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semi-árido
2010-08-17 | Tatianaf

Já não ouvimos mais falar em saques, frentes de emergência, intensas migrações, gado morrendo e outras tragédias nordestinas. O que mudou: o clima ou a realidade?

O clima não mudou e, se mudou, está mudando para pior. O semiárido está ficando mais quente, portanto, com mais evaporação de águas. As chuvas estão cada vez mais concentradas, caindo de forma diluviana, como os 400 milímetros em Alagoas e Pernambuco. O processo de desertificação está aumentando, embora seja controlável com políticas adequadas.

Esses dias, um técnico cearense disse que “esse ano choveu menos que na seca de 58 no Ceará”. Só ficamos sabendo por que ele nos contou. Entretanto, não foi preciso fazer “campos de concentração de migrantes”, como o Ceará fez na seca de 1932, para que os famélicos não invadissem Fortaleza.

O que mudou é fruto da sociedade civil, que desenvolveu a convivência com o semiárido. As simples cisternas para captar água de chuva para beber, para produzir, a agroecologia, a criação de pequenos animais mais adaptados ao clima, a criação de abelhas, as forrageiras para os animais. Até mesmo a conquista da terra é importante. Se ainda não chegamos ao ponto possível – talvez tenhamos feito uns 5% do necessário -, pelo menos descobrimos o caminho.

Outras políticas governamentais contribuíram, como o salário mínimo dos aposentados – fruto da luta social -, o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar, até mesmo o Bolsa Família. As tecnologias também – celular, internet, eletro-eletrônicos, etc. -, se expandiram com mais difusão da energia elétrica no meio rural. Sinal que, com um pouco de boa vontade, com políticas acertadas, a fome, a sede e a miséria podem ficar definitivamente para trás, mesmo com a piora das mudanças climáticas.

Falta disseminar para todos essas tecnologias simples e eficazes. Falta implementar as adutoras do Atlas do Nordeste, agora refinado para 1800 municípios. Falta uma reforma agrária adequada à região. Se quisermos sair para um desenvolvimento mais efetivo, falta uma educação contextualizada, o desenvolvimento das poderosas matrizes energéticas limpas da região – solar e eólica -, a preservação da caatinga, o combate à desertificação.

De fato, como disse Washington Novaes, a velha política não mudou, nem melhorou a situação do povo nordestino. Mas, essas políticas simples, sim.

Definitivamente, nossos problemas não estão no clima. Senão, a essas alturas já haveria uma multidão saqueando novamente os armazéns do Nordeste.

Roberto Malvezzi (Gogó), Assessor da Comissão Pastoral da Terra – CPT, é colunista do EcoDebate

(EcoDebate, 17/08/2010)


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