O governo deve encaminhar à Câmara, até o fim do ano, um projeto de lei para adequar a legislação brasileira aos resultados da 10ª Conferência das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, encerrada no fim de outubro, no Japão. A principal conquista do Protocolo de Nagoya, aprovado pelos 193 países participantes, é a criação de regras para a repartição dos lucros obtidos com produtos que utilizam biodiversidade de outros países.
O texto determina regras básicas para o acesso ao material genético. De acordo com o documento, o uso de substâncias ou genes de qualquer espécie nativa de determinado país (planta, animal ou micróbio, por exemplo) depende do consentimento do governo desse país, que deverá ser recompensado com lucros da venda do produto ou com benefícios não financeiros, como transferência de tecnologia.
Caso a substância - como o princípio ativo de um novo remédio - também seja utilizada tradicionalmente por uma comunidade ou povo indígena, esse grupo também terá de autorizar seu uso e receber as compensações.
O secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio Dias, afirma que a Casa Civil já possui uma minuta de projeto de lei sobre o assunto. Mas, com a aprovação do Protocolo de Nagoya, o texto passará por ajustes.
"O protocolo obriga todos os países a designar instituições nacionais que vão servir como checkpoints: pontos para conferir se o recurso genético recebido de outros países foi obtido legalmente, se existe um documento autorizando aquele acesso e se foi assinado um contrato de repartição de benefício. Isso não estava previsto na minuta de projeto de lei que a gente vem discutindo", explica Dias.
Propostas em tramitação
Quando chegar à Câmara, o projeto do governo deve se juntar a outras nove propostas. O projeto de lei mais antigo, apresentado no Senado em 1995, pela ex-senadora Marina Silva, chegou à Câmara em 1998. O texto, que prevê sanções penais para os crimes contra o patrimônio genético, tramita em conjunto com outras oito propostas. Todas aguardam a criação de uma comissão especial para analisar o tema.
Além de examinar os projetos de lei, o Congresso também terá que ratificar o Protocolo de Nagoya, quando o Brasil assinar o documento. O texto ficará disponível para assinatura dos países entre fevereiro de 2011 e fevereiro de 2012.
Para o deputado Antônio Carlos Mendes Thame (PSDB-SP), não deve haver problema para complementar a legislação brasileira e confirmar o protocolo. "Isso nos interessa, interessa ao País", afirma, sobre as compensações pelo uso de material genético.
Legislação atual
No Brasil, o acesso aos recursos da biodiversidade e a repartição dos benefícios advindos desse uso são regulados atualmente pela Medida Provisória 2.186, de 2001, até hoje não votada pelo Congresso.
"Vários países estabeleceram legislação nacional, como o Brasil. Mas a falta de um protocolo internacional, que definisse as regras para relação entre países, tem dificultado muito, afirma Bráulio Dias. Uma vez que esses recursos genéticos ou conhecimentos saem do País, a nossa legislação não alcança mais."
O acordo, alcançado no Protocolo de Nagoya, era negociado há quase 20 anos, desde a Eco-92, realizada no Rio de Janeiro.
(Por Ana Raquel Macedo, Rádio Câmara, 10/11/2010)