Em 1998, os arqueólogos Alenice Baeta e Fabiano de Paula, de Minas Gerais, descreveram um sítio arqueológico na cidade de Terra Santa, Pará. Localizado na praia que fica em frente à cidade, o que parece um simples conjunto de blocos rochosos, na verdade, guarda uma série de gravuras rupestres, "cerca de 15 representações de rostos", estima Edithe Pereira, arqueóloga do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), que acaba de retornar de uma visita técnica à região.
Sítios como o Terra Santa são comuns na região amazônica: temporariamente submersos no período das cheias, revelam-se durante o tempo de estio, quando podem ser documentados e pesquisados. No entanto, apesar do longo período que passam sob as águas, ainda assim eles correm riscos frente à ação humana.
Edithe afirma que isso está acontecendo em Terra Santa: "Como o sítio é bem próximo ao trapiche da cidade, muitos barcos usam as pedras para fazer atracação, isso está deteriorando o material. Além disso, com a falta de sinalização, no inverno, os cascos podem bater nas pedras, o que também provoca a deterioração do sítio".
Os danos já estão comprovados. A pesquisadora explica que, em foto tirada em 1998, havia uma gravura que hoje não existe mais. Devido ao risco, Edithe já enviou ao Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional (Iphan), no qual solicita a proteção do local, buscando impedir que os barcos atraquem no sítio. "A prefeitura deve providenciar um local adequado aonde os barcos possam ser atracados", defende.
Arqueologia subaquática
Mas, como as figuras foram feitas, se o material está sob as águas? Edithe Pereira explica que há uma série de hipóteses que podem explicar essa situação. Por exemplo: os desenhos foram feitos em um momento histórico em que o nível da água era muito baixo e as rochas ficavam sempre expostas; ou ainda, foram feitos durante os períodos de estio quando as rochas ficavam fora da água.
Para a Edithe, "Eu considero [no caso do sítio de Terra Santa] mais plausível a hipótese da diferença entre a cheia e a seca, ou seja, que eles aproveitaram o período de seca para fazer as gravuras", esclarece a pesquisadora.
Goeldi e a arqueologia subaquática
Em 2000, o Goeldi iniciou trabalhos de estudo e salvamento dos sítios arqueológicos existentes na região de Porto Trombetas, também no Pará. Nessa época, o sítio Mussurá, que depende do fluxo das águas do rio Trombetas para vir à luz, passou a despertar interesse dos pesquisadores da instituição. Em artigo publicado sobre essa pesquisa, Edithe relata que durante mais de sete anos esperou-se que o nível das águas do rio Trombetas baixasse a ponto de expor as gravuras pré-históricas, para que pudessem ser documentadas e estudadas.
Como isso não aconteceu, em 2004, de modo pioneiro, a documentação do sítio foi realizada sob a água, em parceria com arqueólogos mergulhadores do Centro de Estudos de Arqueologia Náutica e Subaquática da Universidade Estadual de Campinas, tornando-se o primeiro trabalho de documentação submersa de um sítio com arte rupestre realizado no mundo.
(Por Diego Santos, Agência Museu Goeldi, EcoAgência, 19/01/2011)