Uma nova espécie de planta do Nordeste brasileiro passa a figurar na lista da flora brasileira. Gymnanthes boticario encontrada por pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) em 2006, foi descrita em artigo publicado em dezembro de 2010 no volume 40 da revista alemã Willdenowia – Anuário do Jardim Botânico e do Museu Botânico de Berlin-Dahlen, publicado.
Pertencente ao gênero Gymnanthes, da tribo Hippomaneae, a nova espécie é da família Euphorbiaceae, a mesma de velames, urtigas, mameleiros e leiteiras. A descoberta da nova planta aconteceu durante projeto que pesquisava a diversidade desta família na Caatinga nordestina, realizado de 2006 a 2008 por uma equipe da UFPE – Laboratório de Morfo-Taxonomia Vegetal, com o apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
Para fazer referência ao apoio da instituição, os autores que descreveram o arbusto batizaram a espécie com o nome “Boticário”. A Gymnanthes boticario une-se ao anfíbio Megaelosia boticariana, aos peixes Aphyolebias boticarioi e Listrura boticario, além de outra espécie vegetal, a Passiflora boticarioana Cervi, que também homenageiam a Fundação Grupo Boticário.
Descoberta
Até a descoberta da nova espécie, eram conhecidas 45 plantas deste gênero Gymnanthes no mundo, três delas no Brasil.
Habitante de áreas de caatingas arenosas ou pedregosas, com altitude de 400 a 900 metros, a nova espécie pode atingir de um a quatro metros de altura. Suas flores são pequenas, de cor amarelo-creme e sem perfume.Até o momento, sua ocorrência está registrada para os estados de Pernambuco, Piauí, Paraíba, Ceará, Bahia e Rio Grande do Norte.
A espécie foi coletada, pela primeira vez, em 31 de maio de 2006, na cidade de Mirandiba (PE), pela pesquisadora Maria de Fátima de Araújo Lucena. Em 2007, ela registrou novos indivíduos no Parque Nacional Serra da Capivara (PI).
À época da descoberta, Maria de Fátima, que atualmente é pesquisadora do Laboratório de Botânica da Universidade Federal de Campina Grande (PB) – Campus de Patos, desenvolvia pesquisa para o projeto financiado pela Fundação Grupo Boticário, que também fazia parte de sua tese de doutorado, sob a orientação de Marccus Alves. Para a identificação da nova espécie, ela contou com a ajuda do especialista alemão Hans-Joachim Esser, do Botanische Staatssammlung de Munique.
Recentemente, foram encontradas novas populações da Gymnanthes boticario no município de Pedra Branca (PB), na Serra de Olho d’Água, uma região a 740 metros de altitude. De acordo com Maria de Fátima, todos os espécimes já coletados foram encontrados em remanescentes de Caatinga bem preservados, com pouca intervenção humana e, por vezes, de difícil acesso, com vegetação predominante arbustiva e arbórea.
Inventário da Caatinga
Durante o projeto que deu origem à descoberta de Gymnanthes boticario, denominado “Velames, urtigas, mameleiros e leiteiras: a diversidade de Euphorbiaceae no semiárido nordestino”, foi feito um inventário florístico da família Euphorbiaceae em áreas consideradas prioritárias para a conservação na Caatinga e com necessidade de investigação científica ou cujo conhecimento botânico fosse escasso. Os locais selecionados para o estudo foram duas unidades de conservação (Parques Nacional Serra da Capivara – Piauí e Parque Nacional Serra de Itabaiana - Sergipe), o município de Mirandiba (Pernambuco), a região dos Cariris Paraibanos (Paraíba) e uma área no município de Porto da Folha (Sergipe).
Maria de Fátima explica que, com os produtos gerados no projeto, foi possível identificar o panorama da diversidade taxonômica desse grupo de plantas em algumas áreas do semiárido do nordeste brasileiro. Foram registradas 28 novas ocorrências de espécies da família para a região Nordeste, além de identificadas populações de espécies raras e a descoberta da nova espécie para a ciência. Também foi realizado extenso levantamento da família nos principais herbários da região, com o objetivo de complementar dados de distribuição geográfica das espécies.
A pesquisa também confirmou a necessidade urgente de inventariar novas áreas no bioma Caatinga. “A identificação de áreas e de ações prioritárias, como a pesquisa, tem-se mostrado um valioso instrumento para a conservação e proteção da biodiversidade na Caatinga, no Brasil e no mundo”, diz.
Por apresentarem alto potencial econômico, o gerenciamento sustentável de unidades de conservação e das áreas consideradas prioritárias para a conservação do bioma pode ajudar na manutenção das espécies da família Euphorbiaceae. “Ainda mais porque áreas como aquelas nas quais Gymnanthes boticario foi encontrada têm tornado-se cada vez mais raras, pois a Caatinga tem sido degradada pelo manejo inadequado de sua vegetação, pela retirada de madeira e lenha, exploração de pecuária extensiva e agricultura. Essa situação coloca em risco a biodiversidade desse bioma com número expressivo de espécies raras e endêmicas”, revela.
A região nordeste do Brasil comporta atualmente 245 espécies da família Euphorbiaceae, distribuídas, em sua grande maioria, nas áreas de Caatinga. Além dessa expressiva ocorrência, a família contempla um número considerável de espécies com rico potencial econômico no aspecto farmacológico-medicinal, industrial, madeireiro, ornamental, na produção de alimentos. Alguns exemplos são: mandioca ( Manihot esculenta Crantz), mamona ( Ricinus communis L), seringueira ( Hevea brasiliensis), quebra-pedra ( Phyllanthus niruri L), mameleiro ( Croton blanchetianus Baill), quebra-faca ( Croton micans Müll. Arg.), velame ( Croton heliotropiifolius Kunth.), urtiga ( Cnidosculos urens (L.) Arthur), flor-de-papagaio ( Euphorbia pulcherrima), coroa-de-cristo ( Euphorbia milli Dês Moul.) e pinhão ( Jatropha curcas L.). Ainda não se sabe se Gymnanthes boticario tem algum potencial de uso econômico.
Sobre a Fundação Grupo Boticário– A Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza é uma organização sem fins lucrativos cuja missão é promover e realizar ações de conservação da natureza. Criada em 1990 por iniciativa do fundador do Boticário, a atuação da Fundação Grupo Boticário é nacional e suas ações incluem proteção de áreas naturais, apoio a projetos de outras instituições e disseminação de conhecimento. Desde a sua criação, a Fundação Grupo Boticário já apoiou já doou U$ 10,3 milhões para 1.246 projetos de cerca de 400 instituições em todo o Brasil. A instituição mantém duas reservas naturais, a Reserva Natural Salto Morato, na Mata Atlântica; e a Reserva Natural Serra do Tombador, no Cerrado, os dois biomas mais ameaçados do país. Outra iniciativa é um projeto pioneiro de pagamento por serviços ecossistêmicos em regiões de manancial, o Projeto Oásis. Na internet: www.fundacaoboticario.org.br, www.twitter.com/fund_boticario e www.facebook.com/fundacaoboticario.
(Texto recebido por E-mail, 26/01/2011)