Foi publicada no Diário Oficial da União a decisão do presidente Luis Inácio da Silva de criar as Unidades de Conservação marinhas preiteadas há mais de dez anos pelas entidades civis organizadas do Estado. Segundo os decretos publicados, a partir desta sexta-feira (18) estão criadas as Áreas de Preservação Ambiental (APA) Costa das Águas e o Refúgio de Vida Silvestre (Revis) Santa Cruz, no norte do Estado.
Barrada há anos em Brasília devido aos interesses industriais e políticos na região, a criação, segundo ambientalistas, foi uma espécie de moeda de troca apresentada pelo estaleiro da Jurong (que quer construir área de abrangência das áreas de conservação) para conseguir aval da população e do órgão ambiental para se instalar na região. Para a criação, suspeitam os ambientalistas, podem ter sido feitos redimensionamentos das áreas que deverão ser preservadas.
Ainda assim, a notícia é boa. E representa o pleito de pelo menos 14 ONGs capixabas e os estudos científicos realizados por mais de dez anos em uma região rica pela enorme diversidade biológica, favorecida pela variedade de espécies de algas calcárias e não calcárias e da fauna bentônica associada, pela ocorrência de manguezais e a região costeira frontal à zona marinha.
A APA Costa das Algas, que abrange os municípios de Aracruz, Fundão e Serra, terá o objetivo de conservar e garantir o uso sustentável dos recursos pesqueiros, organizando e ordenando as atividades pesqueiras e de conservação dos ambientes naturais através do seu Plano de Manejo.
Através do plano também serão ordenadas as atividades de extração ou coleta manual ou mecanizada de material rochoso, sedimentar bioclástico ou litoclástico, nódulos calcários, corais e algas calcárias por pescadores ou por pessoas jurídicas; a coleta manual de nódulos e algas calcárias arribadas em praias de interesse turístico; a realização de dragagens e as atividades de dragagem destinadas à mineração; e a possibilidade de realização de levantamento de dados sísmicos marítimos e instalação de dutos petrolíferos na APA.
Entretanto, ficarão permitidas na APA as minerárias sob competência de autorização ou não do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) e do órgão ambiental competente até a data da publicação do decreto.
Já o Revis Santa Cruz é uma Unidade de Conservação (UC) integral, também nos municípios de Aracruz, Fundão e Serra, com o objetivo de proteger, principalmente, os fundos colonizados por algas e outras espécies bentônicas, assim como as espécies migratórias que utilizam a área para alimentação, reprodução e abrigo. Os manguezais, a vegetação costeira e as formações importantes para a estabilidade da orla marítima, também deverão ter sua proteção garantida.
A UC deverá contribuir também para a recuperação dos recursos biológicos e para a sustentabilidade das atividades pesqueiras e extrativistas de subsistência e de pequena escala praticas pelas comunidades costeiras da região do entorno do Revis. Qualquer realização, implantação, construção, operação ou ampliação em áreas particulares integrantes do Revis só poderão ocorrer se compatíveis com os objetivos da unidade.
Tanto a APA quanto o Revis serão administradas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade - Instituto Chico Mendes, que deverá tomar as medidas necessárias para sua proteção e gestão.
Os dois decretos entraram em vigor nesta sexta-feira (18), data de sua publicação.
Pressão
Na última semana cerca de 320 ONGs ligadas à Rede de Organizações em Defesa da Mata Atlântica e ao Conselho Nacional da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica cobraram da ministra da Casa Civil, Erenice Guerra, e à minisstra do Meio Ambiente, Isabela Teixeira, a urgente criação de Unidades de Conservação de Espírito Santo e Bahia. O documento foi enviado à Casa Civil.
Estas áreas foram exaustivamente estudadas e discutidas com a sociedade, instituições pesqueiras, ONGs e poder público para sua efetivação e, segundo as ONGs, muitas vezes a criação das UCs foram adiadas por solicitação do próprio governo do Estado.
A última proposta apresentada sobre as áreas previa que o Revis tivesse a abrangência de 17.600 hectares, circundando a Rodovia ES-010, com exceção das áreas urbanizadas, e que a APA teria 114 mil. Os limites das UCs capixabas já foram alterados duas vezes para se adequar aos empreendimentos da região. Com a chegada da Jurong, estes limites podem ter sido ‘ajustados’ novamente, alertam os ambientalistas.
Em seu formato original, as áreas de preservação garantiriam a preservação de 174 espécies de peixes e 270 espécies de algas, entre as quais laminarias, 60 espécies de poliquetos (vermes marinhos), 69 de crustáceos e 152 espécies de moluscos.
O projeto de criação do Revis e da APA surgiu a partir de requerimento da sociedade civil ao Ibama em 2001 para criação de uma unidade de conservação na região. Os estudos foram coordenados pelo oceanógrafo Roberto Sforza, do Projeto Tamar/Ibama, e houve decisão de criar duas unidades, sendo uma delas de uso sustentável.
Na ocasião, as entidades exigiam a proteção da área, que se encontrava em franco processo de destruição.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 20/06/2010)