O governo espera a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) pelo Congresso para ingressar com novas ações na Justiça contra a indústria do tabaco. A ofensiva terá início assim que a lei for aprovada, o que deverá ocorrer nesta semana, antes do recesso de julho. O objetivo é obter o ressarcimento pelos gastos do sistema público de saúde com o tratamento de doenças decorrentes do fumo.
A expectativa é que a cobrança atinja bilhões de reais. Nos Estados Unidos, a indústria de cigarros pagou, nos anos 90, US$ 246 bilhões ao governo como indenização pelos gastos com o tratamento de pessoas que tiveram problemas por causa do uso do tabaco.
A Advocacia-Geral da União (AGU) ainda não tem uma estimativa precisa sobre o valor das ações no Brasil, mas acredita que pode ser muito alto. "Vamos verificar as despesas do Sistema Único de Saúde (SUS)", afirmou ao Valor o advogado-geral, ministro Luís Inácio Lucena Adams. Esse será o primeiro passo para o ingresso dessas ações. O segundo, continua Adams, é definir a responsabilização da indústria. O ministro reconheceu que o assunto é complexo, pois as empresas poderão cobrar provas de que as pessoas doentes utilizaram produtos de suas marcas. "A questão da responsabilização é bastante complexa, pois a indústria pode querer provas de qual marca de cigarro determinado doente tratado pelo SUS fumou ao longo da vida", disse Adams. "Mas o texto da LDO traz uma orientação programática para o governo e vamos cumpri-la", completou.
O texto a que o ministro se refere é o parágrafo 6º do artigo 50 do projeto da LDO: "A União tomará medidas judiciais cabíveis necessárias ao ressarcimento das despesas do SUS com o tratamento de usuários de fumo e tabaco". Uma vez aprovado pelo Congresso, ele terá de ser cumprido pelos advogados da União, numa atuação que será estratégica dentro do governo. "Para nós, o texto vai funcionar como uma diretriz", resumiu.
A AGU já atua no setor de fumo contra ações de empresas que pedem para serem liberadas da obrigatoriedade de veicular imagens de pessoas com doenças nos maços de cigarros. Nesses casos, a tendência, na Justiça, é a de decidir pela manutenção dessas imagens. Por outro lado, o Judiciário nega a maior parte dos pedidos de indenização feitos por fumantes contra as empresas. No Superior Tribunal de Justiça, a jurisprudência, nesses casos, favorece a indústria.
Caso seja aprovada, a LDO deverá ser contestada no Judiciário. Em nota ao Valor, a Souza Cruz avaliou que a medida é inconstitucional. Para a companhia, o SUS é custeado pela arrecadação de tributos, "cabendo ao Executivo a gestão desses recursos na execução de políticas públicas de saúde". "Além disso, a referida iniciativa também viola os limitadores constitucionais acerca do que pode ser contemplado nesse tipo de lei e fere o princípio da separação de poderes", completou a nota. A empresa disse que "os riscos associados ao consumo de cigarros são amplamente conhecidos pela população em geral, pela comunidade médica e pelo prórprio Estado que, ciente de se tratar de um produto de risco inerente, autoriza a sua fabricação e comercialização, mediante severas restrições regulatórias, ampla fiscalização e carga tributária historicamente elevada".
(Por Juliano Basile, Valor Online, O Globo, 28/06/2010)