Na avaliação do coordenador de Recursos Hídricos do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Sanderson Leitão, foi significativa a maior atenção à área nos últimos anos. Ele sustenta que, embora o Brasil seja privilegiado em termos de disponibilidade hídrica, ainda há alguns obstáculos a serem superados para garantir o abastecimento desse bem à população e às atividades econômicas, com qualidade e sustentabilidade.
"Temos cerca de 14% de toda a água existente no planeta, no entanto, o nosso problema é que essa água está distribuída irregularmente ao longo do território", esclarece. O doutor em meio ambiente e desenvolvimento cita dados que revelam essa discrepância. "A maior parte da água do Brasil se concentra na região Norte (70%), onde está de 7% a 8% da população, enquanto o restante das reservas se encontra distribuído de forma irregular ao longo do país, com problemas de escassez ou de pouca água em localidades, como São Paulo, Curitiba, Recife e até Manaus".
Sanderson lembra ainda que 85% da população vivem nas cidades e que o crescimento econômico demanda mais água para consumo doméstico e industrial. Na visão do especialista, para aprimorar e garantir, ainda mais, o atendimento dessas demandas decorrentes do acelerado desenvolvimento do país é preciso ter uma gestão integrada da água, inclusive utilizando tecnologias de ponta, como a dessalinização de água do mar e o emprego de nanotecnologias no setor de saneamento e abastecimento.
"Temos no Brasil uma quantidade importante de perdas no processo de distribuição de água. Estas podem chegar, em alguns casos, a mais de 50% de água tratada perdida nas redes de abastecimento devido a causas diversas. Além disso, temos apenas cerca de 20% dos esgotos tratados devidamente, fato que está vinculado diretamente à origem de várias doenças que afligem a população. Essa água tratada poderia ser reutilizada para várias finalidades, o que contribuiria, ademais, para o uso de tecnologias sustentáveis e para uma produção mais limpa, área em que o País precisa avançar", exemplifica.
Ele aponta a agricultura como principal consumidora entre os usuários de recursos hídricos, responsável por 70% do consumo total. "Tivemos avanços significativos nos investimentos para a área e, assim, evoluímos muito nos últimos anos, no entanto, precisamos investir ainda mais em pesquisa e desenvolvimento para que tenhamos métodos de irrigação mais eficientes, para que possamos priorizar o uso da água para fins mais nobres, como o consumo humano e ter mais água disponível para outros usos", defende.
Investimentos
Para superar esses gargalos, uma das estratégias adotadas, foi o investimento realizado por intermédio do Fundo Setorial de Recursos Hídricos (CT-Hidro), um dos 15 fundos administrados pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). O CT-Hidro financia a capacitação de recursos humanos, estudos e projetos na área para aperfeiçoar os diversos usos da água, de modo a assegurar o alto padrão de qualidade e a utilização racional e integrada.
Os recursos do fundo, no período de 2003 a 2010, chegaram a R$ 122 milhões dos recursos destinados a ações verticais, investidos em 685 projetos (38 editais e 23 encomendas); e R$ 179 milhões, dos recursos destinados a ações transversais, investidos em 325 projetos (39 editais e 30 encomendas), para formação de recursos humanos (principalmente técnicos, pesquisadores e gestores de recursos hídricos), apoio a grupos de pesquisa emergentes e em consolidação, apoio a eventos técnico-científicos e publicações, fortalecimento de laboratórios e fomento à pesquisa.
Segundo Sanderson, esse apoio é fundamental para a profissionalização dos técnicos com maior conhecimento do ciclo hidrológico e para a sua interação com as atividades antrópicas (ações humanas). "Propicia que o profissional se desenvolva e possa atuar de uma melhor forma nas diversas áreas que dizem respeito a recursos hídricos, que vão desde as áreas relacionadas ao clima, a tecnologias de ponta, que possam contribuir para um avanço nas questões do saneamento, na gestão da água urbana e no ambiente rural", sustenta.
Política e Legislação
Na intenção de promover a gestão integrada da água e o desenvolvimento científico e tecnológico, foi proposta pelo MCT a criação do Instituto Nacional de Águas (INA), projeto de lei em fase de tramitação no Congresso Nacional. O instituto visa articular, fomentar, executar estudos, pesquisas e desenvolvimento de soluções sustentáveis.
"Ele funcionaria com uma unidade central, provavelmente em Foz do Iguaçu e teria possivelmente outras duas unidades a operar, uma na região Sudeste e a outra na região Nordeste, em locais ainda a serem definidos. Particularidades que serão definidas no decurso deste ano", acrescenta Leitão.
Entre as realizações dos últimos anos, destaca-se ainda a criação do Sistema Nacional de Informações em Recursos Hídricos (SNIRH), pela Agência Nacional de Águas (ANA), com o apoio do MCT. Houve, igualmente, a criação da Fundação Centro Internacional de Educação, Capacitação e Pesquisa Aplicada em Águas (HidroEx), em Frutal (MG), com o objetivo de educar, pesquisar e viabilizar soluções para a gestão sustentável das águas. Entre os avanços obtidos, ele ainda cita as conquistas da Câmara Técnica de Ciência e Tecnologia (CTCT) do Conselho Nacional de Recursos Hídricos; da qual é presidente e participam 17 representantes de outras instituições.
As intensas atividades do grupo, no segundo semestre de 2010, resultaram na aprovação, pelo conselho, de três propostas consideradas importantes para o setor: a resolução que estabelece procedimentos para disciplinar as práticas de reuso direto não potável de água na modalidade agrícola e florestal e as moções que recomendam a manutenção do Programa de Pesquisas em Saneamento Básico (Prosab) e a prioridade de investimento em ciência, tecnologia e inovação na área de recursos hídricos.
(MCT/EcoAgência, 01/02/2011)