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2010-12-01 | Tatianaf

Este ano, provavelmente, foi o mais quente da história: altas temperaturas oceânicas arrasaram os corais tropicais, o calor e a seca tomaram conta da Rússia e as inundações devastaram o Paquistão. Delegados internacionais, desde ontem em Cancun, buscam soluções na 16ª Conferência das Partes (COP 16) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática.

Apesar das evidências científicas cada vez mais contundentes quanto à urgência e aos riscos da mudança climática, e ao fato de cada vez mais se defender a adoção de medidas, é improvável que os representantes de quase 200 países, reunidos até o dia 10 de dezembro neste balneário, cheguem a um novo acordo vinculante. Quando muito, questões como reflorestamento, financiamento climático e compromissos em matéria de mitigação serão mais desenvolvidos com a escassa esperança de que a próxima conferência, em 2011 na África do Sul, possa produzir algum tipo de tratado.

“As emissões de carbono continuam aumentando apesar da recessão econômica, e nunca vi expectativas tão baixas em relação a uma Conferência das Partes”, disse Richard Somerville, destacado cientista climático da Scripps Institution of Oceanography, com sede no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos. “A ciência é bastante convincente quanto à necessidade de uma ação urgente. Não temos outros cinco anos para chegar a um acordo”, disse Richard à IPS/TerraViva.

Em 2009, ele e outros cientistas elaboraram uma atualização sobre as últimas descobertas da ciência climática: “The Copenhagen Diagnosis” (O Diagnóstico de Copenhague). Esse informe concluiu que as emissões mundiais de carbono deveriam chegar a um topo e começar a baixar antes de 2020, para se ter esperança de impedir que o aquecimento global supere os dois graus.

Contudo, os negociadores em Cancún não estarão majoritariamente agindo em nome da ciência, mas de seus interesses nacionais indicados por suas direções políticas, que em termos gerais não compreendem a mudança climática, disse Richard. “As nações industrializadas pensam que podem adaptar-se às temperaturas mais quentes. Não vejo como podemos fazer para manter o aquecimento abaixo dos dois graus”, ressaltou.

A Convenção Marco foi criada depois da Cúpula da Terra realizada no Rio de Janeiro em 1992 para abordar a mudança climática. Nessa oportunidade, praticamente todos os países chegaram a um acordo para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa, particularmente do dióxido de carbono. Em Kyoto, no Japão, os países industrializados prometeram, em 1997, reduzir em 5% suas emissões, tomando por base os índices de 1990.

Porém, as emissões mundiais de dióxido de carbono derivadas dos combustíveis fósseis em 2008 foram 40% maiores do que as de 1990, principalmente porque países ricos como os Estados Unidos não concretizaram reduções, enquanto as emissões de algumas nações emergentes, como a China, aumentaram drasticamente.

Na COP 15, realizada há um ano na Dinamarca, os países industrializados chegaram a um acordo para manter o aumento da temperatura global abaixo dos dois graus. No entanto, apesar de cumprirem seus vagos compromissos de redução de emissões estipulados no Acordo de Copenhague, a maioria das análises indica que a humanidade caminha para um aquecimento de 2,6 graus até 2100.

Isto é o que a maioria dos cientistas considera uma mudança climática perigosa ou catastrófica, e inclui a perda de arrecifes coralinos e outros importantes ecossistemas. Além disso, as latitudes do Norte se aquecerão muito mais do que a média mundial, talvez entre sete e 14 graus, nas regiões polares, o que quase seguramente garantirá a liberação de vastas quantidades de metano do permafrost (camada de gelo permanente) do Ártico.

Isto gera “grande preocupação”, disse na semana passada a Organização Meteorológica Mundial em um boletim. O metano é um gás-estufa com potencial 25 vezes maior de aquecimento do que o dióxido de carbono, e agora apresenta níveis atmosféricos 158% mais elevados do que na era pré-industrial.

O Acordo de Copenhague tem tantas lacunas que as nações podem argumentar que mantêm suas promessas ao mesmo tempo em que aumentam suas emissões, disse Sivan Kartha, cientista climático Instituto Ambiental de Estocolmo, um centro internacional independente. “Isto deveria ficar exposto pela vergonha que representa, para que desapareçam estas brechas e para que aumentem os compromissos nacionais de redução” de emissões contaminantes, disse Sivan à IPS/TerraViva.

Perdeu-se o forte senso de fim comum que reinou na Cúpula da Terra de 1992 para enfrentar os perigos da mudança climática, e as negociações se reduziram ao que parece ser apenas outra negociação comercial, afirmou o cientista. “Em Copenhague se desvaneceu o processo aberto, transparente e democrático que foi chave para as negociações prévias. Pode ocorrer o mesmo em Cancún, onde pequenos grupos de países forjam acordos a portas fechadas”, lamentou.

Esses tratos quase sempre inclinam as negociações para um único lado. O que funciona para a China e os Estados Unidos, por exemplo, pode ser muito ruim para os países que sofrem mais os impactos da mudança climática, explicou Sivan. “A urgência que enfrentamos não deveria justificar um mau acordo para alguns”, acrescentou.

A exclusão dos interesses dos países pequenos e das organizações não governamentais em Copenhague incentivou a sociedade civil a se reunir na Conferência Mundial dos Povos sobre a Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra, realizada em abril em Cochabamba, na Bolívia. Ali assinaram o Acordo dos Povos, no qual exigem o reconhecimento de uma Declaração Universal de Direitos da Mãe Terra e a criação de um Tribunal Internacional de Justiça Climática e Ambiental.

Entretanto, essas propostas foram excluídas das negociações formais em Cancún, segundo a Via Camponesa, movimento internacional com milhões de membros. “Nos últimos momentos do debate, as promessas do acordo assinado em Cochabamba foram deixadas de lado”, disse Alberto Gómez, da coordenação internacional dessa entidade. A organização mobiliza milhares de ativistas para que façam uma marcha em Cancun, a fim de pressionar os governos a adotarem as medidas estipuladas no Acordo de Cochabamba.

Uma manifestação maciça está marcada para 7 de dezembro neste balneário e em muitas cidades do mundo. Estima-se que já há seis mil militares e policiais mexicanos fortemente armados em estado de atenção devido à realização da COP 16. “Não concordamos com as falsas soluções como o mercado de carbono, porque, longe de reduzir os gases-estufa, cedo ou tarde criará um sistema especulativo que levará o mundo a outra crise financeira global”, disse Alberto em um comunicado. “A Via Camponesa se mobiliza para denunciar a irresponsabilidade da maioria dos governos que escolhem apoiar o capital em lugar dos interesses de suas nações e de toda a humanidade”, acrescentou.

(Por Stephen Leahy, IPS/Envolverde, 30/11/2010)


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