“Agora com a discussão de Belo Monte as pessoas se esquecem que em Altamira tem mais de 100 mil pessoas que não têm água encanada e jogam todos seus dejetos no rio. Nem se compara com a poluição que a usina causará”. A polêmica declaração é do general Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, 7º subchefe do Estado Maior do Exército. Ele emitiu o que considera como as opiniões do exército sobre a Amazônia em entrevista coletiva recente, concedida a estudantes de Jornalismo de diversas faculdades de São Paulo.
Ao discursar sobre a importância estratégica da Amazônia para o Brasil, e sobre as atividades do exército, criticou o “politicamente correto" que, segundo ele, que é chefe do Estado Maior do Comando Militar da Amazônia, seria contra o desenvolvimento que beneficiaria a população da região.
O general defendeu que o leilão do dia 20 de abril seja visto com pragmatismo. A disputa para a construção de Belo Monte permitiu a contratação de um consórcio responsável pela construção da usina, apesar da mobilização por meio de campanhas e recursos judiciais de movimentos que atentam para os problemas que causarão a usina ao Rio Xingu.
“Belo Monte desalojará dois mil índios, mas há uma discussão técnica em relação a capacidade. Já faz quase trinta anos que se disputa a construção da usina”, afirmou o general Villas Bôas. Apesar de não citar os problemas que a usina trará ao meio ambiente, o general foi bem incisivo ao afirmar que em poucos anos teremos uma crise energética se fontes como Belo Monte não forem construídas.
Para exemplificar as mazelas que a falta de energia elétrica faz, contou que na cidade de Humaitá passará gasoduto em direção a Campo Grande (MS), e foi feita audiência pública sobre isso. Na ocasião, “um médico afirmou já ter feito cirurgia à luz de velas. Quero ver se vocês iam achar melhor não ter energia. Questão de pragmatismo”. Para o general, é ações como essa que impedirão que a Amazônia de ser destruída.
Influências externas
A origem do suposto pensamento "politicamente correto" que o exército tenta combater tem origem, segundo o general, no exterior. “De outros países saem pensamentos que vem sendo impostos ao pensamento brasileiro. O politicamente correto impede que solucionemos os problemas. Na década de 70 houve movimento contra produção de energia nuclear. Isso teve capacidade de impedir muitas construçoes. Já hoje os ambientalistas internacionais admitem que usina nuclear é algo recomendável”, argumentou.
“No Brasil tínhamos 6 milhões, hoje temos 4 milhões [de km² de floresta]. A Inglaterra vem hoje dizer que não podemos desmatar sendo que eles desmataram há muito tempo atrás. Uma outra abordagem dos mesmos dados, diz que as florestas brasileiras correspondiam a 10% do mundo, hoje correspondem a 22%. Ninguém tem autoridade moral pra nos por nos bancos do réu, somos autoridade em relação a isso”, defendeu.
Contudo, Villas Bôas não citou as empresas que serão beneficiadas com a construção de Belo Monte, nem os problemas de navegabilidade e dificuldade para os peixes, problemas alegados pelos movimentos sociais. Mas deu a entender que o desenvolvimento que o exército almeja beneficiará a população da Amazônia e para o Brasil. “Esqueceram que o ser humano faz parte do meio ambiente, a parte mais importante do meio ambiente”, afirmou.
Espécie ameaçada
“Se não tiverem condições, vão continuar desmatando. Tem um poeta de Belém que diz que a espécie mais ameaçada da Amazônia é o ser humano.” Como alternativa ao desmatamento, o general é a favor de adensamento populacional em centros urbanos, como o de Manaus. “A zona franca de Manaus é responsável pela preservação ambiental da Amazônia porque emprega 100 mil pessoas, que estariam vivendo da natureza. Dizer que a zona franca dá prejuízo é falta de visão estratégica. É uma análise só do vetor econômico”.
As regiões desmatadas que não “tem mais volta”, defende Villas Bôas, poderiam adensar pessoas. E o governo tem de planejar alternativas econômicas independentes da floresta.
O general recordou que no assassinato da freira Dorothy Stang em 2005, o exército se deslocou para Apuí, e com a vigilância as atividades econômicas, que costumavam ser ilegais, foram interrompidas, o que causou graves problemas para os habitantes locais. “Tem faixa na cidade de Altamira: ‘Por que o exército não vai para o Rio [de Janeiro] em vez de virem aqui?’. Perderam 60 mil empregos lá. O povo não sabe se a madeira é legal ou ilegal, ele não tem alternativa lícita. Pobreza é o pior problema ambiental", concluiu.
Segurança Nacional
“Nós perdemos concepção de segurança nacional”. O representante do exército compartilhou o absurdo da difamação da Escola Superior de Guerra, que hoje é conhecida como uma escola de torturadores, título que considera ofensivo e irreal. Pois Villas Bôas acredita que a Escola ao menos continua a se preocupar com um plano de desenvolvimento nacional, avançado e patriota.
“Abandonou-se a doutrina de segurança nacional. Perdemos capacidade de resolver problemas antes que eles acontecessem. Temos apagão nas estradas, no ensino, sem metodologia...”, lamentou. A saída? Se livrar das “amarras do politicamente correto”. E, de preferência, sem se render à ideologias -aconselhou aos jovens.
(Por Lia Segre, Envolverde/Revista Fórum, 24/06/2010))