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2010-12-17 | Tatianaf

O Ministério Público Estadual (MPE) conseguiu na Justiça uma liminar que obriga as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) a adotar medidas de segurança para o armazenamento correto de rejeitos nucleares resultantes da extração de urânio na zona rural de Caldas, cidade do Sul de Minas, e do processamento no local de um concentrado de urânio e tório vindo de São Paulo.

De acordo com a liminar, a INB deverá cumprir em 90 dias as determinações da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) que preveem a reparação de galpões onde ficam armazenados tambores de metal e de plástico com rejeitos radioativos. Esses recipientes ainda deverão ser substituídos se estiverem avariados.

A medida judicial obriga a INB a fazer também análises de radiação no solo, nos animais, nas plantas, no lençol freático e nos rios que cortam as cidades da região. Um laudo técnico deverá mostrar ainda a eficiência do sistema de monitoramento ambiental e de uma bacia a céu aberto onde são depositados materiais radioativos.

Na Ação Civil Pública (ACP) que resultou na liminar, o promotor de Justiça José Eduardo de Souza Lima afirma que a INB, uma sociedade de economia mista federal, não está cumprindo de forma eficiente as medidas de segurança sugeridas pela CNEN.

Outra questão abordada na ACP diz respeito à construção de um aterro sanitário dentro do terreno da INB. O empreendimento estava sendo cogitado para o recebimento do lixo de alguns municípios da região.

Entretanto, a decisão liminar vetou essa ideia enquanto a empresa não cumprir todas as medidas ambientais de segurança para a desativação e limpeza completa das estruturas de extração e armazenamento dos materiais radioativos. O MPE quer também na ACP que a INB seja condenada a indenizar eventuais danos que tenha causado ao meio ambiente e à população da região.

Entenda o caso
Desde 1981, a INB possui autorizações da CNEN para explorar e processar minério de urânio em uma mina a céu aberto em Caldas. Até 1995, a empresa teria extraído mais de 45 milhões de metros cúbicos de rejeitos e materiais estéreis, gerando um buraco de cerca de 180 metros de profundidade e mil e duzentos metros de diâmetro.

“A lavra e o beneficiamento de tão expressiva quantidade de material radioativo geraram, de imediato, grande preocupação para a comunidade local, considerando-se o potencial altamente poluidor do urânio e dos produtos derivados”, declarou o promotor de Justiça.

Em 1990, a empresa obteve da CNEN autorização para realizar o processamento de um concentrado radioativo de urânio e tório, vindo de São Paulo. Estima-se que 11 mil toneladas do produto tenham sido processados pela empresa. Isso teria acentuado “a preocupação com a forma de armazenamento dos materiais radioativos e dos respectivos rejeitos”.

Na época houve grande mobilização das imprensas regional e nacional, de várias entidades civis e das populações dos municípios vizinhos. Em 1991, a CNEN informou ao MPE que rejeitos de urânio eram lançados, desde 1981, em um sistema de barragens construído com esse propósito. Já em relação aos rejeitos do processamento de urânio e tório, a CNEN disse que eram armazenados em tambores de metal ou plástico dentro de galpões, silos de concreto, trincheiras cobertas ou a céu aberto.

Naquela ocasião, a CNEN declarou também que, embora não existisse risco imediato em se manter o material estocado a céu aberto, a maneira mais segura de armazenar os rejeitos seria em galpões cobertos. “O armazenamento a céu aberto só poderia ser adotado como uma solução provisória”, afirmou relatório da CNEN. A comissão disse também que em 1988 aprovou um projeto para a construção de novas áreas cobertas para armazenar os rejeitos.

“Ao afirmar que não há risco imediato, reconhece a CNEN a existência de risco mediato. Ora, se este risco mediato data de 1988, quando ela aprovou o projeto dos galpões para a empresa, aquilo que era mediato está se tornando imediato e iminente”, aponta trecho da ACP. Em outra parte da ação, o MPE afirma que “a CNEN está falhando em sua atividade fiscalizadora, ao permitir que a empresa protele a construção dos galpões e continue agindo em desacordo com as normas de segurança técnica, colocando em risco a incolumidade de pessoas e o meio ambiente como um todo”.

Para embasar a ACP, o promotor de Justiça usou, entre outras coisas, um relatório feito em 2008 pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). A vistoria feita pelo Ibama apontou a existência de recipientes corroídos, material radioativo derramado no chão e problemas no sistema de isolamento dos galpões que permitiam ao lugar se tornar moradia de animais. Durante a vistoria, os técnicos do Ibama encontraram um cobra morta sobre uma poça de líquido viscoso, de coloração negra, que vazou de um recipiente. Outros animais também foram encontrados no local.

“Não é fantasioso projetar um cenário em que a contaminação do meio ambiente constitui hipótese real e premente, porque um animal que faça de um dos galpões a sua toca ou o seu ninho, uma vez que caia na cadeia alimentar, sofrendo a ação de predadores naturais, estará servindo de vetor para que se contaminem outros elementos do ecossistema, inclusive corpos hídricos”, afirma trecho da ACP.

O relatório do Ibama concluiu ainda que a radiação em um dos galpões permitiria a uma pessoa trabalhar no local apenas duas semanas por ano. “É fácil concluir que os animais encontrados, inclusive em estado de mumificação, em três galpões, submeteram-se a níveis de radiação infinitamente superiores”.

(EcoDebate, 17/12/2010)


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