Funcionários trabalham no setor de licenciamento de órgão ambiental
Até GPS e computador foram comprados em convênio com federação das indústrias, que diz querer acelerar licenças
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A Federação das Indústrias Estado do Pará paga, há quase quatro meses, os salários de técnicos que auxiliam o governo do Estado a decidir sobre a concessão ou não de licenças ambientais.
Elas são necessárias para, por exemplo, construir novas instalações ou extrair matéria-prima, como madeira e minério de ferro.
A relação entre Fiepa (Federação das Indústrias do Estado do Pará) e Sema (Secretaria Estadual do Meio Ambiente) foi oficializada por meio de um convênio, no valor de R$ 3 milhões.
Descrito como uma "cooperação técnica", na prática ele serviu para que 30 consultores ambientais de fora da Sema, supostamente escolhidos por ela, trabalhassem no licenciamento.
Eles atuam em conjunto com os servidores de carreira do Estado. Além da mão de obra, a Fiepa comprou veículos, GPS e computadores para a secretaria.
ACELERAÇÃO
A federação disse que as contratações servem para "acelerar" a aprovação das licenças e impulsionar a economia local -dependente dos recursos naturais.
Segundo o diretor-executivo da entidade, Ivanildo Pontes, a Fiepa recebeu reclamações de seus associados sobre a lentidão da secretaria, e por isso propôs o acordo.
Tanto a federação quanto a secretaria negam irregularidades. Dizem que a relação foi firmada com respaldo legal (leia texto à direita).
Mas especialistas em direito ambiental disseram que as contratações podem ser contestadas na Justiça.
"É uma situação bizarra. O licenciamento é um ato de polícia, e quem exerce poderes de polícia é o Estado", disse Erika Bechara, professora da PUC-SP.
Segundo Ana Maria Nusdeo, da USP, a relação fere o princípio da impessoalidade da administração pública.
A principal licença expedida após o convênio foi para a siderúrgica de Marabá, da mineradora Vale -a mais importante integrante da Fiepa.
A licença prévia para a obra saiu duas semanas após a oficialização do convênio.
CONTESTAÇÃO
Essa autorização é contestada em ação do Ministério Público Federal -que citou seis irregularidades no licenciamento feito pela Sema.
A siderúrgica, orçada em cerca de R$ 5,8 bilhões, é um dos principais trunfos da governadora Ana Júlia Carepa (PT) para tentar a reeleição.
Segundo ela e o presidente Lula, que pressionou a Vale para fazer o investimento, a obra é importante para que o Pará deixe de ser apenas exportador de minério de ferro, e passe a beneficiar o metal.
(Folha de São Paulo, 08/07/2010)