Uma investigação trouxe à tona uma rede bilionária de comércio ilegal de atum que viola as cotas estabelecidas para o crescente mercado mundial de sushi.
O ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, na sigla em inglês) encontrou irregularidades cometidas por pescadores e comerciantes em dez países, incluindo França --onde seis pessoas estão sendo investigadas--, Espanha e Itália.
Reguladores do setor farão no próximo dia 17 um encontro em Paris para discutir medidas para proteger o atum de barbatana azul.
Essa espécie de atum é a mais cara de todas --um peixe grande pode ser vendido por mais de US$ 100 mil no Japão.
Com a popularização da culinária japonesa pelo mundo e o aumento da pesca, especialistas estimam que os cardumes do atum de barbatana azul tenham sofrido uma redução de 75% nas últimas décadas e podem estar se aproximando da extinção.
PESCA IRREGULAR
Segundo as investigações, a maioria das irregularidades ocorreu entre 1998 e 2007, quando mais de um terço do atum de barbatana azul pescado no Mediterrâneo e no leste do Atlântico foi capturado de forma ilegal.
A pesca ilegal derivou no comércio irregular desses peixes num valor estimado em ao menos US$ 4 bilhões pelo ICIJ.
No Japão, que consome 80% do atum azul pescado no mundo, autoridades vêm pedindo aos restaurantes que controlem suas vendas de atum até que os pescadores mediterrâneos provem que sua pesca está em níveis legais e sustentáveis.
Masanori Miyahara, da agência japonesa de pesca, afirma que os consumidores "talvez tenham que esquecer [de comer] atum por um tempo".
Miyahara teme que muitos dos fornecedores mediterrâneos do peixe não estejam cumprindo as regras internacionais de pesca.
FISCALIZAÇÃO FALHA
Um sistema de fiscalização do atum de barbatana azul foi estabelecido em 2008 pela ICCAT (Comissão Internacional de Conservação do Atum do Atlântico, baseado em Madri).
O documento fiscalizatório era para ser uma arma vital na preservação de cardumes, ao numerar cada carregamento pescado e acompanhá-lo até sua comercialização. Em teoria, esse documento permite que os países comprovem que sua pesca é legalizada e que cumpre a cota máxima.
Mas Miyahara disse que parte da documentação que ele viu estava "estranha", e o Japão recusou recentemente milhares de toneladas de atum do Atlântico, suspeitando que a carga tenha sido pescada ilegalmente.
O ICIJ conseguiu acesso aos dados da ICCAT e encontrou falhas na documentação. A entidade respondeu as acusações alegando que o sistema ainda precisa ser aperfeiçoado.
As principais nações pesqueiras da Europa --França, Itália e Espanha-- dizem que estão tentando se regularizar, após anos de relatos de pesca ilegal.
"Não havia vontade política de cumprir as cotas [de pesca]", diz Jean-Marc Fromentin, do comitê científico do ICCAT.
Driss Meski, secretário-executivo do ICCAT, disse que há motivos para ser otimista. Na reunião do dia 17 em Paris ele dirá que há 60% de chances de que os cardumes de atum de barbatana azul se mantenham em nível estável mesmo com a continuidade da pesca.
Mas a preocupação vai além dos países europeus: acredita-se que a fiscalização da pesca de atuns seja falha também em outras nações mediterrâneas, como Turquia e Líbia.
Para a comissária europeia de pesca, Maria Damanaki, "temos problemas com os nossos Estados-membros e também com os nossos vizinhos".
(Folha.com, 08/11/2010)