O apagão que deixou ontem sete estados do Nordeste sem luz foi causado por falha técnica, desta vez, dizem os responsáveis, não por oferta insuficiente ou demanda elevada. Mas a região precisa de aumentar a capacidade local de geração. Mas deve fazer isso explorando seu melhor potencial e buscando segurança energética. Poderia se tornar um pólo mundial de energias renováveis alternativas.
Mas o governo escolhe o pior caminho: faz termelétricas a combustível fóssil, poluindo a região e sujando a matriz elétrica brasileira e quer fazer usinas nucleares. Não precisa, o Nordeste é a maior fonte de energia eólica e solar do Brasil. Limpa e segura. Há áreas do semi-árido, hoje quase sem população, são muito secas e ficarão mais secas ainda no futuro. Nelas poderiam ser instaladas centrais de energia solar fotovoltaica.
Por que insistimos no caminho do velho? Por que o Brasil tem preconceito e se recusa a fazer o que o resto do mundo todo está fazendo: Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Espanha, Portugal, China, Índia? Só para mencionar os principais.
Porque temos uma política energética ultrapassada e que virou monopólio de uma clique de tenocratas e donataria de grupos políticos. O Ministério das Minas e Energia é como uma grande sesmaria, loteada politicamente. É comandado por uma facção política como se fosse direito hereditário. As empresas elétricas são capitanias hereditárias, os partidos viraram donos delas. Com o loteamento de um setor estratégico para o país para os grupos mais clientelistas da política brasileira, fica difícil imaginar políticas públicas com visão de futuro, voltadas para a inovação, sintonizadas com as tendências mundiais.
Nosso sistema de transmissão e distribuição é ineficiente. Apagões têm sempre um culpado exótico, o raio de Bauru, que só os técnicos do setor elétrico viram, mas a meteorologia não captou, ou o culpado é sujeito indefinido: “mandaram” desligar Itaipu – e aí 18 estados ficam sem luz. Ontem, segundo explicação da CHESF, uma peça eletrônica, uma “cartela eletrônica”, de uma grande subestação desligou, por defeito, parte do sistema e sete estados do Nordeste, mais o interior do Piauí, ficaram sem luz. Não dá para demitir o raio de Bauru, ou a cartela eletrônica.
Em entrevista, ontem, para Míriam Leitão na Globonews, o diretor da ONG Amigos da Terra, Roberto Smeraldi, e o diretor da COPPE, Luiz Pinguelli Rosa, defenderam investimento no aumento de eficiência na geração, transmissão, distribuição e consumo de eletricidade no Brasil. A energia mais barata que temos é a que desperdiçamos e a que deixamos de produzir. Defenderam também a diversificação urgente de nossa matriz energética, aumentando a geração eólica, que pode ser o melhor complemento da hidreletricidade e ainda dá segurança energética ao Nordeste. Eu concordo inteiramente. O Brasil precisa passar a investir em energia solar. O Nordeste não tem mais potencial hidrelétrico, mas tem um vasto potencial eólico e solar. A Índia está instalando a maior usina do mundo movida pelas ondas do mar. Aqui as ondas quebram nas praias, ociosas, dolentes, e ninguém vê a energia nelas contida. O vento balança as folhas do coqueiro do Nordeste, mas move muito poucas turbinas eólicas. O sol esquenta o agreste, mas não gera um único Watt de eletricidade. Mas a fumaça das termelétricas aumenta e agora o Nordeste enfrentará o risco nuclear.
Sempre me perguntam qual é a alternativa para o que se vem fazendo, e inclusive para Belo Monte? Resultado da propaganda do governo e setores do mercado interessados no status quo, que dizem que ou fazemos esses absurdos programados no PAC ou teremos um apagão e o crescimento será inviável. Não é assim. O mundo busca alternativas que temos de sobra e desprezamos. Insistem que é mais caro e não dá escala. Enquanto isso, no resto do mundo, o custo por kWh dessas energias só faz cair e a escala só aumenta. Caro é Belo Monte, um projeto sem transparência, cujo custo final, depois de realizado será provavelmente muito maior do que se diz. Era R$ 20 bilhões, o BNDES já reconhece R$ 26 bilhões. Duvido que fique na casa dos trinta. A usina de Simplício, no rio Paraíba do Sul, entre os municípios de Chiador, MG, e Sapucai, RJ, custou o dobro do estimado. Imagine-se uma obra das proporções de Belo Monte, lá no Xingu. Et pour cause.
A eficiência energética não supera a necessidade de expandir a capacidade instalada, mas reduz a urgência na instalação de novas usinas e garante melhor aproveitamento dos MW já gerados e dos novos que entrarão no sistema. Reduz custo e preço. É o melhor investimento que se pode fazer. Tecnicamente falando, claro. Mas é um péssimo investimento político: invisível, não dá inauguração, não gera grandes contratos com empreiteiras. Não dá para fazer. Energia eólica e solar fotovoltaica, a começar pelo Nordeste, são uma óbvia opção brasileira. Precisa subsidiar? Precisa. Mas o governo subsidia hidrelétricas e, pior, termelétricas a carvão e óleo. Pagamos caro pela energia do passado, como disse Barack Obama no discurso “Estado da Nação” ao Congresso do EUA. Por que não subsidiar a energia do futuro? O atendimento de populações de mais baixa renda e longe dos grandes centros, pode ser feito com pequenas usinas, biomassa, turbinas eólicas. Cidades inteiras podem gerar boa parte de sua energia usando lixo, biomassa, eólica e solar.
Alternativa tem. Os lobbies e as forças que controlam a política energética é que não querem admitir.
(Por Sérgio Abranches, Ecopolítica, Envolverde, 06/02/2011)