No Pará, um exemplo clássico mostra o poder que as empresas multinacionais têm sobre governos. Com sete anos em funcionamento no Porto de Santarém, o terminal graneleiro da Cargill só agora teve o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) discutido numa audiência pública, ocorrida no último dia 14. Ou seja, o terminal da Cargill, segundo aponta o Greenpeace, foi inaugurado sem a apresentação do EIA e a realização de debates em audiências públicas.
De acordo com Raquel Carvalho, da Campanha da Amazônia do Greenpeace, a audiência é uma parte do processo de licenciamento e serve para a Secretaria do Estado de Meio Ambiente (Sema) colher subsídios que ajudarão no parecer que concederá ou não o licenciamento do projeto.
Raquel destaca que a audiência sobre o estudo do terminal contou com pessoas a favor e contra o empreendimento. "A comunidade está bem polarizada. De um lado, tem os sojeiros atraídos pelas terras baratas e a infraestrutura de escoamento do grão; de outro, há as comunidades que já ocupavam o local, pessoas ligadas à agricultura familiar, para as quais a expansão da soja é uma ameaça", afirma.
A integrante do Greenpeace comenta ainda que o Ministério Público do Pará apresentou, na ocasião, uma análise revelando várias falhas no estudo. "O MP vai entrar com inquérito policial para investigar fraude nos dados. Os [dados] apresentados no Estudo de Impacto Ambiental não correspondem com a realidade", destaca.
Para Raquel, o importante é verificar os efeitos da obra. "Agora é analisar a extensão dos impactos para ver como podem ser mitigados ou recompensados", declara. Além disso, a agrônoma mostra preocupação com os impactos que a ampliação do terminal poderá causar.
Isso porque a Cargill, cujo terminal de Santarém já possui um armazém com capacidade para 60 mil toneladas de grão, anunciou que ampliará o empreendimento com um novo armazém para mais 30 mil toneladas.
Segundo informações do Greenpeace, a construção do terminal da Cargill em Santarém aumentou a procura por terras para a produção de soja na região. Prova disso é que, de acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a produção de soja no Pará não ocupava mais do que 2,3 mil hectares em 1999-2000. Em 2003-2004, quando o terminal já estava em operação, o número de hectares para o plantio da soja saltou para 35 mil.
"Dois anos depois, ela estava sendo plantada em 79 mil hectares - prova que o Porto da Cargill de fato contribui para a conversão desenfreada do uso do solo", apontou a organização em reportagem divulgada na última quarta-feira.
Na matéria, Greenpeace ainda destacou a relação da expansão da soja na região com o desmatamento. "Entre 1999 e 2006, o desmatamento no estado pulou de 510 mil para 880 mil hectares anuais. Em Santarém e Belterra, municípios onde a ocupação da soja não passava dos 50 hectares em 2000 e onde crescia tanto mata virgem como floresta secundária em avançado estágio de regeneração, tombaram árvores em pouco mais de 80 mil hectares", afirmou.
(Por Karol Assunção, Adital, 17/07/2010)