As águas que circundam a Austrália e o Japão são as mais ricas em biodiversidade marinha do planeta, segundo um estudo divulgado ontem pelo Censo da Vida Marinha, um projeto internacional que tem como objetivo registrar e mapear o maior número possível de espécies dos oceanos.
Numa lista de 25 regiões inventariadas, o Brasil aparece em 13.º lugar, com 9.101 espécies conhecidas, comparado a quase 33 mil espécies na Austrália e no Japão (32.889 e 32.777, respectivamente). Em seguida vêm a China, com cerca de 22 mil espécies catalogadas, o Mar Mediterrâneo, com quase 17 mil, e o Golfo do México, com mais de 15 mil.
O baixo número de espécies catalogadas em águas brasileiras - comparativamente às de outras regiões oceânicas - se deve em parte a uma lacuna de conhecimento, principalmente com relação à biodiversidade de águas profundas. "Estamos muito atrasados nessa área", disse ao Estado o zoólogo Fábio Lang da Silveira, da Universidade de São Paulo. "Historicamente não tivemos os recursos nem a infraestrutura adequada para fazer os estudos necessários em águas profundas no Brasil."
Em águas mais rasas, situadas sobre a plataforma continental (até 300 metros de profundidade), o nível de conhecimento é maior, mas a biodiversidade é menor que a de outras regiões do próprio Atlântico, por se tratarem de águas tropicais, quentes e com pouca carga de nutrientes (baixa produtividade primária), segundo o pesquisador.
Silveira é presidente do comitê de gestores do Ocean Biogeographic Information System (Obis) para o Atlântico Sul Ocidental Tropical e Subtropical. O Obis é um dos principais bancos de dados criados pelo Censo da Vida Marinha, cujo relatório completo de dez anos de pesquisa será divulgado em outubro. Estima-se que o número final de espécies ultrapasse 230 mil.
O estudo, divulgado ontem e publicado na revista PLoS One, dá uma ideia da distribuição geográfica dessa biodiversidade marinha global, com ênfase em águas costeiras. Para chegar aos números, foi preciso consolidar milhares de trabalhos sobre biodiversidade marinha. "Só para o Brasil, utilizamos de 400 a 500 referências científicas", conta a pesquisadora Patricia Miloslavich, da Universidade Simón Bolívar, na Venezuela, uma das coordenadoras do estudo.
E ainda assim, diz ela, estima-se que tudo isso represente menos de 10% da biodiversidade real dos oceanos. "A Austrália é quem mais conhece sua biodiversidade marinha e ela só conhece 10%." O trabalho também faz um balanço das principais ameaças à conservação de cada região. "São informações essenciais, não só para cientistas, mas também para os tomadores de decisão", diz a pesquisadora. Num índice de ameaça de 1 a 5, a maioria das regiões teve média 3, incluindo o Brasil.
O peso da evolução
Outro fator importante para explicar a diferença na distribuição geográfica da biodiversidade marinha é a evolução. Os ecossistemas marinhos da Austrália, do Japão e dos Oceanos Índico e Pacífico, de uma forma geral, são muito mais antigos que os do Atlântico - que só começou a se formar na Era Mesozoica, quando o continentes da África e da América do Sul começaram a se separar e os dinossauros ainda reinavam sobre a Terra.
"O Oceano Atlântico é muito jovem em termos evolutivos", explica Patricia. O que significa que houve menos tempo - algumas centenas de milhões de anos - para que os processos de variação e seleção natural produzissem novas espécies.
(Por Herton Escobar, O Estado de S. Paulo, IHU-Unisisnos, 03-08-2010)