Um desempenho bem-sucedido do Brasil na questão ambiental será decisivo para o papel geopolítico do país no cenário internacional, apontaram especialistas no debate “O Brasil no mundo – política externa e a defesa meio ambiente”.
José Eli da Veiga, professor da Faculdade de Economia da USP, opina que o “Brasil tem todas as condições para ser a principal potência ambiental” do planeta.
Mas isso depende, em sua opinião, de o país investir em um sistema de inovação tecnológica que permita a transição para uma economia menos dependente de combustíveis fósseis. “É preciso dar importância para o ensino científico.”
Sérgio Besserman, professor de economia da PUC-RJ, concordou com Veiga quanto ao potencial brasileiro e agregou que a liderança na questão ambiental credenciaria o Brasil, inclusive, para a cobiçada vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU.
“Nesta transição econômica, que é o grande tema geopolítico global, temos vantagens comparativas. É nessa discussão (a ambiental) que poderíamos desempenhar um papel essencial. Esse é o protagonismo central”, opinou Besserman. “Se o Brasil seguir nesse caminho, vai ter a vaga no Conselho de Segurança. Não precisará mexer uma palha. Porque esse será um tema do Conselho de Segurança.”
Para o ex-chanceler Luiz Felipe Lampreia, “o Brasil tem longa tradição positiva nesse campo e conseguiu algo significativo: sair da posição defensiva no momento em que os maiores poluidores globais não tomaram medidas sérias (na questão)”.
Na opinião de Lampreia, é crescente o impasse global em torno de quanto cada país deve fazer para combater as mudanças climáticas. Isso, acredita ele, ficou evidente na conferência climática de Copenhague, em dezembro passado, e deve se repetir em evento semelhante a ser realizado em Cancún (México), no fim deste ano.
“Recentes cifras apontam para a redução no desmatamento da Amazônia. Se essa tendência se perpetuar, o Brasil terá reforçada suas credenciais diplomáticas para atuar no campo (ambiental) e para quebrar esse impasse. É uma área-chave de atuação no campo internacional.”
Responsabilidade moral
Ricardo Seitenfus, representante da OEA (Organização dos Estados Americanos) no Haiti e professor de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (RS), considera um erro que, “do ponto de vista moral e ético, nós, que estamos em vias de nos desenvolvermos, sejamos reféns de uma situação criada essencialmente pelo desenvolvimento dos países industrializados”.
A afirmação foi rebatida por Eli da Veiga, que pede corresponsabilidade no combate às mudanças climáticas: “Não é verdade que o mundo ainda seja dividido em países desenvolvidos e não desenvolvidos. Estamos acelerando a extinção da nossa espécie, é uma situação que envolve a todos”.
Segundo ele, a noção de aquecimento global é muito recente para que países ricos sejam inteiramente responsabilizados por um modelo de desenvolvimento iniciado muitas décadas atrás.
Para Besserman, o mais importante é ver a questão sob o ponto de vista dos mais pobres, “contados às centenas de milhões”, que, afirma, são mais vulneráveis às mudanças climáticas.
Ele criticou o modelo de ocupação da Amazônia baseado no desmatamento e, segundo ele, defendido por alguns ruralistas como sendo a única opção econômica para a população local.
“O pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do Brasil é o da terra do meio (das regiões desmatadas). É um modelo de desenvolvimento social perverso, injusto, hipócrita. O povo da Amazônia merece um desenvolvimento baseado em conhecimento”, disse.
O debate desta segunda-feira, que também abordou os limites e as metas da diplomacia brasileira, fez parte do ciclo de encontros "O Futuro do Brasil". Os debates anteriores abordaram a economia e a educação no Brasil.
(BBC, 28/09/2010)