Do início do ano até sexta-feira (27), o total de queimadas no Brasil atingiu 41.636 focos, um aumento de 134% em relação ao mesmo período do ano passado, quando houve 17.788 incêndios. Os dados são do satélite de referência do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).
Segundo especialistas, o salto pode ser atribuído a ações criminosas e especulativas, clima seco prolongado e avanço da fronteira agrícola.
"É uma confluência de fatores. O tempo está mais seco que em outros anos e a gente não tem no Brasil um sistema nacional de prevenção e combate a incêndio", disse o consultor de florestas e clima Tasso Rezende de Azevedo.
Foi a primeira vez que o índice registrou crescimento desde 2007, quando as queimadas atingiram o pico de 59.915 focos no período.
Os Estados mais afetados estão em área de cerrado, como Mato Grosso, Tocantins, sul do Pará, Rondônia, Piauí, Goiás e Minas Gerais, enquanto Acre, Rio Grande do Sul e Amazonas figuram entre os que mais diminuíram seus focos.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, disse que 7.000 bombeiros trabalham no combate às queimadas, além de homens do Exército e brigadistas.
Para ela, "o fogo se deve a práticas ilegais costumeiras no cerrado", que abrange 12 Estados brasileiros. A chefe da pasta solicitou perícias para apurar causas e aplicar punições. Segundo o ministério, R$ 90 milhões estão destinados às operações de combate ao fogo.
O Ibama já aplicou mais de R$ 14 milhões em multas nesta semana por queimadas ilegais. Em Rondônia, uma pessoa foi presa em flagrante ao colocar fogo numa pastagem. No Pará, o órgão multou sete proprietários rurais.
CLIMA
O consultor Azevedo alertou para o agravamento das mudanças climáticas no país. "Os cenários previstos apontam que esses períodos secos mais prolongados e mais intensos vão se agravar", afirmou.
Segundo o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), a umidade relativa do ar está abaixo dos 20% em grande parte de Mato Grosso, Tocantins, interior do Nordeste, Minas Gerais, Rio de Janeiro, interior de São Paulo e norte de Mato Grosso do Sul.
Na capital paulista, a umidade atingiu 12% na tarde de ontem, mínima recorde para o ano e dentro da faixa registrada no deserto do Saara --de 10 a 15%. Desde 1961, quando começou a medição, o menor número foi atingido em 14 de agosto de 2009, com 10%.
"A baixa umidade está associada ao período longo sem chuva: é a seca prolongada", disse o meteorologista do Inmet, Luiz Cavalcanti. Não há chuvas significativas em São Paulo há 41 dias, segundo o CGE (Centro de Gerenciamento de Emergências). O meteorologista afirma que, sem chuva, a vegetação seca e fica suscetível às queimadas.
A situação piora quando as queimadas atingem as regiões que já estão com baixos índices de umidade. Com o aumento das temperaturas pelo fogo, diz Cavalcanti, "a pouca quantidade de vapor que tem naquela parcela da atmosfera vai se expandir mais ainda".
O diretor de políticas públicas da organização SOS Mata Atlântica, Mário Mantovani, foi mais a fundo. Ele acredita que o aumento das queimadas pode estar ligado à especulação em razão do novo Código Florestal, aprovado em julho pela Comissão Especial na Câmara dos Deputados.
Entre as mudanças mais polêmicas do projeto está a proibição de abertura de novas áreas para a agropecuária por cinco anos.
"Essa especulação que está havendo no Brasil é responsável, num ano de evento climático, por uma degradação que a gente nunca viu, promovida pelo pior tipo de forma de manejar área, que é o fogo", disse Mantovani. "O que está acontecendo é um crime contra a sociedade", afirmou.
(Folha Online, 28/08/2010)