Os moradores de Praia Grande, no município de Fundão, estão insatisfeitos com a postura do estaleiro da Jurong na região, que será impactada pelo empreendimento. A informação é que o estaleiro, que pretende se instalar em Barra do Sahy, em Aracruz, vem evitando conversar com a comunidade após negar qualquer interesse de contratação de mão de obra na localidade e de garantia de qualidade de vida à região.
A reclamação, segundo os moradores, é que a região já vem recebendo pessoas interessadas em trabalhar no período de construção do estaleiro. No entanto, a região não possui infraestrutura para recebê-los.
“A Jurong chegou a conversar conosco e, em um primeiro momento, afirmou que seria contratada mão de obra local e garantida a infraestrutura para minimizar os impactos que causaria a região. Entretanto, na segunda e última reunião, afirmou que não tem interesse na região e que nada poderia fazer por nós”, ressaltou o presidente da Associação de Moradores de Praia Grande, Aldo Santos.
A região, segundo Aldo Santos, não possui banco, uma policlínica, escola de ensino médio, entre outros recursos para garantir a qualidade de vida dos moradores após o crescimento populacional previsto com a chegada do estaleiro à região. Segundo Aldo, a empresa reclama da falta de infraestrutura da região que ela mesma prometeu construir.
No município de Fundão, é sistemática a reclamação dos moradores quanto ao crescimento desordenado promovido por outros empreendimentos construídos em Aracruz. Eles reclamam que grande parte do fluxo de trabalhadores vai para a região.
“Hoje, temos na região três empresas atuando e um índice de violência jamais visto. Até estupros estão sendo registrados. E eu denuncio isso aqui não como associação, mas como morador, pai de família e cidadão capixaba. Não é possível que, com tantos incentivos dados a estas empresas, elas não possam garantir a qualidade de vida para um local em que elas geram tantos impactos. O impacto social e ambiental com a chegada da Jurong será sem precedentes, a região já está saturada”.
Na reigão, é consenso entre os moradores o crescimento da insegurança na região de Praia Grande, em Fundão, e principalmente em Santa Cruz e Barra do Sahy, no município de Aracruz, onde as empresas estão instaladas. Segundo Aldo, são incontáveis os problemas de infraestrutura sofridos nestas regiões, mas nada vem sendo feito.
Em resposta às reclamações, Aldo conta que a Jurong garantiu que vai construir galpões para abrigar os trabalhadores que vêm de fora do Estado para trabalhar na construção do estaleiro. Entretanto, a previsão é da chegada de até 6 mil trabalhadores, que na prática não poderão ser abrigados em galpões na área da empresa.
“Se dão tantos incentivos fiscais para estas empresas se instalarem, elas têm que garantir que a nossa vida aqui não vai piorar. Destes seis mil trabalhadores, se mil vierem para Praia grande, trarão junto com eles um fluxo que a região não comporta. Será um impacto ambiental e social sem precedentes à região”, disse Aldo.
Na Barra do Sahy, onde o empreendimento recebeu um terreno público para construir, ambientalistas também reclamam da falta de estrutura da região para receber os trabalhadores esperados pela empresa. Além disso, afirmam que há falta de estudos e definições sobre a instalação do estaleiro em Aracruz. Segundo eles, conforme prevê a legislação, para o licenciamento do empreendimento deveria ter sido realizado um Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) para garantir a qualidade de vida na região, mas isso não ocorreu.
Em Barra do Sahy, os pescadores reclamam ainda que nem o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) nem a empresa se manifestam sobre os questionamentos da comunidade.
Na prática, o estaleiro da Jurong possui Licença Prévia do Iema para se instalar na região. Mas, conforme denunciado pelas ONGs, tanto o laudo técnico do órgão quanto os alertas da sociedade e de ambientalistas foram ignorados para a emissão da licença.
Estaleiro
O estaleiro da Jurong tem sua implantação prevista para ocorrer em litoral rochoso constituído por concreções limoníticas (formações de arenitos), manguezais marítimos (manguinhos) e estuários com grandes extensões de manguezais preservados. É ainda local de reprodução de espécies raras e endêmicas (que só existem naquela região), área de distribuição e reprodução de espécies ameaçadas (cetáceos e quelônios) e situs geográfico de transição zoológica, botânica e geográfica de tropical para subtropical.
Na região, são registradas ocorrências de correntes ciclônicas de ressurgência, que, associadas à elevada biomassa de organismos plantônicos, cria condições especiais para reprodução da fauna, o que recebe o nome de Giro de Vitória.
Abriga bancos de algas calcárias e laminaria especiais, com flora considerada um ponto de alta diversidade, quando comparada com outros locais do litoral brasileiro, como Abrolhos. As entidades destacaram que, de todos estes situs no País, o mais importante é o do Espírito Santo, localizado entre Guarapari e São Mateus, sendo o de Aracruz o mais representativo.
Tamanha relevância ambiental fez com que há anos se iniciasse um debate sobre a necessidade de ser criada na região a Área de Proteção Ambiental (APA) das Algas e ainda o Refúgio de Vida Silvestre (Rebio) de Santa Cruz.
Entretanto, a criação das unidades vem sendo utilizada como moeda de troca entre governo e empresa para a efetivação do empreendimento sem o conhecimento das dezenas de ONGs propositoras do projeto de criação destas áreas.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 16/06/2010)