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terras indígenas aracruz/vcp/fibria demarcação de terras
2010-11-10 | Tatianaf

O decreto homologando as terras indígenas Tupinikim e de Comboios, em Aracruz, norte do Estado, totalizando pouco mais de 18.154 hectares, é um dos mais importantes do governo Lula. A afirmação é do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira. “Depois de Raposa Serra do Sol, é uma das maiores conquistas”, ressaltou. A medida encerra um ciclo liderado pelos índios capixabas, de retomada de grande parte do território que lhes pertence, explorados ilegalmente pela ex-Aracruz Celulose (Fibria). Segurança jurídica que permitirá aos índios desenvolver projetos de sustentabilidade nas aldeias e ainda o resgate de suas tradições.

A assinatura do decreto, na última sexta-feira (5), mas publicado no Diário Oficial da União dessa segunda-feira (8), é uma vitória dos Tupinikim e Guarani, que se organizaram durante décadas para recuperar as terras tradicionalmente indígenas demarcadas pela Funai. Durante este longo período, os índios conseguiram atrair para a luta os movimento sociais, consolidando importantes parcerias. Porém, sempre coube a eles traçar a direção do movimento, tanto durante a primeira retomada, como no processo iniciado em 2005, consolidado apenas dois anos depois, referente à área de 11.009 hectares.

A mesma adesão firmada com entidades não foi registrada entre a bancada capixaba no Congresso Nacional, nem na Assembleia Legislativa. Dos três senadores e dez deputados federais, apenas Iriny Lopes (PT) aderiu à luta dos índios por suas terras. Já na Assembleia, que tem 30 deputados estaduais, o apoio à causa se restringiu ao também petista Cláudio Vereza.

Mas foi a deputada federal a responsável por acompanhar o processo em Brasília, em especial após as portarias demarcatórias de 2007, quando os índios assinaram Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a ex-Aracruz. Isso porque os Tupinikim e Guarani passaram a ter dificuldade de receber a segunda parte da indenização, de R$ 1,8 milhão – do total de R$ 3 milhões -, por questões burocráticas. A principal delas a não homologação do território recuperado, agora oficializada.

Para Iriny Lopes, a assinatura do decreto permite que os índios finalmente consigam colocar em prática os projetos que têm debatido desde o TAC, mas, sobretudo, consolida o direito à terra. A deputada federal defende ainda parcerias paralelas, para desenvolvimento de projetos autossustentáveis na região. A exemplo das articulações que tem mediado com o Instituto Federal do Estado (Ifes), para a capacitação e fomento dos projetos de sustentabilidade, garantindo a autogestão das comunidades.

A homologação das terras indígenas pelo presidente Lula engloba os 7.067 hectares retomados pela primeira geração de caciques Tupikim e Guarani, e os 11.009 hectares, reconhecidos em portarias publicadas em 2007 pelo então ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos.

Segundo números da Funai, atualmente residem na Terra Indígena de Tupiniquim cerca de 2 mil indígenas, e na de Comboios 512. As famílias têm como uma das principais atividades econômicas e de subsistência o cultivo de alimentos. A degradação da terra e a poluição do rio dificultam a plantação e a pesca de peixes.

O órgão aponta que as primeiras notícias de ocupação dos povos Tupiniquim se confirmam por volta da década de 50. Neste momento, a Fundação Nacional do Índio constatou situação de desamparo que resultou em intensa violência e desrespeito aos povos indígenas. Em 1975, o processo com vistas à regularização das terras foi iniciado, tendo ocorrido a homologação em 1983. Já na Aldeia de Comboios o processo de regularização fundiária iniciou-se em 1975, com reconhecimento oficial em 1979.

Anos depois, em 1993, os Tupinikim e Guarani encaminharam à Funai reivindicação de revisão dos limites das terras. O pedido foi atendido em 1998, porém, foi instaurado Inquérito Civil Público, pelo Ministério Público de Espírito Santo, que culminou na realização de novos estudos. Em 2008, a Funai aprovou estudos de demarcação, encaminhando para o Ministério da Justiça, que no ano seguinte encaminha processo para homologação.

O decreto repara uma injustiça histórica, praticada pela manobra do então ministro Íris Rezende (PMDB-GO), no governo Fernando Henrique Cardoso. Íris Rezende cometeu crime, pois entregou o patrimônio indígena, que é da União, e portanto inalienável, à transnacional.

A Aracruz Celulose também tomou terras públicas ocupados por pequenos proprietários e dos quilombolas. Dos descendentes dos escravos ocupou grande parte do antigo território de Sapê do Norte, formado pelos municípios de Conceição da Barra e São Mateus. Os quilombolas estão em luta para recuperar suas terras.

Histórico de violência
A luta indígena, desde o seu início, enfrentou adversários poderosos. Embora tradicionalmente donos de um território de 40 mil hectares no norte do Estado, os Tupinikim e Guarani sofreram todo tipo de humilhação, agressões e injustiças, lideradas pela ex-Aracruz Celulose, com apoio do governo do Estado, do Poder Judiciário e da imprensa corporativa.

Um dos episódios mais emblemáticos foi a ação da Polícia Federal, em 2006, de “reintegração de posse” nas aldeias indígenas Olho D’ água e Córrego do Outro, que haviam sido reconstruídas pelos índios após a retomada do território de 11.009 hectares. Na ocasião, 120 policiais fortemente armados atacaram os Tupinikim e Guarani com balas de borracha e bombas de efeito moral. Um helicóptero foi usado para intimidar os índios, que, ajoelhados, pediam que não fossem machucados.

Para pegar os índios totalmente indefesos, os policiais mentiram, informando que se tratava de uma visita de apresentação de uma nova delegada. A operação durou mais de quatro horas e destruiu as aldeias e deixou 13 índios feridos, entre crianças e mulheres, algumas delas grávidas. Quatro famílias foram expulsas de suas casas e praticamente obrigadas a assistir à destruição. Um opu, considerado pelos índios um espaço sagrado de orações, também foi destruído e queimado pela PF, com o auxílio dos tratores da Aracruz Celulose. Lideranças indígenas foram mantidas presas. A base da operação da PF foi a própria Casa de Hóspedes da transnacional.

O massacre, autorizado pelo juiz federal Rogério Moreira Alves, da Vara de Linhares, foi divulgado em todo o mundo. A forte repercussão internacional, inclusive com inúmeros protestos, fez com que o governo sueco se desfizesse das ações na empresa. Considerou, para isso, as acusações contra a ex-Aracruz de destruir a floresta nativa e ignorar direitos humanos no Brasil.

(Por Manaira Medeiros, Século Diário, 09/11/2010)


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