O agronegócio brasileiro ganhou uma linha de financiamento verde, incluída no Plano Agrícola e Pecuário 2010/2011. Ao todo, o programa Agricultura de Baixo Carbono (ABC) destinará R$ 2 bilhões para incentivar práticas adequadas, tecnologias adaptadas e sistemas produtivos eficientes que contribuam para a mitigação da emissão dos gases causadores do efeito estufa. Para o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Wagner Rossi, esta “será uma safra mais sustentável” e o produtor rural é o maior interessado na preservação da sua propriedade. “Assim se evita o assoreamento dos córregos e a erosão do solo. Não podemos confundir o agricultor com o destruidor da natureza”, ressalta.
No caso do Rio Grande do Sul, entre as atividades que mais devem se beneficiar com as medidas estão o uso do plantio direto na palha e a produção integrada lavoura-pecuária-floresta, iniciativas que vêm sendo desenvolvidas, mas que devem ganhar um impulso ainda maior. “Essa preocupação de plantar pensando no meio ambiente é antiga entre os gaúchos. Essa nova linha tende a incentivar ainda mais técnicas como o plantio direto”, acredita o presidente da Comissão de Grãos da Farsul, Jorge Rodrigues.
Com o ABC, o Ministério da Agricultura pretende ampliar, em dez anos, a área atual com uso do plantio direto em 8 milhões de hectares, passando de 25 milhões para 33 milhões de hectares. Esse acréscimo vai permitir, nesse período, a redução da emissão de 16 a 20 milhões de toneladas de CO2 equivalentes.
As áreas de 25 milhões de hectares de culturas que utilizam o plantio direto em todo o País são responsáveis pelo sequestro de pelo menos 13 milhões de toneladas de CO2 ao ano. Com a nova linha de crédito, os produtores terão acesso a esses recursos a taxas de juros baixas - aproximadamente 6% ao ano - e prazos de carência de até seis anos para começar a pagar. O programa financia a implantação e ampliação de sistemas de correção, adubação e implantação de práticas conservacionistas de solos, além da implantação e manutenção de florestas comerciais, recomposição de áreas de preservação ou de reservas florestais e outras práticas que envolvem uma produção sustentável.
Rodrigues acredita que os recursos disponibilizados pelo governo também sejam muito úteis para outros setores como suinocultura, criação de bovinos de leite e avicultura, em função dos dejetos oriundos dessas produções. O assessor de política agrícola e meio ambiente da Fetag, Alexandre Scheifler, aposta na nova linha como saída para incrementar a questão da pesquisa e fomentar iniciativas para desenvolvimento de projetos na área de biogás. “Os dejetos dos suínos são importante fonte de energia e também podem ser mais bem aproveitados como adubo orgânico”, defende o assessor da Fetag. Scheifler se lembra da situação de vanguarda do Estado cuja lei ambiental proíbe as queimadas e prevê desmatamento zero em áreas protegidas. “Só por essas medidas já houve reduções importantes nas emissões no Rio Grande do Sul.”
O programa ABC vai garantir recursos a agricultores e cooperativas, com limite de financiamento de R$ 1 milhão por beneficiário. O crédito terá taxa de juros de 5,5% ao ano e prazo de reembolso de 12 anos. Os principais gases que causam o efeito estufa são dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e clorofluorcarbonos (CFCs). O metano destaca-se dentre eles pela quantidade produzida e pela atividade na absorção do calor atmosférico.
Além da questão da preservação em si, essa novidade pode incentivar os produtores a ingressar nesse mercado, trazendo grandes vantagens comerciais, uma vez que bancos lançam linhas de financiamento e bolsas de valores apostam em leilões para negociar os créditos de carbono. “É possível que mais gente venha a acessar essa alternativa”, estima o coordenador de crédito rural da Emater, César Henrique Ferreira.
Integração entre lavoura, pecuária e floresta reduz a emissão de carbono
Outro mecanismo que garante a retenção de carbono no solo é o Sistema de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF). A técnica permite que agricultor alterne pastagem com agricultura e floresta numa mesma área, podendo dessa forma recuperar o solo, reduzir as emissões de gás carbônico (CO2) para a atmosfera e ainda incrementar renda. A meta do programa Agricultura de Baixo Carbono (ABC) é aumentar, na próxima década, a utilização do sistema em 4 milhões de hectares, reduzindo, neste intervalo, de 18 milhões a 22 milhões de toneladas de CO2 equivalentes.
Essa prática vem sendo desenvolvida por produtores gaúchos, a partir de uma iniciativa que congrega Emater e a Embrapa Trigo, que instituíram o projeto de Integração Lavoura Pecuária (ILPs), e também da utilização de forrageiras para a integração lavoura-pecuária-floresta na região Sul.
Esses sistemas mistos de exploração têm chamado a atenção pelas vantagens que apresentam em relação aos sistemas isolados de agricultura ou de pecuária, pela diversificação, rotação, consorciação e/ou sucessão das atividades de agricultura e de pecuária dentro da propriedade rural de forma harmônica, constituindo um mesmo sistema. Ele possibilita, como uma das principais vantagens, que o solo seja explorado economicamente durante todo o ano ou, pelo menos, na maior parte dele, favorecendo o aumento na oferta de grãos, de carne e de leite a um custo mais baixo. “Trata-se de uma alternativa que colabora para a manutenção das condições do solo, sem degradá-lo, reduzindo também as emissões de CO2”, assegura o assessor de políticas agrícolas e meio ambiente da Fetag, Alexandre Scheifler.
Um caso de sucesso na área de bovinos de leite vem sendo desenvolvido no município de Boa Vista das Missões, próximo a Passo Fundo. Ali, além de garantir pastagens para o gado nos períodos de escassez, os agricultores têm colaborado para preservar o meio ambiente, aumentando a produção de leite, permitindo a colheita de grãos após o rebrote da planta. De acordo com o técnico da Emater, Luiz Carlos Taffarel, são 36 produtores que fazem integração lavoura-pecuária, em uma área de 500 hectares. O trabalho se iniciou há quatro anos, com 30 hectares, mas a área tem aumentado ano a ano.
O agricultor Ivonei Librelotto, que tem uma área total de 111 hectares, diz que o marco da propriedade foi no ano de 2008, quando mudou a forma de gestão, adotando rotação de culturas como milho e soja no verão e trigo de duplo propósito e aveia branca no inverno. “Antes fazíamos o plantio direto na palha, mas sem rotação de culturas, com pouca palha e adubação incorreta e insuficiente. Tínhamos problemas de erosão, compactação de solo e falta de rentabilidade”, lembra Librelotto.
O sistema tem possibilitado à propriedade um lucro de mais de R$ 870,00 por hectare e a produtividade da soja, plantada após o trigo, fica em torno de 63 sacas por hectare. Para o gerente regional da Emater Passo Fundo, Oriberto Adami, os resultados obtidos são interessantes. “Essa prática tem permitido um melhor aproveitamento do solo durante o ano, melhora as condições físicas e biológicas do solo, reduz custos das atividades, aumenta e estabiliza a renda do produtor, entre outras vantagens”, analisa Adami.
Plantio direto está entre as técnicas mais eficazes
A técnica do plantio direto (PD), que dispensa o revolvimento do solo com grades e arados, ao fazer a semeadura direto na palha da cultura da safra anterior, está entre as que mais contribuem no sentido de capturar carbono, impedindo sua liberação na natureza.
A menor necessidade do uso de máquinas é uma das vantagens, pois fez diminuir a média de 70 litros de diesel para cerca de 20 litros do combustível para lavrar um hectare de terra. “Sem o plantio direto, era preciso cerca de 35ml de diesel para se colher 1 quilo de soja. Hoje, são apenas 9ml para esse mesmo volume de grãos”, explica o presidente da Cooplantio, Dirceu Gassen.
Outro benefício da técnica se refere à questão do manejo da terra, pois ao suprimir a necessidade de lavrar, o agricultor evita o processo de decomposição da matéria orgânica, a qual libera CO2. “Cerca de 50% da composição da palha é de carbono. Se não a retiramos, evitamos a emissão desse gás.” Gassen esclarece ainda que o solo é considerado uma esponja de carbono e que, ao deixar a palha, aumenta a superfície de absorção do mesmo.
A técnica de plantio direto surgiu tímida na década de 1990, época em que apenas 10% da área cultivada no Estado utilizava os recursos. Hoje, está entre as preferidas pelos produtores gaúchos. Atualmente, o Estado conta com mais de 80% da área semeada utilizando o conceito do PD. “Se estabilizou, mas acredito que com os recursos e mais conhecimento sobre a técnica, tenda a aumentar a adesão dos produtores”, disse Gassen. Outro benefício ambiental se refere à redução da erosão, melhorando a qualidade do solo e também dos mananciais hídricos.
O dirigente diz que ao contrário do que se imagina, as lavouras de arroz não podem ser consideradas como as principais vilãs no que se refere à emissão de metano. “Ela é uma das que mais emitem, mas também uma das que mais capta”, disse o presidente da Cooplantio.
Sobre a possibilidade de os produtores gaúchos aderirem à comercialização dos créditos de carbono, Gassen acredita ser difícil, pois falta organização nesse sentido. “Ainda não temos métodos desenvolvidos para medir o quanto se tem de carbono armazenado. E os custos para desenvolver essas técnicas são altos. Trata-se de um processo imaturo aqui no Estado.”
Para especialista, financiamento ambiental é contradição
A recente aprovação do texto principal do substitutivo do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), referente ao projeto que trata do Código Florestal, reacendeu o debate sobre a questão ambiental atrelada às práticas agrícolas. Para o especialista em Direito Ambiental Gustavo Trindade, ao aprovar as alterações propostas pelo parlamentar, a Comissão Especial da Câmara instaurou uma situação de contradição no País. “Como se aprovam mudanças tão prejudiciais ao meio ambiente no momento em que o governo federal libera recursos para os produtores reduzirem as emissões de carbono e se dedicarem a uma produção mais limpa?”, protesta o advogado.
Um dos temas controversos se refere à possibilidade de flexibilização do tamanho da área de preservação permanente na margem dos rios. O limite mínimo de manutenção ou recuperação da vegetação nativa, que podia ser reduzido pelos Estados até 7,5 metros nos rios mais estreitos, voltou a 15 metros. Mas isso ainda representa a metade do atual limite mínimo de proteção previsto na legislação. Além disso, as pequenas propriedades, com até quatro módulos rurais, não precisarão fazer a recomposição das áreas já desmatadas de sua reserva legal.
Nos espaços maiores, a recomposição florestal tem que ser feita em áreas do mesmo bioma e no prazo de 20 anos. Uma das polêmicas é que a pessoa que regularizar sua propriedade terá uma espécie de “anistia” das multas que sofreu por causa do desmatamento ou da não preservação da área de reserva legal.
O deputado Aldo Rebelo afirma que seu relatório tem a intenção de regularizar a situação de 90% dos produtores rurais brasileiros, que estariam atualmente na ilegalidade. A ideia é fazer uma consolidação das áreas que já estão em uso na agricultura e proibir o desmatamento nos cinco anos posteriores à promulgação da lei. Para Trindade, é importante desmistificar a ideia de que áreas de reserva legal são inexploráveis. “Isso não é verdade, apenas serão espaços para produção mais sustentável, com menos animais a pasto, por exemplo.”
A presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), senadora Kátia Abreu (DEM-TO), apoiou o parecer sobre o novo Código Florestal. Para a dirigente, o texto “reduz o quadro de insegurança jurídica no campo, um dos grandes problemas da agropecuária nacional”. Ela destacou como avanços questões como a isenção de multas para quem desmatou até julho de 2008. Lembrou que a legislação ambiental mudou nos últimos anos, o que gerou insegurança para os produtores rurais. “Até 2000, a reserva legal era de 50%. A partir de 2000, passou para 80% na Amazônia”, citou. A representante dos produtores rurais criticou o fato de Rebelo ter acabado com o poder dos governadores de legislar sobre o ambiente, passando à União a definição dos limites de Áreas de Preservação Permanente (APPs).
Foi retirada dos Estados a opção de reduzir a distância entre as margens dos rios e as plantações em até 7,5 metros. A redução ficou entre 15 e 30 metros. Para ela, os pequenos agricultores são os principais beneficiados pelo novo Código Florestal. “São pessoas que vivem em situação de pobreza absoluta. São pessoas que têm renda de até R$ 321,00 por mês. Essas pessoas ficaram isentas da reserva legal”, afirmou.
Centro de distribuição fortalece setor supermercadista
Os 120 supermercadistas da rede Unimax conseguiram erguer um centro de distribuição, na zona Norte de Porto Alegre. A estrutura, que já começou a funcionar, é um dos trunfos nas negociações com fornecedores em busca de preço e variedade. E mais: na guerra com concorrentes entre grupos nacionais e multinacionais, a possibilidade de armazenar maior quantidade de mercadorias fará muita diferença na gôndola.
Tanto que o presidente da Unimax, Moacir Cecatto, garante: “Temos batido muitas ofertas, com preços até abaixo dos grandes mercados.” Além de ter um CD próprio, as 126 lojas da rede também operam com cartão próprio, usado hoje em até 15% das vendas. Em 2009, a associação teve faturamento acima de R$ 400 milhões e ficou em segundo lugar no ranking da Associação Gaúcha de Supermercados (Agas).
Para 2010, Cecatto projeta crescimento de até 20% da receita e aumento de estabelecimentos no mesmo nível.
Segundo o presidente, os cinco anos de criação da central serviram para algumas lições. A organização participativa, na qual os associados interferem nas decisões, é uma regra seguida à risca pelo dirigente. “Alguns mercados deixaram outras redes para entrar na nossa por não terem espaço para opinar. Transparência é fundamental.” Para isso, reuniões mensais servem para a tomada de posições mais estratégicas.
(Por Ana Esteves, JC-RS, 26/07/2010)