Um estudo realizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), na qual essa unidade do Ministério de Minas e Energia projeta o consumo futuro de energia elétrica no Brasil, prevê que em 2017 o país terá uma população de 204,5 milhões de habitantes e um consumo médio de 604,2 milhões de megawatts/hora de energia elétrica. Esse volume, estimado com base num crescimento da economia à base de 5,5% ao ano, é mais de 52% superior ao de 2008, que foi de 396,5 MWh.
É nesse cenário que o governo federal se empenha em criar condições para a construção de hidrelétricas na Amazônia, única região onde permanece praticamente inexplorado o potencial de geração hídrica do país. Só o Estado do Pará tem potencial pouco menor que a capacidade total hoje instalada no Brasil, da ordem de 95 mil MW. Se fossem levados em conta os primeiros estudos de engenharia, é possível que esses números estivessem hoje em pé de igualdade.
Desde o início da década de 1990, porém, o Ministério de Minas e Energia vem refazendo os seus projetos no setor elétrico. Limitações contidas em dispositivos da Constituição Federal de 1988, as amarras impostas pela legislação ambiental brasileira, considerada uma das mais avançadas do mundo, e as pressões de organizações ambientalistas, do Brasil e do exterior, resultaram em mudanças no planejamento energético nacional.
Dessas mudanças temos dois bons exemplos aqui mesmo no Pará. O complexo hidrelétrico do rio Xingu, projetado pela Eletronorte no final da década de 1970, previa a construção de duas gigantescas usinas – Kararaô e Babaquara – que deveriam gerar perto de 14 mil MW, formando dois lagos gigantescos que totalizariam cerca de 7.700 quilômetros quadrados. Em sua concepção atual, com usina a fio d’água, o projeto prevê um reservatório com área de apenas 516 quilômetros quadrados. Este é o tamanho da área que anualmente fica coberta pelas águas do rio durante o período das cheias A capacidade instalada também será significativamente menor, da ordem de 11.233 Km de potência.
Outro exemplo ilustrativo é o aproveitamento do potencial de geração do Tapajós. Há duas décadas, o Ministério de Minas e Energia trabalhava com a perspectiva de construir, um pouco acima de Itaituba, onde ficam os travessões encachoeirados de São Luís, um megaempreendimento com potência superior a 17 mil MW. Hoje, os planos da Eletrobrás para o Tapajós são bem mais modestos. Com o objetivo de reduzir a um nível mínimo os impactos sociais e ambientais na região, a Eletronorte trabalha com um novo conceito – a usina-plataforma – e reduziu para algo em torno de 10 mil MW a projeção da capacidade instalada.
O aproveitamento energético do Tapajós, porém, ficará para uma segunda etapa, da mesma forma como já foram retardados também os projetos das usinas de Santa Izabel, no rio Araguaia, e de Marabá, no rio Tocantins. O plano imediato do governo é viabilizar a construção de Belo Monte, obra considerada vital para atender o crescimento da demanda brasileira, garantindo a oferta nos próximos anos e afastando o risco de racionamento.
CONCLUSÃO
O presidente do consórcio responsável pelo projeto, o Norte Energia, José Ailton de Lima disse, em teleconferência realizada em São Paulo, no dia 16 de agosto, que a usina começará a operar provavelmente em outubro de 2015, como previsto no edital do projeto. O presidente da Eletrobrás, José Antônio Muniz Lopes, confirmou esta semana a decisão do governo em manter o cronograma e até acenou com a possibilidade de sua antecipação. “O problema é o tempo de fabricação das máquinas. Praticamente em todas as usinas está havendo antecipação”, afirmou. Muniz Lopes disse que o valor total do empreendimento poderá ser superado, desde que a rentabilidade seja assegurada. O projeto atualmente está programado para receber investimentos de R$ 20 bilhões.
O projeto do complexo de Belo Monte prevê a abertura de canais de derivação, construídos para formar o reservatório que levará a água até a casa de força principal. A cota de operação do reservatório será de 97 metros acima do nível do mar. De acordo com a Eletrobrás, a usina será conectada ao sistema interligado nacional e vai gerar energia em volume equivalente a cerca de 6% do consumo total de eletricidade do Brasil, atendendo a aproximadamente 18 milhões de domicílios do país. No pico das obras, é prevista a geração de 18.600 empregos diretos.
A revisão dos estudos de inventário do rio Xingu foi entregue na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em outubro de 2007 e aprovada em julho de 2008. O inventário avaliou a melhor utilização do potencial hidrelétrico da bacia, identificando a usina de Belo Monte como a única opção viável, com capacidade para gerar energia sem inundar terras indígenas e unidades de conservação existentes na região e com menor comprometimento do meio ambiente.
Projeto ainda desperta questionamentos
A construção da hidrelétrica de Belo Monte vai alterar radicalmente a realidade social e econômica de dois municípios diretamente ligados ao projeto: Altamira e Vitória do Xingu. Apesar da discussão promovida pela Eletronorte, junto às comunidades locais, inclusive em audiências públicas que reuniram milhares de pessoas, até hoje persistem, nas duas cidades, muitas dúvidas a respeito do projeto e questionamentos sobre a conveniência de sua execução.
Há, em toda a região, dezenas de organizações não governamentais (ONGs) em febril atividade, na tentativa de mobilizar grupos organizados da população para resistir ao empreendimento. Um dos setores mais influentes na luta contra a construção de Belo Monte é exatamente a Igreja Católica, conduzida pelo bispo Dom Erwin Krautler, da Prelazia do Xingu.
Na cidade, a comunidade católica mais sensível à influência da Prelazia vê com pouco entusiasmo ou mesmo com hostilidade a implantação do empreendimento.
No meio rural, a resistência é maior por parte dos pequenos agricultores e ribeirinhos, igualmente influenciados pelos agentes da Igreja e por militantes ambientalistas que atuam na região. A fonte maior de preocupação para o governo, porém, tem sido a presença de grupos indígenas em protestos e manifestações públicas contra o empreendimento.
(Diário do Pará, 05/09/2010)