Começou na manhã desta terça-feira (14) o Seminário Nacional contra o uso dos Agrotóxicos na Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF). A atividade, que vai até quinta-feira (16), é realizada pela Via Campesina no Brasil, cuja principal organização é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Os convidados da primeira mesa foram o Frei Sérgio, do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e o engenheiro agrônomo e professor universitário Horácio Martins, para debater os modelos de agricultura em disputa no Brasil e a economia política dos agrotóxicos, com foco ao papel das transnacionais. A principal novidade do debate foi a informação de que os transgênicos, ao invés de diminuir como se pensa, na verdade aumentam a utilização de agrotóxicos na agricultura.
Frei Sérgio falou primeiro, e, chamando os agrotóxicos de "agroveneno", concentrou-se em esclarecer então o modelo de agricultura no Brasil implantado como uma "revolução verde ", que passou a se caracterizar por intensa mecanização do processo produtivo, pela monocultura e pelo controle da genética.
O representante do MPA ressaltou que este modelo traz também a concentração do mercado de insumos, citando que apenas 4 empresas controlam a venda de fertilizantes e apenas 3 empresas ditam o comércio de sementes, por exemplo. Sementes essas selecionadas para garantir o auto-rendimento, mas também para dar resposta aos insumos químicos, que passam a ser elemento essencial na produção agrícola, à medida que o desequilíbrio ambiental gerado pelo próprio modelo de produção acarreta extinção de algumas espécies, superpopulação de outras e até mudança de hábitos alimentares de animais.
Durante o debate, foi levantado que as propagandas de agrotóxicos deveriam vir acompanhadas de anúncios sobre os prejuízos à saúde, assim como é feito com cigarros e outros produtos.
Agrotóxico personalizado
Por fim, Frei Sérgio explicou que as culturas transgênicas vêm com determinadas fragilidades a determinados tipos de agressores e resistência a determinados produtos químicos, tendo, portanto, agrotóxicos específicos para cada semente. As sementes transgênicas, portanto, já são vendidas com o seu próprio agrotóxico. Por fim, alertou para o crescente aparecimento de câncer em regiões rurais, como conseqüência da utilização de "agrovenenos", como ele classifica.
Reforçando esta tese, o professor Horácio sustentou que o uso de transgênicos, ao contrário do que se pensa, não diminui a utilização dos agrotóxicos, aumenta. Com exposição voltada a ajudar a "conhecer o inimigo", o engenheiro agrônomo falou sobre transgênicos, patentes, oligopólios, transnacionais, princípios ativos dos agrotóxicos e outros temas relacionados ao agrobussiness global. Outra novidade trazida pela sua explanação é a de que plantas transgênicas vêm sendo criadas com o objetivo de produzir princípios ativos para novos agrotóxicos, são os bioagrotóxicos.
Bioagrotóxicos, a novidade dos transgênicos
Esta informação proporciona uma nova dimensão ao debate sobre os transgênicos – que já trazem em si a polêmica ética de permitir o patenteamento de um ser vivo (a planta). Plantas passam a ser produzidas não apenas para o consumo, mas para a produção de novos agrotóxicos, mais eficazes, que concentrem o efeito de vários deles em um único produto. As possíveis consequências maléficas dos transgênicos à saúde ainda não são conhecidas, mas o grande número de casos de câncer causados pelos agrotóxicos não chega a ser uma novidade.
Considerando que a principal propaganda pró-transgênicos, de que eles reduziriam a quantidade de agrotóxicos, é furada, não resta defesa racional desta categoria de alimentos, ao menos do ponto de vista da saúde pública. Horácio explica que os transgênicos aumentam a quantidade de agrotóxicos utilizados no plantio, visto que as plantas em geral são mais suscetíveis ao ataque de fungos, por exemplo. A destruição de outros tipos de vegetação em torno da monocultura levam, ainda, as plantas a serem mais atacadas por variados tipos de pragas, o que aumenta a necessidade de uso dos venenos.
Nova cultura
Como já é tradição nas atividades do MST, o seminário é envolto por uma série de místicas e dinâmicas que dão o tom da formação de uma nova cultura entre os que participam da atividade. O ambiente da ENFF não deixa dúvidas: trata-se de uma atividade de formação política, com debatedores de universidades, de comunidades religiosas, de setores do governo e participantes do movimento de luta pela terra, do movimento estudantil, do movimento de saúde, sindical e de mulheres. A imprensa presente também se integra de forma harmônica ao ambiente: Diplô (o Le Monde Diplomatique no Brasil), revista Caros Amigos, blog O Escrivinhador, Rádio Agência NP, jornal Hora do Povo, portal da CUT, além do próprio Vermelho.
No período da tarde, a diretora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Letícia Silva, falará sobre a situação e perspectivas do uso dos agrotóxicos no Brasil.
(Por Luana Bonone, Vermelho.org, 14/09/2010)