Um ofício do Ibama analisou o cumprimento do item do Projeto Básico Ambiental (PBA) que se refere ao Programa de Remanejamento das Populações e a adequação do tamanho das casas. Para a equipe não ficou claro no PBA a tipologia das casas e os critérios de composição familiar que definiriam o tamanho das residências no Núcleo Urbano de Nova-Mutum, que será parte da estrutura urbana do município de Porto Velho, em Rondônia.
O projeto urbanístico do núcleo, conforme informação da ESBR, não considerou o critério de composição familiar para os não proprietários – famílias que não eram donas dos imóveis que tiveram que deixar. Isso quer dizer que o número de membros dessas famílias não está sendo considerado para determinar o tamanho das casas a serem construídas. Pelo teor da nota do Ibama fica clara a injustiça que estão tentando impor aos remanejados. Continuar lendo sobre as falhas no reassentamento da população atingida por Jirau
O empreendedor não atendeu ao pedido do Ibama para que fosse considerada a composição familiar ao determinar o tamanho das moradias e o número de quartos em qualquer situação.
Como justificativa para o não atendimento da solicitação do Ibama a ESBR usou uma comparação tosca com o padrão do programa do Governo Federal, Minha Casa Minha Vida e sugere, ainda, que o reassentado pode fazer ajustes e aumentar a residência no futuro. Em resposta, o Ibama considerou que o programa do Governo Federal mencionado não era critério para se usar em remoção de populações atingidas e que era preciso lembrar que as pessoas estavam “sendo obrigadas a deixarem suas moradias, próprias ou não, em função da implantação do empreendimento”.
Não resta dúvidas que o imóvel tem que ser compatível com a composição familiar, tanto para os proprietários como para os não proprietários. A ESBR deve atender as populações atingidas e tentar mitigar ao máximo os impactos negativos causados pela construção da usina. Afinal, o fato é que as famílias estão recebendo muito pouco em troca de algo que lhes está sendo tirado, além do que não se deve excluir que merecem, como compensação, uma condição de vida muito melhor que a anterior. Um mínimo lhes é devido: a recomposição das condições estruturais e de qualidade de vida.
As famílias estão sendo violentadas por um projeto que alterará para sempre sua história, as formas de convívio social e o uso que fazem do seu espaço. Não satisfeitos com essa violência, se pretende que, além de deslocadas compulsoriamente, as famílias ainda sofram com a inadequação da moradia ao número de filhos e dependentes?
A infraestrutura do reassentamento, por melhor que seja, não será suficiente para que as pessoas superem a imposição de deixarem seus espaços.
Para entender um pouco sobre habitabilidade, conversei com o arquiteto Durval de Lara Neto, especialista em conceitos construtivos sustentáveis. Para ele os critérios de sustentabilidade em casos de reassentamento vão muito além de simplesmente construir uma moradia num terreno. O projeto deve contemplar em primeiro lugar o planejamento sustentável do meio urbano, levando em conta a topografia, vegetação, permeabilidade do solo e a inter-relação das moradias.
Ele explica que nos casos de reassentamentos é preciso respeitar em primeiro lugar os hábitos, a forma de uso do espaço e a adequação cultural das pessoas. A nova moradia deve estar em sintonia com o modo de vida e pressupõe conforto ambiental obedecendo aos critérios mínimos de salubridade, adequação térmica, ventilação, insolação.
Para Lara a padronização da habitação não faz parte da cultura dessas comunidades que acabam despidas da sua identidade. “A padronização arquitetônica dos reassentamentos é um violência contra a identidade cultural e social” , destacou. Está na hora de mudar os padrões estabelecidos para indenização das populações remanejadas e de se criar outros que levem em consideração uma arquitetura com várias tipologias para situações específicas regionais e locais.
A habitação tem que ser segura e durável, minimamente impactante, com materiais adequados ao clima local para dar conforto térmico. O arquiteto ressalta que para garantir a auto-estima das comunidades seria importante a integração da mão de obra local na construção das unidades habitacionais, a utilização de tecnologias tradicionais e o uso sustentável dos recursos locais.
O arquiteto defende que o ideal seria não criar projetos que demandem o deslocamento de populações; quando, infelizmente, isso acontece, deve ser utilizado como oportunidade para a melhoria de qualidade de vida, através do envolvimento das pessoas no processo, indispensável para estabelecer uma relação amistosa com o novo ambiente. Isso pode ser obtido com incentivos à criação de unidades de produção de materiais e elementos de construção fornecidos inicialmente para as obras do próprio projeto, e, depois, para o mercado de outros projetos e obras na região. Pequenos empreendimentos familiares que fabriquem blocos de solo cimento, tubos e caixas d’água de argamassa armada ou marcenarias para fazer caixilhos e portas podem criar renda sustentável de forma continua mesmo após a conclusão de obras como as do núcleo de Jirau.
“Não há limites para os esforços que devem ser empregados pelos responsáveis, Estado e empresas, para tentar minimizar as incertezas e inseguranças psicológicas geradas nas populações que sofrem os impactos de projetos como os das hidrelétricas Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira”, conclui o arquiteto Durval de Lara Neto.
(Blog Telma Monteiro, 10/06/2010)