A Licença Prévia da UHE Teles Pires foi concedida nesta segunda-feira (13) pelo IBAMA. O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), MauricioTolmasquim, havia “previsto” a sua emissão e divulgou a notícia no twitter. Quando questionei publicamente a certeza com que Tolmasquim antecipava esse ato administrativo do IBAMA, um representante de um site de notícias de energia sugeriu que há uma “interação entre MME e MMA nessa área”.
Pois bem, interação entre o Ministério de Minas e Energia (MME), Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais (IBAMA) não falta, quando o tema é emissão de licença ambiental ilegal para grandes projetos hidrelétricos na Amazônia. Foi assim com as usinas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, com Belo Monte no rio Xingu. Então o modus operandicontinua o mesmo e ainda é reforçado pelo nosso judiciário que nunca vê erro algum nos processos de licenciamentos patrolados pelo governo federal.
E dá para antecipar que vai piorar, porque vem aí o grande chefe Edison Lobão, gestado pelo clã Sarney, e bem alimentado pela ex-ministra de Minas e Energia e agora presidente eleita Dilma Rousseff. Outro dia em alguma matéria estava escrito que Dilma era uma especialista em energia e como tal reconduz ao MME um autoritário que sabidamente não entende absolutamente daquilo que vai tratar sua pasta. Que ofensa para os especialistas em energia!
Grandes complexos hidrelétricos foram inventados no governo Lula e tudo indica que outros estão sendo arranjados para programar o que se chama de crescimento ou desenvolvimento, utilizando energia que não é limpa, nem barata e nem sustentável. Essa tal energia “limpa, barata e sustentável” tem sido a cruz que os povos amazônicos estão carregando como um “pagador de promessas”. O governo promete e o povo paga!
A usina Teles Pires faz parte de um conjunto de cinco aproveitamentos no rio Teles Pires e é a maior em capacidade instalada, aliás outro conto do vigário. Capacidade instalada de uma usina hidrelétrica é aquele número que o governo usa para fazer de conta, mas que na verdade o que a usina vai mesmo produzir não chega, às vezes, a um terço do anunciado. Nesse caso, de Teles Pires, o anúncio é de 1.820 MW de capacidade instalada, mas só iria mesmo produzir mesmo 900 MW. Em Belo Monte é ainda pior, pois de 11.000 MW anunciados de capacidade instalada não chegaria a 1.100 MW, segundo os verdadeiros especialistas, aqueles que não pertencem à mesma escola de Dilma Rousseff e de Edison Lobão.
Além das 63 condicionantes e recomendações feitas pela equipe técnica do Ibama, no parecer que subsidiou a Licença Prévia do Teles Pires, o presidente da Funai, Marcio Meira, assinou um ofício em que “não vê óbices para a emissão da Licença Prévia”. Acrescentou, então, mais 14 condicionantes. Dá para imaginar como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da UHE Teles Pires está mesmo furado como uma peneira! Precisa de todas essas emendas na forma de condicionantes para poder tapar todos os buracos.
Entre as condicionantes que a FUNAI listou estão algumas que chamam a atenção: apresentar programas de monitoramento dos impactos na pesca que afetarão os povos indígenas; analisar a qualidade da água rio abaixo da UHE Teles Pires para identificar os impactos nos ecossistemas; fazer a classificação dos rios nas terras indígenas e indicar os fatores que podem afetá-los; fazer estudos sobre os indígenas isolados na região da UHE Teles Pires. Com esses exemplos dá para se ter uma idéia das deficiências dos estudos analisados pelo Ibama.
A LP foi concedida no escuro, sem conhecimento e sem o diagnóstico dos principais impactos que vão afetar os povos indígenas e os ecossistemas da região e o EIA é tão ruim que, além das lacunas explícitas nas condicionantes tanto do IBAMA como da Funai, o próprio Tribunal de Contas de União já havia detectado as irregularidades. Até medidas necessárias para ampliação da vida útil da UHE Teles Pires, sob risco associado à manutenção das turbinas, está entre as condicionantes do parecer técnico.
Será mesmo que a equipe técnica do IBAMA é tão pressionada politicamente a ponto de inserir condicionantes para não escrever com todas as letras que o empreendimento não tem viabilidade ambiental? O parecer técnico tem frases do tipo "condicionantes deverão ser cumpridas pelo empreendedor para assegurar, na opinião desta equipe, a viabilidade ambiental do empreendimento" e constata que “algumas questões presentes no estudo de impacto ambiental da UHE Teles Pires deverão ser objetos de ajustes”.
Todas as 63 condicionantes/recomendações que estão no parecer técnico que subsidiou a LP da UHE Teles Pires apontam para um EIA/RIMA que não cumpriu seu papel de diagnosticar impactos sociais e ambientais. Imagine-se a qualidade dos estudos apresentados. Reproduzo aqui alguns trechos do acórdão do TCU sobre a UHE Teles Pires:
(...) Nesse sentido, o EIA do AHE Teles Pires não apresentou a análise dos impactos das alternativas do projeto;
59. O RIMA não apresenta informações sobre os objetivos e as justificativas do empreendimento de forma clara. Não há uma seção no relatório tratando especificamente destes aspectos, apenas menções sobre a importância da obra nas considerações finais do documento. Tampouco há a discussão da relação e da compatibilidade do AHE com as políticas setoriais, planos e programas governamentais;
65. O relatório não atende esse aspecto, pois apenas enfatiza a importância estratégica do AHE Teles Pires para o alcance das necessidades de desenvolvimento socioeconômico do país. Não são apresentadas informações que permitam comparar diferentes possibilidades e alternativas, de modo a facilitar a formação de juízo de valor sobre a conveniência ou não de instalação do empreendimento.
66. O RIMA deve ser apresentado de forma objetiva e adequada a sua compreensão. As informações devem ser traduzidas em linguagem acessível, ilustradas por mapas, cartas, quadros, gráficos e demais técnicas de comunicação visual, de modo que se possa entender as vantagens e as desvantagens do projeto, bem como todas as consequências ambientais de sua implementação (parágrafo único).
67. Considera-se que o relatório não atendeu esse aspecto. A linguagem empregada frequentemente utiliza termos técnicos, de difícil entendimento pelo público leigo. Há longos trechos apenas com texto, sem o recurso de gráficos ou quadros sintéticos que ajudem a explicar e contextualizar os dados apresentados. Não foram apresentadas informações suficientes para permitir a compreensão dos impactos do empreendimento comparativamente com possíveis alternativas.
(Blog Telma Monteiro, 14/12/2010)