Diante das chuvas que provocaram a morte de mais de 670 pessoas, na Região Serrana do Rio de Janeiro, especialistas alertam: as catástrofes naturais devem continuar e serão mais frequentes no Brasil.
O ecólogo americano Philip Fearnside, que atua no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, afirma que devemos ter, nos próximos anos, chuvas cada vez mais fortes, secas mais extremas e o aumento na incidência de cinclones no país. Segundo ele, o aquecimento global e o desmatamento nas florestas agravaram também o clima no Rio de Janeiro.
“Acredito que isso influenciou o deslocamento da Zona de Convergência do Atlântico Sul para aquela região, por conta do aquecimento dos oceanos”, explica. A Zona de Convergência é um corredor de umidade proveniente da região Amazônica. Todo ano, ela se desloca e, segundo Fearnside, as águas quentes atraem essa corrente.
Para Milton Nogueira, ex-funcionário das Nações Unidas e secretário do Fórum Mineiro de Mudanças Climáticas, três componentes influenciaram nesta tragédia: a questão local, que envolve a ocupação desordenada do solo e o descuido das autoridades, a própria natureza e as mudanças climáticas dos últimos 50 anos. Ele lembra que as alterações atmosféricas são globais e que o mesmo cenário aconteceu agora na Austrália, onde foram registrados 614 mm em uma semana na cidade de Peachester. Em apenas um dia foram registrados 182 mm em Nova Friburgo.
“Estas mudanças climáticas vão causar um desequilíbrio. São mais chuvas no Sudeste e seca no Nordeste. O mesmo fenômeno no Sul do deserto do Saara, que sofre com o excesso de chuvas, e secas na Etiópia”, acrescenta Nogueira. Desta forma, a medida mais urgente agora seria a adaptação das cidades, como retirar a população das áreas de risco.
Tempo
Felipe Farias, meteorologista do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/Inpe), explica que em meses quentes, como janeiro, aumenta a quantidade de vapor de água na atmosfera. Isso cria canais de umidade, que são comuns nesta época do ano, e forma nuvens mais pesadas. O encontro da Zona de Convergência do Atlântico Sul com a frente fria vinda do Polo Sul foi o catalisador para a intensidade das chuvas no Sudeste.
“Como ainda há bastante umidade na atmosfera, há previsão de chuvas até quinta-feira, mas em forma de pancadas no final da tarde”, explica Farias. Os temporais estão concentrados no final do dia exatamente pela influência do sol, que provocará a evaporação da água e consequentes chuvas.
Área de Risco
O geólogo Telésforo Martinez diz que a Região Serrana do Rio é geologicamente considerada uma área de alto risco. Para ele, a situação se agravou depois da intervenção do homem. “É um solo fino em cima de rochas duras, graníticas. As ocupações irregulares desestabilizaram o terreno. Os cortes nas encostas e a destruição da vegetação criaram um ambiente onde o excesso (de água) faz com que a terra deslize”.
Segundo ele, se não houvesse ocupações irregulares, deslizamentos desse tipo só ocorreriam em situações de terremoto ou erupção de vulcão, casos pouco prováveis no país. interferência do homem explicaria também as enchentes.
Segundo Martinez, as construções nas margens enchem o fundo dos rios de terra, lixo e outros detritos, provocando o assoreamento. Com isso, o rio passa a suportar cada vez menos água, provocando enchentes quando chove em grande quantidade. “Se não tivesse ação humana, com certeza não estaríamos chorando por tantas mortes”.
(Por Luciana Rebouças e Victor Albuquerque, Correio 24 horas, 18/01/2011)