Seguindo a tendência de maior participação das cigarreiras na produção do tabaco, a Philip Morris Brasil (PMB) anunciou ontem estar assumindo contratos com 17 mil fumicultores que vinham plantando para a Alliance One e a Universal Leaf Tabacos. O acordo entre a fabricante de cigarros e as fumageiras prevê também a transferência de mão de obra especializada. Como a transação não envolve o repasse de instalações, a PMB estuda agora onde fará a compra do fumo em folha.
O anúncio de ontem teve um impacto modesto se comparado à bomba que era esperada por quem acompanha os bastidores do setor fumageiro, onde se especulava até mesmo a possibilidade de grandes fusões. No entanto, o passo dado pela PMB é considerado bastante significativo na busca pela verticalização, ou seja, da participação da cigarreira na produção de fumo. Conforme a estimativa de Dagoberto Lima, diretor de tabaco em folha da PMB, com a transferência dos contratos a cigarreira comprará direto de 10% dos fumicultores instalados no Sul do País.
A transferência dos contratos depende de aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), mas deverá estar concluída até o final de setembro. Desta forma, o acordo já valerá para a próxima safra. As empresas envolvidas não revelam os valores da transação, os quais, em parte, ainda estariam sendo definidos conforme as características individuais dos contratos. Cada fumageira está repassando 8,5 mil contratos.
A Universal revelou que isso representa 20% de sua produção no Brasil. Informou ainda que também foram repassados ativos, mas destacou que a negociação não deverá impactar seu balanço consolidado. Em nota, o presidente da Universal, Airton Hentschke, citou o processo como uma adequação “às mudanças das condições do mercado”. Já a nota da Alliance também cita o licenciamento, para a PMB, do seu software de gerenciamento de produtores e estoque.
Outros detalhes foram fornecidos durante entrevista coletiva concedida ontem por Dagoberto Lima e pelos diretores de operações e de assuntos corporativos da PMB, respectivamente, Roberto Seibel e Maurício Mendonça. Segundo eles, o objetivo da empresa com a transação é adotar um sistema próprio de gerenciamento da produção nas lavouras. “Pretendemos trabalhar direto com o produtor, aprimorando o sistema integrado e garantindo ainda mais qualidade e produtividade, obtendo mais fumo em menos áreas”, afirmou Mendonça.
Conforme Lima, a Philip Morris assumirá contratos de produtores localizados em uma faixa vertical, do Paraná ao Rio Grande do Sul. Segundo ele, o fumo produzido atenderá a 10% da necessidade global da cigarreira. Dessa forma, a PMB continuará comprando tabaco em folha da Alliance e da Universal.
PROCESSAMENTO
Além disso, as fumageiras também vão realizar o processamento do fumo produzido sob a batuta da Philip – como em uma espécie de terceirização. O sistema se tornará parecido ao adotado pela fabricante de cigarros nos Estados Unidos, onde a matéria-prima também é processada por outras empresas. De acordo com a nota da Alliance à imprensa, o contrato entre as empresas prevê “um acordo de processamento de longo prazo”.
Como parte do combinando, a PMB também empregará técnicos das fumageiras, especialmente instrutores – seriam 200 contratados. A Philip Morris se concentra agora em estudar como ocorrerá o recebimento do fumo. Segundo os diretores, a empresa avalia se vai criar pontos de compra ou se vai adquirir estruturas já existentes.
A nova fábrica que a cigarreira está construindo em Santa Cruz integra um projeto diferente, sem relação com o acordo revelado ontem.
Entenda
•• Pelo acordo, a Alliance One e a Universal Leaf transferem para a Philip Morris, cada uma, 8,5 mil contratos que mantinham com fumicultores, mediante aplicação do sistema integrado de produção.
•• Desta forma, a Philip Morris implantará seu próprio sistema de produção junto aos agricultores.
•• Mesmo assim, continuará comprando tabaco das fumageiras. O fumo produzido pela própria PM será processado pelas fumageiras e depois retornará à cigarreira.
Avaliações
Para o presidente do Sinditabaco, Iro Schünke, a transação fortalece o setor, por representar uma busca por maior qualidade. Ele também cita a preocupação que as cigarreiras têm adotado em questões sociais e em relação ao meio ambiente. “Além disso, o investimento mostra que a Philip Morris acredita no Brasil.”
Na opinião de Benício Werner, presidente da Afubra, a verticalização poderá beneficiar o produtor, que tende a receber mais com a eliminação de um intermediário – no caso, as fumageiras. “Resta apenas saber se cada fumicultor terá opção de escolher se aceita ou não a mudança”, observa.
(Gazeta do Sul, 22/06/2010)