“As condições de voo são precárias. A visibilidade está muito reduzida e é difícil controlar o avião”, avisava o piloto pelo rádio, na última quinta-feira. Sobrevoando a Floresta Nacional do Jamanxim, área protegida por lei no Pará, uma equipe do Greenpeace constatou o que os satélites já diziam: o local era pura fumaça. Há pelo menos um mês entre as dez unidades de conservação que mais queimam, a Flona do Jamanxim é uma faísca do que está acontecendo pela Amazônia nessa época.
Não é novidade. Quando os meses de junho e julho batem à porta, a chuva dá uma trégua e a temporada da seca chega à floresta tropical brasileira. É quando os produtores rurais aproveitam para “limpar” seus terrenos e renovar o cultivo, seja de agricultura ou pasto para a pecuária. Jeito antigo e barato de fazer o trabalho, o fogo ainda permanece como prática extremamente comum na região. Daí para as chamas avançarem sobre as cercas das fazendas e adentrarem a floresta é um pulo.
Foi justamente isso que o Greenpeace documentou. Em quatro dias de sobrevoos, a equipe cruzou o Pará de cima a baixo e foi do Norte a Oeste de Mato Grosso. Passando por muitas áreas embaçadas pela fumaça, foi difícil registrar as queimadas. Mas foi fácil perceber a associação entre fogo e áreas de expansão da agropecuária. Cruzando dados do Prodes (Pograma de Cálculo do Deflorestamento da Amazônia) com os locais dos focos, é fácil perceber que, geralmente, o fogo começa na fronteira entre floresta e campo.
“Encontramos grandes focos. Na região da BR-163, o fogo começou no pasto e já atingiu a floresta. E a mesma coisa acontece no Norte de Mato Grosso”, conta Paulo Adario, diretor da Campanha da Amazônia do Greenpeace. “Isso é trágico , porque além de afetar a saúde da população, as queimadas são, junto com o desmatamento, a principal contribuição que o Brasil dá para as mudanças climáticas. É preciso parar isso”.
Vem mais pela frente
Em tempos de mudanças no clima e acordos internacionais, a necessidade de frear as queimadas é latente: somadas às derrubadas, elas jogam na atmosfera 75% das emissões de gases estufa que o Brasil produz. Mas a tendência é que a curva de focos de calor só faça aumentar nos próximos meses. Além de ser um ano eleitoral, quando historicamente as autoridades fazem vista grossa para o problema, dessa vez, a seca está castigando.
A umidade relativa do ar este ano está baixíssima em algumas regiões da Amazônia. A taxa, que normalmente bate os 80%, já está em 15% no Sul do Amazonas e no Norte do Mato Grosso, por exemplo. O número está abaixo do que se encontra hoje São Paulo e Minas Gerais, ambos em torno dos 25%.
Esse cenário é propício para que o fogo se alastre. E as conseqüências já estão aí. As principais cidades amazônicas, como Manaus, Cuiabá e Porto Velho, têm passado os dias sob uma densa nuvem de fumaça. Os aeroportos abrem e fecham, a economia é afetada e a população bota fuligem para dentro dos pulmões. “Tudo isso que está acontecendo não ajuda os fazendeiros, não ajuda os nossos pulmões”, afirma Paulo Adario. “E, seguramente, não ajuda o clima do planeta”.
(Greenpeace Brasil, 23/08/2010)