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direitos indígenas terras indígenas política indigenista
2010-08-11 | Tatianaf

Nenhum povo no Brasil foi tão dizimado como o dos índios. O homem branco já protagonizou a extinção de 90% dos nativos brasileiros, em disputas de terra principalmente. Passados mais de 500 anos de história, os indígenas ainda sofrem todos os tipos de violação dos direitos humanos, como mostra uma pesquisa divulgada recentemente pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), vinculado à CNBB.

Dos cinco a dez milhões de indígenas restaram pouco mais de 540 mil, 0,2% da população brasileira, pertencentes a 200 etnias. Cerca de 60% dessa população vivem no Centro-Oeste e Norte do país, onde estão concentradas 98,7% das terras indígenas. O outro contingente está confinado em apenas 1,3% da extensão das terras indígenas, no Nordeste, Leste e Sul do país.

O relatório do CIMI, produzido em 2009, mas só agora divulgado, mostra que esses povos ainda sofrem humilhações e preconceitos, praticados pela sociedade civil e por agentes públicos.

As violências mais comuns estão ligadas aos conflitos fundiários. Os índios são presos, torturados, assassinatos, têm seus acampamentos queimados, animais mortos e suas florestas desmatadas. O relatório aponta omissão do poder público nas áreas da segurança, educação e saúde indígena. Os resultados dessa omissão: mortes por desnutrição e epidemias.

Sobressaem os homicídios no Mato Grosso do Sul: 33 dos 60 casos registrados em 2009. A antropóloga Lucia Rangel, da PUC/SP, coordenadora da pesquisa, observa que a violência tem sido cada vez mais constante na vida cotidiana dos indígenas. “Ela não pode ser banalizada, nem encarada como normalidade”, adverte. Para o bispo Erwin Kräutler, presidente do CIMI, “os projetos desenvolvimentistas estão sendo construídos sobre os cadáveres dos indígenas.”

Pressão e opressão
No Rio Grande do Sul vivem cerca de 30 mil Kaingang, dois mil Guarani e 40 índios Charrua. O relatório do CIMI aponta casos de omissão e demora na regularização das terras, opressão policial, três assassinatos, terceirização e precarização do sistema de saúde. “A situação chegou ao extremo quando a Funasa rompeu com a ONG que prestava serviços de saúde, deixando 20 mil indígenas sem atendimento de urgência”, relata o CIMI.

A inconformidade fez com que, pela primeira vez, guaranis ocupassem a sede regional da Funai, em Passo Fundo, como forma de pressão – algo incomum para esses índios coletores, de atitudes pacíficas, ao contrário dos kaingang, de perfil caçador e guerreiro.

Um exemplo da morosidade é o processo demarcatório da Terra Indígena Rio dos Índios, reconhecida em 2004 como sendo da comunidade Kaingang. Desde então, a Funai não deu encaminhamento à próxima etapa, que seria a indenização e saída dos não-indígenas. Outro caso que gerou violenta repressão policial foi provocado pela construção de uma hidrelétrica, onde os Kaingang da Terra Indígena Votouro protestaram contra o alagamento da sua terra.

As maiores e mais populosas áreas indígenas em solo gaúcho estão no Norte e Noroeste do Estado, em municípios como Nonoai e Iraí. Na terra indígena da Guarita, onde há 13 aldeias – 11 kaingang e 2 guarani – que ocupam parte dos municípios de Tenente Portela e Redentora, estima-se que vivam sete mil pessoas em 23 mil hectares.

Cacique critica desassistência
O cacique kaingang Ari Ribeiro é um desconfiado, por natureza. Desconfia da imprensa porque pouco ou nada publica sobre as questões indígenas, e quando o faz é para criticar a distribuição de terras. Desconfia do modelo político no país porque considera excludente e sujeito a todo tipo de corrupção. Tem fala mansa mas não solta o verbo: “As políticas voltadas aos indígenas priorizam os interesses dos governantes, a Funai está totalmente desestruturada, a Funasa está passando por um dos momentos mais difíceis, projetos são superfaturados, os municípios não dão assistência alguma, falta saneamento”, critica o líder da aldeia da Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, onde vivem 180 pessoas de 34 famílias, em seis hectares.

Aos 45 anos, pai de três filhos, Kãjer (seu nome natural) veio de Nonoai para ficar mais próximo da cidade, estudou até o ensino médio e hoje divide seu tempo entre a venda de artesanato na rua José Bonifácio e o trabalho como conselheiro distrital de saúde.

Ele critica a demora na demarcação de terras: “Nossa principal questão sempre foi e vai ser a terra, porque com ela temos saúde, educação, autonomia. Só que os processos trancam por outros interesses. A terra indígena de Borboleta, na região Alto do Jacuí, por exemplo, há 20 anos que fazem estudos lá e até agora nada de reconhecimento. No Morro do Osso, o poder econômico ainda tentar ganhar a luta contra os kaingang que vivem aqui, em Porto Alegre, onde há 28 sítios arqueológicos indígenas comprovados.”

Ari recebeu a liderança de Felipe da Silva, 61 anos, o mais velho entre os 18 artesãos kaingang na Rua da Praia, perto da Praça da Alfândega. Também veio de Nonoai, faz 15 anos, onde plantava feijão, mas percebeu que 90 dias era muito tempo de espera para ganhar algum dinheiro, então resolveu trabalhar com artesanato, envolveu toda a família e há 12 anos vende no Centro. “Aqui dá para ganhar um dinheirinho todo o dia, porque a Funai não faz nada pela gente”, defende.

Legislação e culturas desconhecidas
Para a coordenadora do Conselho Estadual dos Povos Indígenas (CEPI), Sonia Santos, falta aos gestores públicos entendimento da legislação e dos costumes e culturas indígenas. “Nós não temos grandes programas voltados aos indígenas porque há falta de diálogo. Aí fica um embate sobre as competências, sobre o que é realmente necessário realizar. A maioria dos avanços que percebemos é resultante de esforços pessoais”, garante.
 
Mesmo ela, que coordenou por 12 anos a educação escolar indígena no Estado, acha que conhece pouco as comunidades. “Uma coisa que aprendi é que não se compara aldeias, mesmo sendo da mesma etnia, porque os índios têm suas especificidades”, ensina.
 
Embora a Constituição Estadual do RS seja uma das que contemple mais a questão indígena, falta colocá-la em prática, segundo Sonia. “A Academia tem uma produção intelectual boa, mas tem que levar esse acúmulo de conhecimento para ajudar a formular políticas públicas. Temos que evoluir muito no saneamento básico e na educação também, há escolas bilingues somente até a 4ª série nas aldeias, por isso poucos avançam até o ensino médio e chegam às faculdades”, explica.

Fundação desestruturada
A Fundação Nacional do Índio no Rio Grande do Sul é bombardeada por todos os lados. O coordenador técnico da Funai em Porto Alegre diz que o órgão está sendo reestruturado. O que se nota, no entanto, é que o trabalho da Funai está resumido à destravar processos de demarcação de terras e prestar alguma assistência social.

João Maurício Farias se vira como pode com um orçamento anual de R$ 300 mil. Diz que há grupos de trabalho (GTs) concluindo estudos. São antropólogos, arqueólogos e outros profissionais contratados temporariamente para avaliar os pedidos de reconhecimento de áreas indígenas. Ainda este ano está prevista a publicação de edital para analisar mais três áreas: Estiva, Lami e Lomba do Pinheiro.

E ainda tem que cuidar das demandas diárias, como o Guarani que quer dinheiro para ir a Torres visitar um parente no hospital, e o outro que precisa autorização para vender um cd de músicas gravadas com crianças. 

“Acho que a gente precisa melhorar bastante, mas estamos no caminho certo, com a gestão compartilhada com os índígenas. Também estamos estudando parcerias com o Ministério do Desenvolvimento Agrário e a Secretaria da Agricultura”, afirma. 

A quem compete a saúde
A Funasa é responsável pela atenção básica em saúde e de saneamento nas áreas indígenas mas é permanentemente cobrada para atender casos de urgência nas aldeias, serviço que compete aos estados e prefeituras, que recebem dinheiro para esse fim do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, vinculado ao SUS. 

No Estado, a Funasa possui 36 equipes de saúde que prestam atendimento em 45 postos instalados dentro das aldeias. São supervisionadas pela pedagoga Inajara Rodrigues, que acumula 20 anos de experiência junto aos indígenas, e pela médica Emilia Ueda.

Segundo Inajara, existem no Brasil 60,7 portadores de doenças para cada grupo de mil habitantes, o que já é considerado intolerável pela Organização Mundial de Saúde. Porém, entre a população indígena esse número sobe para 112,7. Entre as doenças mais comuns, destaca Ueba, estão as respiratórias e diarreicas, a hipertensão, a obesidade e o diabetes.

Ainda que a Fundação tenha registrado em 2009 queda da mortalidade infantil entre os indígenas do Rio Grande do Sul, de 99 (2003) para 26 em cada mil nascidos vivos, a saúde, sobretudo a desnutrição infantil, aliada à falta de terras adequadas, constituem seus maiores problemas.
 
De acordo com a engenheira sanitarista do órgão federal, Márcia Almeida, o PAC indígena investiu desde 2007 no Estado R$ 4,1 milhões em obras de saneamento – instalação de redes de abastecimento de água potável e de banheiros. Foram contempladas 46 aldeias e 6.530 pessoas. Esses números incluem ações ainda  não executadas este ano.

Ciência aliada à tradição
Claudemir Vaz e Zico da Silva têm mais em comum do que a origem indígena e os 27 anos de idade. Ambos cursaram faculdade no IPA e hoje trabalham na Funasa, supervisionando o trabalho de assistência à saúde nas 106 aldeias e 23 acampamentos no Estado. As equipes somam 111 agentes indígenas de saúde e 45 agentes indígenas de saneamento, dois enfermeiros e 16 técnicos de enfermagem.

Zico, Wera em guarani, é o primeiro da sua etnia a se formar enfermeiro no Estado. Ele mora no acampamento da Estiva, em Viamão, com a mulher Graciela, 30 anos, artesã argentina, e com as filhas gêmeas de sete anos, onde dividem sete hectares com outras 164 pessoas de 33 famílias.

Ele explica que nenhum procedimento de saúde é feito sem o conhecimento do médico tradicional, o pagé. “Ele tem a religiosidade e o contato com a natureza e nós oferecemos o conhecimento da ciência, um não anula o outro”, ressalta.

Claudemir se formou terapeuta ocupacional, e como muitos da etnia kaingang, optou por morar fora da aldeia. Reside no bairro Rio Branco, na Capital. Seus pais permanecem na Lomba do Pinheiro, onde ele acredita que os indicadores de saúde já apresentam melhorias devido à presença de indígenas nas equipes de saúde.

Assim como eles, outros índios estão frequentando cursos universitários a fim de melhorar a vida nas comunidades e garantir a seus descendentes o direito de desfrutar dos recursos naturais, pelo menos, dos que ainda estão ao alcance das comunidades.

(Por Cleber Dioni Tentardini, especial para o Ambiente JÁ, ExtraClasse, 11/08/2010)


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