Pela primeira vez em dez anos, os Estados Unidos avaliaram suas próprias ações para contribuir com o combate ao sobre tráfico de pessoas em seu território no relatório anual Trafficking in Persons (TIP) Report. No documento, o Brasil foi mantido pelo Departamento de Estado norte-americano em uma categoria intermediária (Tier 2), formada pelo grupo de países que "não cumprem totalmente os requisitos mínimos para a eliminação do tráfico, mas estão empreendendo esforços significativos para tanto".
Na mesma categoria ficou a maioria dos países sul-americanos e muitos dos europeus: Portugal e Suíça (destinos para escravos sexuais provenientes de vários países, inclusive do Brasil) e boa parte do Leste Europeu (região onde o tráfico sexual recruta um grande número de vítimas).
Os Estados Unidos se colocaram na companhia da maioria da Europa Ocidental no grupo das nações que reconhecem o problema e têm tomado medidas que cumprem com os padrões internacionais considerados necessários para erradicar o tráfico de pessoas. No ano passado, 23 países melhoraram sua classificação em relação à classificação do ano anterior, enquanto 19 países pioraram.
Na parte que trata do Brasil, o TIP avaliou que o país ainda não põe em prática as medidas necessárias para a erradicação do tráfico de pessoas, sendo a impunidade um dos principais problemas. De acordo com o documento, o Brasil é fonte de homens, mulheres, meninos e meninas vítimas de tráfico de seres humanos para exploração sexual forçada, dentro e fora do país, e fonte de homens para trabalho forçado em território nacional.
Segundo o texto, o Estado de Goiás é origem de muitas vítimas traficadas para o exterior, sobretudo para União Européia e Estados Unidos. Oficinas de costura na capital paulista são citadas, também, por receberem imigrantes ilegais da Bolívia, Paraguai e China - parte deles vítima de trabalho escravo.
Mesmo reconhecendo que o Brasil tem avançado, principalmente na legislação contra o tráfico de pessoas, o estudo destaca que as condenações contra acusados de tráfico sexual no Brasil caíram de 22 no ano retrasado (2008) para apenas cinco no ano passado.
A iniciativa brasileira de divulgar os nomes dos empregadores e empresas flagrados utilizando mão-de-obra escravo, a chamada "lista suja", foi elogiada pelo governo americano. O Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, que recebe denúncias de exploração sexual e maus-tratos contra crianças e adolescentes, também foi lembrada. De acordo com o relatório, o serviço recebeu mais de 12 mil denúncias de exploração infantil, entre elas 200 delas de tráfico de menores.
"Mais de 25 mil brasileiros adultos estão sujeitos ao trabalho escravo dentro do país, principalmente em fazendas de gado, madeira e mineração, cana-de-açúcar e grandes propriedades produtores de milho, algodão, soja e carvão vegetal", afirmou o documento. Um trecho do estudo destacou que "crianças foram identificadas como trabalhadores escravos na pecuária, mineração e na produção de carvão”. O governo brasileiro e a sociedade civil não trabalham mais com uma estimativa de pessoas em situação de trabalho escravo devido à dificuldade de mensurar o crime. O número mais utilizado é o de libertados dessa condição: mais de 37 mil pessoas desde 1995, quando foi criado o sistema público de combate à escravidão contemporânea para fins de exploração econômica no país.
Os Estados Unidos recomendaram ao Brasil aumentar os esforços para identificar e punir casos de tráfico de pessoas, incluindo funcionários públicos cúmplices nos crimes, ampliar a colaboração entre órgãos governamentais, empresas e entidades não-governamentais, e direcionar recursos para financiar a assistência e a proteção às vítimas.
Prêmio
O coordenador da Campanha de Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), frei Xavier Plassat, foi um dos nove selecionados pelo governo dos Estados Unidos para ser homenageado pela sua atuação no combate ao trabalho escravo e ao tráfico de pessoas. A premiação ocorreu aconteceu dia 14 de junho durante o lançamento do relatório, em Washington, com a participação da secretária de Estado, Hillary Clinton. A homenagem acontece anualmente e é organizada pelo Departamento de Estado, que escolhe indivíduos ao redor do mundo que se dedicam à luta contra o tráfico de seres humanos.
Além de Xavier Plassat, foram escolhidos, também, Aminetou Mint Moctar, da Mauritânia, Natalia Abdullayeva, do Uzbequistão, Linda Al-Kalash, da Jordânia, Ganbayasgakh Geleg, da Mongólia, Christine Sabiyumva, de Burundi, Sattaru Umapathi, da Índia, Irén Adamné Dunai, da Hungria, e Laura Germino, dos Estados Unidos. Os escolhidos geralmente são militantes de ONGs e movimentos sociais, legisladores, policiais e cidadãos empenhados em acabar com a escravidão contemporânea.
(Por Bianca Pyl, Repórter Brasil, 21/06/2010)