Depois de décadas de preparação e pesquisas, os Estados Unidos abandonaram seu plano de armazenar resíduos nucleares na montanha Yucca, no Deserto de Nevada. Por outro lado, Finlândia e Suécia levam adiante seus próprios planos e pretendem colocar seu combustível esgotado em cilindros de ferro e cobre que serão enterrados em um leito de rocha.
A empresa finlandesa Posiva está construindo um vasto sistema de covas dentro de uma formação rochosa perto do complexo de energia nuclear Olkiluoto, no Golfo de Botnia, oeste do país. A firma acredita que o sistema de covas Onkalo seja capaz de armazenar de forma segura, pelo menos por cem mil anos, o combustível nuclear usado pelos geradores da Olkiluoto.
Quando o combustível é retirado do reator, e depositado em uma pilha de esfriamento, está muito quente e tem cerca de um bilhão de vezes mais radioatividade do que o urânio natural. Depois de cem anos, o combustível nuclear é cem mil vezes mais radioativo; após mil anos, cinco mil vezes, e depois de cem mil anos apenas 200 vezes mais radioativo do que o urânio natural.
Na ocasião, as substâncias naturais existentes na crosta terrestre produzirão, para cada quilômetro quadrado, mais decomposições radioativas do que um depósito de combustível nuclear como Onkalo. Porém, há um problema mais grave, que é ignorado pelas autoridades encarregadas pelo controle nuclear, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e as empresas de energia nuclear.
Entre os resíduos radioativos, existem também cerca de 20 ou 30 quilos de plutônio para cada tonelada de combustível nuclear usado. O plutônio pode ser separado do urânio por métodos químicos, desenvolvidos no Século 20. Cada país que possui combustível nuclear usado pode fabricar uma bomba atômica simplesmente dissolvendo as barras de combustível em ácido e extraindo o plutônio.
Outro método de fazer uma bomba é enriquecer a proporção do isótopo fissionável 235 no combustível de urânio. Isto é muito mais complicado porque os diferentes isótopos não podem ser separados por meios químicos. Quando os cientistas a serviço de Adolf Hitler tentaram isso na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), só conseguiram enriquecer o conteúdo do urânio 235 de 0,7% para 1,5% em um grama de gás hexafluoreto de urânio.
Como seriam necessários 400 quilos com um conteúdo de 20% de urânio 235 para fabricar uma pequena bomba nuclear, nem mesmo se aproximaram desse objetivo. Com plutônio poderiam ter conseguido em questão de meses ou semanas. A Finlândia, por exemplo, planeja enterrar 11 mil toneladas de combustível nuclear usado, suficientes para obter dezenas de milhares de bombas atômicas como a lançada sobre Nagasaki, em um sistema de covas cuja localização exata é de domínio público.
Além disso, o plutônio se torna mais perigoso, e não menos, na medida em que passam os anos. Quando o combustível nuclear é enterrado, contém entre 65% e 70% do isótopo 239, ideal para fabricar armas nucleares. Inclusive este tipo de plutônio usado em reatores pode ser empregado para uma bomba, mas outros exóticos de plutônio (238, 240 e 241) são causadores de uma série de complicações, embora tenham uma vida média mais curta do que a do 239.
Isto significa que o plutônio em um depósito de combustível usado se torna naturalmente enriquecido, convertendo-se primeiro em plutônio apto para armas, “de grau de armamento”, e depois em plutônio de grau de reator. Finalmente, se transforma em plutônio 239 quase puro e só uma minúscula quantidade é suficiente para a primeira fase de uma arma nuclear maciça de duas ou três fases.
Os Hitler, Stalin ou Gengis Kan do futuro buscarão sem descanso os depósitos de combustível nuclear gasto, com ajuda de geólogos, antropólogos, historiadores e aparelhos como espectômetros e contadores Geiger. Ter acesso a uma câmara do tesouro como Onkalo, depois de dez mil ou cem mil anos, permitiria fabricar um enorme arsenal nuclear e asseguraria o domínio do mundo a um futuro Hitler. É este o legado que queremos deixar para as próximas gerações?
(Por Risto Isomäki, Terramérica, Envolverde, 26/07/2010)