Uma das dificuldades dos fumantes que decidem largar o cigarro é não sofrer recaídas em ambientes como bares, baladas e restaurantes. Por causa disso, eles dizem que a lei antifumo, em vigor no estado de São Paulo desde 7 de agosto do ano passado, facilitou o tratamento de quem tenta deixar o vício. “Hoje, estou em um restaurante e não tenho que conviver com o cigarro. Isso ajuda a me manter firme”, diz o despachante Cláudio Pessoa Tunu, de 40 anos, que está há seis meses sem fumar.
A lei antifumo baniu o cigarro em ambientes fechados de uso coletivo em todo o estado. Com ela, está proibido o uso de cigarros, charutos e cigarrilhas no interior de bares, restaurantes, empresas, lanchonetes e boates. A psicóloga Juliana Batista, do Programa de Assistência Integral ao Fumante do Hospital do Coração (HCor), diz que houve um aumento de 40% a 50% no número de pessoas que procuram tratamento para largar o cigarro.
“O grande motivo do aumento dessa demanda é que não se tem mais lugares, não é mais livre. Os fumantes têm se sentido muito segregados por essa falta de espaço para fumar”, acredita a psicóloga. “Não é tão simples você ter que se deslocar do lugar onde você está [para fumar]”, completa Juliana. Os grupos do programa são formados por 5 a 10 participantes. Por causa do aumento da procura, o hospital abriu novos grupos e disponibilizou mais horários.
O despachante Cláudio Tunu fez tratamento no HCor. Ele fumou durante 22 anos e decidiu procurar ajuda pela preocupação com a saúde e para agradar a família. “Hoje o fumante se sente um pouco excluído. Estou bem firme no meu propósito e ajuda muito o ambiente estar livre do cigarro”, afirma. Tunu conta que já percebeu várias mudanças após largar o vício. “Muda tudo: o paladar, o gosto do alimento, a pele, os dentes, o cabelo, a disposição. Estou super satisfeito.”
A psiquiatra Célia Lídia da Costa, coordenadora do Grupo de Apoio ao Tabagista do Hospital A.C. Camargo, também percebeu um conforto maior entre aqueles que buscam tratamento. “Antes da lei, as pessoas que vinham ao tratamento se sentiam, durante os momentos sociais, excluídos. Hoje eles acham bacana, porque não é permitido para ninguém. Os que estão tentando parar se sentem bem com isso”, acredita.
Mudança de perfil
Célia da Costa percebeu, nos últimos anos, uma mudança no perfil dos que buscam ajuda para largar o cigarro. No início do grupo, em 1996, a maioria eram mulheres acima dos 60 anos e já com alguma doença provocada pelo cigarro, como câncer. Agora, há muitas pessoas nas faixas dos 20 e 30 anos. “Eles procuram porque sabem que o tabagismo faz mal, se sentem mais cerceados no dia a dia [por causa da lei], e acham mais prático procurar uma ajuda para parar de fumar”, afirma a psiquiatra.
É o caso do gerente comercial Francisco Ávila Neto, de 27 anos. Ele fumava desde os 13 anos e decidiu procurar ajuda no hospital. Está há três meses sem o cigarro. “Eu decidi que esse ano ia parar de qualquer jeito. Não existe nenhum fumante que não pense pelo menos uma vez por semana em largar o cigarro. Eu pensava todo dia”, diz o jovem. Neto afirma que tomou a decisão porque se preocupa com o futuro. “Eu não quero ser uma das pessoas que está sendo tratada de câncer lá [no A.C. Camargo].”
O contabilista Augusto Cezar Gegers Izabel, de 34 anos, começou o tratamento nesta semana. “Desde que meu filho nasceu, a ideia era parar de fumar para dar um bom exemplo. Dessa vez eu decidi procurar uma ajuda”, afirma ele, que tenta largar o cigarro há três anos – conseguiu, no máximo, por três ou quatro dias. O contabilista é fumante há 15 anos e também acredita que a lei ajudará em seu objetivo. “Se você está tentando parar e alguém fuma ao seu lado, é complicado.”
Para a psiquiatra do Hospital A.C.Camargo, a lei mostrou aos fumantes como eles eram dependentes do cigarro. “A pessoa é tão dependente daquilo que tem que descer e sair do local de trabalho. [A lei] deixa claro para a sociedade que é grave, sim, fumar. Não é questão de cercear liberdade”, afirma.
(G1, 02/08/2010)