O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, na sigla em inglês) precisa passar por mudanças na sua gestão e na maneira como coleta informações se quiser se manter como a principal referência a respeito do aquecimento global.
Essa é a conclusão de um grupo independente de cientistas, que avaliou a atuação do painel a pedido da ONU, à qual o IPCC está ligado. O documento com o veredicto do grupo foi divulgado nesta segunda-feira (30).
"O problema é que o IPCC cresceu muito. Hoje são quase 2.000 cientistas envolvidos como autores e outros 2.000 revisores. É preciso criar um mecanismo de gestão da produção do relatório", diz Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp e membro da Academia Brasileira de Ciências.
Ele é o único brasileiro entre os 12 cientistas escolhidos pelo IAC (InterAcademy Council), órgão que reúne academias de ciência mundo afora, para avaliar o IPCC.
NOVOS ARES
Uma das sugestões do documento é a criação de um comitê executivo que inclua membros de fora da comunidade do clima.
A definição de tempo de mandato no IPCC também é mencionada.
O atual presidente, Rajendra Pachauri, está no cargo desde 2002. "É bom ter circulação de pessoas para ter novos pontos de vista", afirma Brito Cruz.
Do ponto de vista técnico, o relatório traz recomendações para o sistema de revisão das informações e no tratamento das incertezas das previsões climáticas.
"A revisão por pares é o mecanismo da comunidade científica para expor o trabalho à crítica. Num trabalho como o do IPCC, isso precisa ser feito com organização, senão críticas cruciais podem se perder", diz Brito Cruz.
Um exemplo mencionado pelo cientista, presente no relatório, é o caso das geleiras do Himalaia. O IPCC afirmou que tais geleiras desapareceriam em 2035, muito antes do que outras fontes sugerem.
As informações foram questionadas no processo de revisão por pares, mas a crítica foi ignorada.
"Esses erros sem dúvida fizeram com que o IPCC perdesse credibilidade", disse o coordenador do relatório, Harold Shapiro, no lançamento do documento.
NAS MARGENS
O relatório também ressalta a necessidade de utilização, pelo IPCC, da ciência publicada em revistas científicas que não estejam em língua inglesa, como as da China e da América Latina.
A "literatura cinza" --que não está publicada em revistas científicas (como teses ou material de ONGs)-- também é abordada. "Deve haver normas para usar esse material", destaca Brito Cruz.
"Podemos mudar o IPCC para melhor, e vamos fazer isso", disse Rajendra Pachauri. Ele afirmou que não pretende renunciar ao cargo.
(Folha.com, 31/08/2010)