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conflito fundiário violência rural
2011-01-31 | Tatianaf

O agravamento das tensões e a iminência de um conflito no Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Esperança, o mesmo onde a irmã Dorothy Stang foi assassinada por pistoleiros em 12 de fevereiro de 2005, motivou a audiência pública, realizada em Anapu, na última terça-feira, 25 de janeiro.

A situação que era tensa, desde agosto de 2010, quando os trabalhadores do PDS Esperança começaram a reagir à retirada ilegal de madeira da floresta e incendiaram caminhões de madeireiros, agravou-se em janeiro de 2011. Os assentados estão bloqueando a entrada do PDS Esperança desde o dia 10. Eles querem impedir a retirada da madeira ilegal e exigem providências das autoridades. Eles vêm denunciando as irregularidades desde o ano passado e nenhuma providência foi tomada. Querem a retirada dos madeireiros ilegais e de pessoas que não são assentados e invadiram o PDS nos últimos meses.

Audiência pública
A ação do Ministério Público Federal (MPF) começou logo em seguida aos incidentes registrados em agosto de 2010, e vários ofícios dando conta do conflito iminente e do agravamento da situação foram enviados à autoridades federais e estaduais solicitando sua presença na área. Em 23 de agosto, enviou ofício ao Ouvidor Agrário Nacional, Gercino José da Silva Filho, pedindo a presença da Força Nacional. Em 23 de setembro, ao Ibama, solicitando fiscalização na área. Em 15 de outubro, à Polícia Militar do Estado do Pará. Em 13 de janeiro e em 18 de janeiro deste ano, foram enviados ofícios à Secretaria de Segurança Pública do Estado do Pará. Mas só depois do bloqueio da estrada é que a PM, a Polícia Civil e a Força Nacional chegaram à cidade.

A audiência pública realizada de terça-feira, 25, em Anapu contou com a presença de representantes do MPF, do Ibama, do Incra, da Comissão Pastoral da Terra, do MMA, da Secretaria de Direitos Humanos e do Ouvidor Agrário Nacional. De acordo com Antonia Mello, do Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Altamira Campo e Cidade, havia cerca de 800 pessoas presentes. Ela conta que o Ouvidor Agrário Nacional deixou bem claro que o PDS Esperança pertencia ao Incra e que nada justificava a retirada ilegal de madeira; assegurou que uma guarita de segurança na entrada do PDS seria construída para fiscalizar a saída de madeira e que as famílias que se instalaram no PDS irregularmente seriam retiradas.

Entre os que se colocam a favor das invasões de madeireiros no PDS Esperança, cresce a hostilidade contra os religiosos que atuam no local, o que vem causando mais preocupações e aumentando o clima de tensão. Não sem razão, já que por conta dos conflitos fundiários nessa região, a irmã Dorothy Stang foi assassinada há seis anos. Ela era uma incansável defensora das populações locais contra a ação ilegal dos grileiros e madeireiros da região.

O coordenador adjunto do Programa Xingu do ISA, Marcelo Salazar, que mora em Altamira, conta que vem observando um aumento na demanda por diversos produtos na região, entre eles madeira. “Creio que isso se deve em parte ao crescimento da população e de investimentos no município, direta ou indiretamente ligados à especulação em torno do licenciamento da usina hidrelétrica de Belo Monte”.

Em nota publicada ontem, 26 de janeiro, no site do MPF do Pará, o procurador da República, Bruno Gustchow, de Altamira, afirmou que quem retira madeira do assentamento está cometendo crime e que o desmatamento no PDS Esperança é ilegal. Gustchow avisou aos presentes: “nossas principais preocupações são a segurança das pessoas, a apuração dos crimes que vêm ocorrendo no assentamento e a garantia de que a área seja destinada verdadeiramente a clientes da reforma agrária”. ( Veja a nota no site do MPF-PA).

Em carta divulgada no último sábado, 22 de janeiro, os trabalhadores relatam que de 2005 a 2009 não houve retirada ilegal de madeira e o Esperança cresceu no seu ritmo. A partir de 2010 começaram as invasões de madeireiros. Com o apoio da prefeitura local e do sindicato de trabalhadores rurais, a associação local foi destruída. A carta relata ainda que a situação foi alvo de inúmeras denúncias ao Incra e ao Ibama e não foram tomadas medidas para impedir as invasões. (Leia abaixo a carta na íntegra).

Anapu, PA – 22 de janeiro de 2011
Nestes dias vamos comemorar pela sexta vez a vida de Irmã Dorothy Stang, aquela que perdeu sua vida em defesa do Projeto de Desenvolvimento Sustentável em Anapu, Pará. O projeto é do Governo Federal, idealizado como “o jeito Amazônico de fazer Reforma Agrária.” Nestes dias o PDS Esperança, Anapu, Pará, mais uma vez vira palco de tensão e ameaça. De 2005 até 2009, o PDS Esperança cresceu devagar, na marcha do povo. Durante estes 4 anos e meio, não houve invasão de madeireiro, nem venda de madeira na parte dos assentados. Em 2008 houve eleições municipais. Os candidatos vitoriosos ganharam as eleições nas costas de dinheiro recebido de madeireiros e promessas de apoio para os mesmos ao longo do mandato. Em dezembro do mesmo ano, começou a invasão maciça de madeireiros na área, invasão que continuou até 10 de janeiro de 2011. Houve também nesta época uma enchente de gente dentro do PDS, todos em busca de madeira e dinheiro fácil.

Desde dezembro, 2009 as famílias assentadas e defensoras do Projeto de Desenvolvimento Sustentável começaram a luta em defesa de suas terras, do Lote 55 e da floresta. Houve denuncias por cima de denuncias, mas nada foi feito na parte do governo federal ou estadual. Em fevereiro de 2010 o sindicato dos trabalhadores rurais com o apoio da prefeitura de Anapu conseguiram o desmonte arbitrário da associação do PDS, usando de métodos nada éticos e transparentes, tudo a fim de controlar acesso a floresta e lucrar da madeira ilegal, destruindo enfim o Projeto de Desenvolvimento Sustentável.

Após um ano de denuncias e procura de ajuda das autoridades competentes sem resultados os trabalhadores e as trabalhadoras do PDS Esperança que acreditam no Projeto se organizaram e no dia 10 de janeiro de 2011 bloquearam a estrada central na entrada do PDS empatando a entrada e saída de caminhões madeireiros ilegais. Estão nesta estrada até o dia de hoje. Este povo só empata a passagem de caminhões madeireiros. Outros veículos passam à vontade. Faz 12 dias que o povo vive acampado na beira da estrada desempenhando o trabalho do governo federal, IBAMA e outras entidades governamentais. A floresta no PDS é reserva intocável de forma individual. Conforme a lei, só se trabalha nesta reserva protegida de forma coletiva e em dialogo com a Associação, o Ministério Público Federal, INCRA e IBAMA. As reivindicações destes trabalhadores e trabalhadoras são estas:

1. 1. Vistoria imediata da estrada financiada por INCRA e feita em convenio com a prefeitura local

1. 2. Execução imediata das decisões da Revisão e Supervisão Ocupacional feita pelo INCRA durante 2010, como também novas revisões em áreas já alteradas. Que sejam realizadas as revisões ocupacionais nos PA’s e áreas “sob judice”, reforçando o processo judicial. Que a procuradoria do INCRA age com mais força e vontade sobre esta questão dos lotes “sob judice”

1. 3. Proibir exploração de madeira ilegal dentro do assentamento e a retirada dos
madeireiros que vivem irregularmente dentro do PDS. Este controle deve ser
feito através da construção e manutenção de duas guaritas colocadas nas duas entradas no Projeto, guaritas a ser mantidas pelo próprio INCRA.

No ano internacional da Floresta, este povo do PDS são os heróis e as heroínas da nossa história. O governo federal fala, decreta e promete solenemente em seminários e reuniões nacionais e internacionais a defender e proteger as florestas brasileiras, patrimônio da nação e da humanidade. Mas, de fato, quem defende nosso patrimônio são estes trabalhadores e estas trabalhadoras simples, humildes e comprometidas que deixam suas casas e como Davi, enfrentam os Golias atuais, os donos do poder e do dinheiro. Este povo corajoso está sendo ameaçado, corre risco de perder tudo, até a vida, se o INCRA e o Governo Federal deixam de também enfrentar a invasão e venda ilegal de madeira e terra no PDS Esperança.

Clamamos ao Governo Federal e INCRA que deixem de lado interesses e exigências partidárias para defender seu próprio Projeto de Desenvolvimento Sustentável-PDS Esperança. Chamamos também a todas as entidades de se solidarizar com a luta destes trabalhadores corajosos que neste projeto acredita ao ponto de arriscar suas vidas. Vamos dar um basta a exploração ilegal de madeira.

assina:

PDS Virola Jatobá - Gleba Belo Monte

Rio Areia – Lote 125- Gleba Bacaja

AACMRR – Gleba Manduacari

ASAGRIM – Gleba Manduacari

ADM – Gleba Manduacari

Lote 86 – Flamengo Sul – Gleba Bacaja

Lote 95 – Flamengo Sul - Gleba Bacaja

Comunidade São Jorge – Ramal Bacaja - Surubim

ASA - Ladeirão Gleba Belo Monte

Movimento Xingu Vivo para Sempre
 
(Por Inês Zanchetta, ISA, 30/12/2010)


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