A Dhesca Brasil -- ONG que reúne mais de 30 entidades não governamentais-- deve enviar em até dois meses um relatório para ONU (Organização das Nações Unidas) sobre os impactos de uma mina de urânio para a população de Caetité (BA).
O estudo é coordenado por Marijane Lisboa, da Relatoria do Direito Humano ao Meio Ambiente. Ela visitou o município (a 755 km de Salvador) na semana passada, onde promoveu uma audiência pública sobre o assunto.
Segundo Lisboa, a falta de informação adequada por parte das instituições envolvidas na extração do urânio é uma "grave violação do direito básico humano".
"Há o estigma de 'envenenamento' que atinge todos os produtos da região. A atividade rural também está muito prejudicada porque o abastecimento de água diminuiu desde a chegada da mineração na área", afirmou.
A conclusão do trabalho deve ocorrer em até dois meses porque ainda falta o retorno de informações solicitadas a órgãos envolvidos, como as INB (Indústrias Nucleares do Brasil) e a Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear), ambos ligadas ao Ministério de Ciência e Tecnologia.
Para a relatora, o papel de fiscalização do Cnen está "seriamente comprometido, já que não há o princípio geral da administração pública de que órgão fiscalizador não pode ser o órgão executor. A Cnen tem assento na INB".
Ainda segundo Lisboa, os estudos sobre a incidência de câncer na região deveriam ser revistos porque são baseados no registro do SUS (Sistema Único de Saúde).
"Esses dados são distorcidos por uma subnotificação estimada em 40%, já que não há no município sequer um Instituto Médico-Legal ou um centro de referência na prevenção do câncer", disse.
Em fevereiro deste ano, uma comissão da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica) visitou o município e concluiu que não há evidências de impacto ambiental fora da área da mina. O grupo também recomendou um monitoramento constante da água subterrânea da região.
Administrada pela INB desde 2000, a mina em Caetité é responsável pelo abastecimento das usinas Angra 1 e 2. Com Angra 3, a produção será triplicada até a inauguração da usina, prevista para 2014. O governo estuda ainda a instalação de mais quatro usinas nucleares, sendo duas no Nordeste.
Nesses nove anos, já ocorreram seis vazamentos --de substâncias diferentes-- na usina em Caetité. Em 2004, três municípios vizinhos registraram mortandade de peixes por causa de um vazamento de concentrado de urânio, tório e rádio.
Em outubro do ano passado, a ONG Greenpeace disse que a água do município estava contaminada por urânio, segundo análises de um laboratório no Reino Unido. Logo depois, a INB apresentou estudos oficiais que negavam a informação.
(Por Matheus Magenta, Folha Online, 03/08/2010)