A grande maioria (90 por cento) dos derrames de petróleo no Delta do rio Níger, Sul da Nigéria, deve-se às pilhagens de gangs locais que tentam roubar o combustível dos oleodutos e dez por cento à negligência da petrolífera Shell, revela uma investigação de três anos às causas de uma poluição que já dura há 40 anos.
O relatório elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Ambiente (Pnua) e financiado pela própria Shell concluiu que 90 por cento dos 300 derrames conhecidos na região de Ogoniland tem sido causado pela sabotagem dos oleodutos por gangs locais; dez por cento deve-se a falhas nos equipamentos e a negligência da companhia petrolífera, revela, noticiou ontem o “The Guardian”.
Depois da apresentação do relatório - na semana passada em Genebra, ainda que a versão final só seja publicada em Dezembro - levantam-se as vozes que duvidam da sua credibilidade, nomeadamente as comunidades locais que há muito pedem indemnizações e a limpeza da região. A verdade é que a vida não tem sido fácil para as povoações na zona de trabalhos da Shell. Metade das populações não tem acesso a água potável e a esperança média de vida caiu, nas últimas duas gerações, para pouco mais de 40 anos.
Apesar de tudo, estas comunidades reconhecem que a sabotagem se tornou habitual em algumas regiões mas garantem que este é um fenómeno recente; historicamente, a Shell é a responsável, acusam.
“Ninguém aqui em Ogoniland se surpreendeu”, disse Ben Ikari, activista em Ogoni.
“É inacreditável que a ONU diga que 90 por cento [da poluição] seja causada pelas comunidades. A avaliação do Pnua está a ser paga pela Shell. As suas conclusões podem ser fabricadas para satisfazer o seu cliente. Monitorizamos os derrames regularmente e a nossa observação é exactamente o oposto ao que o Pnua se prepara para reportar”, comentou ontem Nnimmo Bassey, director da Environmental Rights Action, a maior organização ambiental da Nigéria e membro dos Amigos da Terra Internacional.
O Delta do Níger, com os seus 606 campos de exploração petrolífera, abastece 40 por cento do crude importado pelos Estados Unidos. No ano passado, a organização Amnistia Internacional estimou que pelo menos nove milhões de barris de petróleo foram derramados no Delta do Níger nos últimos 50 anos.
Mike Cowing, coordenador da equipa de cem pessoas que estudou o ambiente na região, defendeu-se das acusações. “O Pnua não é responsável pela responsabilização pelo número de derrames em Ogoniland. Concentramo-nos na ciência. Os números referidos são os do Ministério do Ambiente e do Departamento de Recursos Petrolíferos”, disse o responsável.
Cowing negou que as Nações Unidas estejam a ser influenciadas pela Shell ou pelo Governo. “Nenhuma parte... será capaz de influenciar a ciência”.
Mas no Brasil, um outro caso que envolve o impacto ambiental da Shell teve um desfecho diferente. Desta vez, um tribunal em Paulinia, 120 quilómetros a Norte de São Paulo, condenou a Shell e a BASF (produtor de químicos) a pagar 490 milhões de euros pela poluição do solo e da água subterrânea por uma antiga fábrica de pesticidas, noticiou este sábado o jornal alemão "Frankfurter Allgemeine Zeitung". Ambas as empresas já reagiram dizendo que vão recorrer da sentença.
(Ecosfera, 23/08/2010)