A fuligem emitida sobre a comunidade de Santa Cruz (RJ), pela Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), será analisada pelo ambulatório de Doenças Pulmonares Ambientais e Ocupacionais da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), ligada à Fiocruz. Segundo especialistas, a poeira emitida sobre a comunidade do entorno da empresa pode conter elementos cancerígenos.A informação foi divulgada pela Agência Brasil.
O acidente, que atingiu a comunidade de Santa Cruz, já havia ocorrido em agosto deste ano e voltou a acontecer no último dia 26, deixando o entorno da empresa e a comunidade atingida pela fuligem que a empresa afirma ser grafite.
A fuligem foi espalhada pelo vento nas redondezas da siderúrgica após um defeito em um guindaste da aciaria da CSA. O defeito obrigou a empresa a descartar ferro gusa nos poços de emergência licenciados para esse fim e que foram espalhados pelo vento no entorno da usina, atingindo as comunidades vizinhas.
Por ocasião do primeiro acidente, a empresa foi multada em R$ 1,8 milhão, valor renegociado pela empresa para R$ 1,3 milhão, sendo R$ 800 mil em obras para comunidade e R$ 500 mil para os cofres do governo. Desta vez, além de ser obrigada a funcionar com no máximo de 70% da sua capacidade, a empresa também será multada.
Ainda assim, através de uma nota, a empresa tentou amenizar os fatos, afirmando que o grafite é a mesma substância que compõe a ponta dos lápis escolares e, portanto, não é tóxico. “A poeira de grafite forma flocos de grandes dimensões, que não chegam aos pulmões”, diz a nota.
Técnicos do Inea, órgão ligado à Secretaria Estadual de Meio Ambiente, coletaram amostras das partículas expelidas, mas a informação é que ainda não há previsão de quando o resultado da análise laboratorial ficará pronto.
Neste contexto, o laudo foi solicitado pela Fiocruz para ser analisado pelo ambulatório de Doenças Pulmonares Ambientais e Ocupacionais da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP), ligada à entidade. O objetivo é obter uma avaliação qualitativa e quantitativa do material, já que a poeira da siderúrgica pode não ser composta apenas de grafite.
Em outros acidentes com siderúrgicas registrados na historia, o que se vê, em geral, é que a poeira é composta por metais pesados como zinco e cromo. Neste contexto, o porcentual de fração respirada pela população é alto.
Segundo especialistas, mesmo que a fuligem tenha sido formada apenas por grafite, principalmente crianças e idosos podem ter quadros de asma e bronquite agravados, além de irritações na pele. Já as partículas menores, dependendo do tamanho, podem, sim, chegar aos alvéolos pulmonares e aumentar as possibilidades do desenvolvimento de câncer.
O acompanhamento da saúde da pop0ulação foi sugerido pelo ambulatório da Fiocruz. Só assim será possível verificar a evolução dos quadros de irritação respiratória e cutânea. O Sistema Único de Saúde (SUS) e a empresa também devem colaborar na identificação de casos de comprometimento da saúde em função das emissões.
CSA e CSU
A CSA, fruto de uma parceria entre a alemã ThyssenKrupp e a Vale, foi inaugurada em julho do ano passado e funciona com uma licença de pré-operação nos mesmos moldes propostos para a construção da Companhia Siderúrgica de Ubu (CSU), também da Vale, prevista para o município de Anchieta, sul do Espírito Santo.
Em cinco meses de funcionamento, a CSA já levou duas multas por poluir acima do tolerável pela saúde humana, fomentando o receio das comunidades que vivem no entorno da área pretendida pela Vale, em Anchieta. A Chapada do A, por exemplo, após forte resistência para deixar suas terras, será mantida na região praticamente ilhada pelo complexo industrial.
O alerta sobre as atividades da CSA chegou a ser feito pelo grupo “Atingidos pela Vale”, em um encontro realizado para debater os impactos da CSU, em Anchieta, em meados deste ano. Na ocasião, eles denunciaram o contraste entre o discurso eufórico de desenvolvimento ante a vinda da CSU ao Estado e o discurso assistido por todos os atingidos pela Vale no encontro Internacional realizado em meados deste ano, no Rio de Janeiro. “A Vale não é símbolo de desenvolvimento em nenhuma das regiões em que atua”.
O encontro mostrou estratégias utilizadas pela CSA para obter lucros e se tornar competitiva, sem se importar com os impactos ambientais, sociais, econômicos, e com o desrespeito aos direitos das populações atingidas.
Já a CSU, que será construída no Espírito Santo com irrestrito apoio do governo do Estado, teve seu licenciamento adiado após forte pressão da sociedade civil organizada sobre o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), acusado de defender a instalação do projeto no balneário.
Além da poluição elevada, a informação é que a siderúrgica ocupará áreas de restinga e de comunidades tradicionais em Anchieta.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 04/01/2011)