merecem pelo conhecimento adquirido.

Nossas caixas de e-mail são invadidas diariamente por centenas de informações das mais variadas fontes, e pode parecer mais cômodo sucumbir à mesmice reproduzindo o senso comum que pode não ser verdadeiro. Por exemplo, o planeta esta aquecendo ou esfriando? As mudanças climáticas são verdadeiras ou falsas? Os desastres e fenômenos climáticos extremos são efeito direto das mudanças climáticas ou podem ter outras causas?

Alem disso, a informação não 'fala' apenas ao intelecto, mas também ao coração. Muitas pessoas podem lembrar a importância que uma informação teve em suas vidas, por exemplo, no momento em que decidiram abraçar uma carreira, ou uma causa, ou uma mudança qualquer que pode ter começado com a leitura de um texto, uma aula de um professor, as palavras de um palestrante. A informação carrega em si o poder de revolucionar uma vida ou uma nação, por que é portadora de idéias, de valores e pode sensibilizar, emocionar, convencer.

Formação profissional alguma será capaz de dar conta de tamanha desafio e complexidade! Terá de ser uma tarefa para a vida inteira, um processo continuo de auto-formação, onde se aprende muito mais com os próprios erros, e se  aprende a aprender.

*Vilmar Sidnei Demamam Berna é escritor e jornalista, fundou a REBIA - Rede Brasileira de Informação Ambiental e edita deste janeiro de 1996 a Revista do Meio Ambiente (que substituiu o Jornal do Meio Ambiente) e o Portal do Meio Ambiente ( http://www.portaldomeioambiente.org.br/).  Em 1999, recebeu no Japão o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas – http://www.escritorvilmarberna.com.br/

(Por Vilmar Berna*, Portal do Meio Ambiente, Envolverde, 22/02/2011)


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