Depois de décadas lutando para recuperar o território ocupado ilegalmente pela ex-Aracruz Celulose (Fibria), os índios Tupinkim e Guarani podem, enfim, comemorar. O decreto de homologação de parte das terras que lhes pertencem no município de Aracruz, norte do Estado, foi assinado pelo presidente Lula e publicado no Diário da União desta segunda-feira (8). Ao todo, são mais de 18.154 hectares, referentes a dois momentos de retomada de terras. Um, há 30 anos, e outro em 2005, quando começou o processo de recuperação dos 11.009 hectares.
Já era expectativa entre os índios a homologação das terras, para meados deste mês, após aceno positivo do Gabinete da Casa Civil, transmitido aos caciques pela deputada federal reeleita Iriny Lopes (PT). Com a assinatura do decreto, as comunidades Tupinikim e Guarani poderão finalmente desenvolver os projetos de sustentabilidade na área. Desde a última retomada, consolidada em 2007, problemas burocráticos impedem os índios de voltarem a produzir em suas terras.
Na ocasião, foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), determinando obrigações em relação à retomada do território de 11.009 hectares. Entre elas, a realização de estudos etnoambientais, realizados pela Associação Nacional de Ação Indigenista (Anaí), com o objetivo de quantificar os impactos ambientais gerados pela monocultura nas terras indígenas, assim como as alternativas para recuperação da área e atividades de sustentabilidade das famílias indígenas. Este estudo considerou não só o segundo momento de retomada das terras, mas também o mais antigo, que ainda aguardava a devida homologação. O que explica a inclusão de todo o território no decreto do presidente Lula.
O TAC também obrigou a transnacional a indenizar os índios em R$ 3 milhões. Porém, o primeiro repasse, de R$ 1,2 milhão, só ocorreu em 2008 e, mesmo assim, sob protesto da comunidade. O restante será pago após a conclusão dos estudos etnoambientais, que não só atrasaram como ainda precisam ser apresentados em nova audiência pública. Além disso, determina o documento que os estudos precisavam ser validados pela 6ª Câmara do Ministério Público Federal (MPF), em Brasília, mas ficou parado. A previsão é que o assunto seja pauta de reunião nesta terça-feira (9). As informações são de que já o parecer que será colocado em votação é favorável aos índios capixabas.
Outro ponto que tem impedido as famílias indígenas de desenvolverem projetos na área é o processo de criação de um conselho gestor, que está até hoje na Fundação Nacional do Índio (Funai), sem providências. Para viabilizar o repasse de recursos, o TAC determinou que os índios elegessem um conselho e enviassem o processo ao órgão em Brasília, para assinatura, o que também não aconteceu.
Os 40 mil hectares de terras indígenas no norte do Estado foram ocupados pela ex-Aracruz Celulose (Fibria) com a ajuda do major PM Orlando Cavalcante (membro do extinto “sindicato do crime”). Durante as décadas de exploração, além de destruir a mata atlântica, exaurir a terra e contaminar os mananciais da região, a transnacional deixou os indígenas sem meios de subsistência, ilhados entre eucaliptais. Para os índios, a recuperação dos atuais 11.009 hectares, somados aos pouco mais de 7 mil, apesar de não atingir toda a área que lhes pertencia, basta, no momento, para que possam reviver no território a vida nas aldeias.
(Por Manaira Medeiros, Século Diário, 08/11/2010)