Nós, comunidades quilombolas e entidades presentes à Mesa de Diálogo dos Direitos dos Territórios Quilombolas do Maranhão, reunidos em São Luis nos dias 23 e 24 de setembro do corrente ano, vimos por meio deste contestar e denunciar o processo de levantamentos e estudos sócio-ambientais realizados no EIA/RIMA dos aproveitamentos hidroelétricos da Bacia do Parnaíba, que compreende municípios dos Estados do Maranhão e do Piauí.
Ressaltamos que, em nenhum momento da elaboração desses estudos, as dezenas de comunidades remanescentes de quilombo, impactadas direta e indiretamente, existentes na área de influência do empreendimento foram consultadas, e nem sequer citadas nos presentes estudos.
Salientamos que a omissão das informações e a negação de manifestação das comunidades remanescentes de quilombos fere gravemente a Constituição Federal de 1988 e a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho, que garante no artigo 6º:
“Ao aplicar as disposições da presente Convenção, os governos deverão:
a) consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente;
b) estabelecer os meios através dos quais os povos interessados possam participar livremente, pelo menos na mesma medida que outros setores da população e em todos os níveis, na adoção de decisões em instituições efetivas ou organismos administrativos e de outra natureza responsáveis pelas políticas e programas que lhes sejam concernentes;”
A presente Convenção estabelece que as comunidades impactadas por projetos elaborados pelos governos deverão ser ouvidas, e se manifestarem livremente sobre tais projetos. As comunidades quilombolas existentes na área de influência do empreendimento NÃO FORAM, EM NENHUM MOMENTO, RELACIONADAS E/OU CONSULTADAS DURANTE A ELABORAÇÃO DO EIA/RIMA.
Portanto, denunciamos o modo como o Estado Brasileiro, através da CHESF, e a empresa responsável pela elaboração do EIA/RIMA, conduziram o processo de estudo, tornando invisíveis as dezenas de comunidades quilombolas existentes na área de influência dos projetos.
Requeremos que seja refeito o EIA/RIMA, incluindo as comunidades tradicionais e comunidades quilombolas afetadas, e que seja compreendido no Estudo de Impacto Ambiental, o inventário histórico e dos bens imateriais, além de elaborar os Laudos Antropológicos de todas as comunidades ali existentes. Em virtude desses fatos, requeremos também que seja suspenso todo o processo de licenciamento e leilões dos aproveitamentos hidroelétricos.
Assinam esta Carta as comunidades quilombolas dos municípios de Bequimão, Brejo, Cajapió, Cândido Mendes, Chapadinha, Guimarães, Itapecuru-Mirim, Lima Campos, Magalhães de Almeida, Mata Roma, Matões, Mirinzal, Olinda Nova, Santa Quitéria, São Benedito do Rio Preto, São José de Ribamar, São Luis, São Luis Gonzaga, São Vicente de Ferrer, Serrano do Maranhão e Turiaçú (Maranhão) e São João do Piauí (Piauí). E as seguintes organizações presentes: CCN/MA, SMDH, ACONERUQ/MA, CONAQ, Fórum Carajás, MST/MA, da moradia, Terra de Preto, Conlutas, CECOQ/PI, Assembléia Nacional dos Estudantes Livres-ANEL e Quilombo Urbano
São Luís (MA), 24 de setembro de 2010.
[*] Documento elaborado na Mesa de Diálogo dos Direitos dos Territórios Quilombolas do Maranhão, realizado nos dias 23 e 24 de setembro de 2010, na Sede do CCN, em São Luís-MA.
(Por Rogério Almeida, EcoDebate, 30/09/2010)