A participação dos moradores na gestão da água urbana contribui para a durabilidade das obras realizadas pelas empresas e a sustentabilidade dos serviços que oferecem, aponta pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (Procam) da USP. No estudo, a socióloga Maria Lucia Guilherme Borba apresenta uma metodologia em que a população debate os projetos com os técnicos e se compromete a monitorar as condições da água na comunidade, procurando descartar o lixo de forma adequada e evitar ligações clandestinas de esgoto.
A pesquisa desenvolveu uma metodologia que ajudasse na cooperação entre técnicos das empresas e moradores. “O objetivo é abrir caminho para uma gestão compartilhada da água urbana, o que inclui abastecimento, esgotos e drenagem”, diz Maria Lúcia. “Sem o envolvimento da população local, não há garantia da durabilidade das obras, que deixam de servir a finalidade a que foram planejadas”.
Com base na experiência profissional em uma organização holandesa, a socióloga estabeleceu as bases da metodologia, a partir do monitoramento para a ação e eficácia. “Cada morador se envolve com o projeto desde o início e cuida do acompanhamento das condições da água urbana em casa e nos arredores do domicílio”, relata. “Os problemas que surgirem devem ser resolvidos no lugar em que acontecem, com os moradores agindo para resolvê-los antes de chamarem a empresa de água ou a prefeitura.”
Os moradores participam de todo o processo de discussão com os técnicos e as autoridades locais e são encarregados de elaborar um mapa da região, com indicação de ruas, casas, empresas e pontos comerciais. “Este levantamento ajuda a envolver a comunidade no projeto”, explica Maria Lúcia. “Ao invés da simples implantação, os técnicos expõem os problemas à população, que define prioridades ao mesmo tempo em que se compromete com a proteção da obra”.
Debates
O fechamento de um piscinão era a reivindicação da comunidade em um dos projetos pesquisados pela socióloga. “Nas reuniões, os técnicos apontaram que a cobertura faria com que a água transbordasse em pontos localizados mais a frente do piscinão e poderia aumentar o problema para o bairro”, relata. Ao final dos debates, houve um acordo para manter o piscinão aberto. “Ao mesmo tempo, a população local passaria a controlar o descarte de lixo e a evitar ligações clandestinas de esgoto, para que não houvesse deposição de detritos na água”.
No outro projeto analisado, os moradores queriam a instalação de uma rede de esgotos. “Embora houvesse fossas nas casas, grande parte do esgoto doméstico era lançado nas ruas”, conta Maria Lúcia. Devido ao fato de o bairro estar localizado em uma área de mananciais, os técnicos demostraram que o transporte do esgoto exigiria um investimento muito elevado e a comunidade pagaria mais caro do que pela limpeza das fossas. “Assim, foi proposta a implantação de fossas comunitárias para coletar e tratar o esgoto no próprio bairro, medida aceita pelos moradores após as discussões”.
De acordo com a socióloga, também houve mudança de comportamento dos técnicos da empresa de água. “Eles reconheceram que o contato com os moradores pode ser benéfico, na medida em que traz aos projetos maior durabilidade e sustentabilidade”, destaca. “Em um dos projetos, a participação de técnicos com alto poder de decisão nas discussões surpreendeu os moradores, que nunca haviam visto pessoas da empresa na comunidade”.
Maria Lúcia ressalta que os moradores colaboram com a proteção das obras, mas não podem ser deixados sozinhos. “O trabalho deve ser conjunto, se eles não conseguirem resolver os problemas que surgirem, tem de haver a possibilidade de buscar auxílio com a empresa”, alerta. A pesquisa teve orientação da professora Mônica Ferreira do Amaral Porto, da Poli. A metodologia recebeu o Prêmio Mário Covas de Inovação em Gestão Pública, no ano de 2009.
(Por Júlio Bernardes, Agência USP, Envolverde, 04/02/2011)