O Supremo Tribunal Federal está prestes a julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) do Decreto 4887/2003, que regulamenta a titulação de terras quilombolas no País. O julgamento preocupa organizações que acompanham o tema e os quilombolas, pois além de dificultar o reconhecimento de novas áreas, poderá ainda, anular as titulações já feitas.
"Se o Supremo declarar a inconstitucionalidade, anulará [o decreto] desde o principio da sua edição. Um efeito que pode dar, que é o mais rígido, é dizendo que é inconstitucional e todo tipo de trabalho que foi feito com base nele [no decreto], desde 2003 até agora, tem que ser declarado nulo", explica Fernando Prioste, assessor jurídico da organização Terra de Direitos.
Caso essa medida mais extrema fosse adotada, acarretaria com a o aumento de conflitos no campo, gerados principalmente pela falta de definição das terras do país. "Todas as famílias vão perder essas terras e todo o dinheiro investido vai ser perdido. Vai voltar tudo para a situação anterior", argumenta.
Para tentar reverter a situação, diversas organizações divulgaram no dia 21 uma carta pedindo a realização de audiências públicas, antes da votação. "A audiência pública foi requerida para ser realizada nessa ADIN por todos, pela Advocacia Geral da União (AGU), pelo Estado do Paraná, pelo Estado do Pará e por todos os outros amicus curiae, que são os amigos da corte, que também entram no processo e que defendem a titulação dos territórios quilombolas e a manutenção do decreto", explica Fernando.
ADIN
A titulação de terras quilombolas atualmente obedece ao decreto 4887, de 2003, foi considerada por antropólogos, juristas e especialistas um avanço para o reconhecimento e valorização das comunidades remanescentes de quilombolas. Ela está sendo questionada por uma ADIN impetrada em 2004 pelo Partido da Frente Liberal (PFL, atual Democratas). O julgamento da ADIN ainda não tem data, mas pode acontecer brevemente.
Caso o decreto seja revogado, a titulação passa a obedecer ao antigo Decreto 3912, de 2001, que somente reconhecia como terras quilombolas as que "estavam ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos em 5 de outubro de 1988", além de atribuir a função de iniciar, dar seguimento e concluir o processo administrativo de identificação dos remanescentes das comunidades dos quilombos à Fundação Cultural Palmares (FCP). Atualmente o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) realiza essa função.
Uma das características do decreto 4888 é que a caracterização dos remanescentes das comunidades dos quilombos é atestada mediante autodefinição da própria comunidade e que, segundo o decreto, possuam uma "trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida".
(Por Aldrey Riechel, Amazonia.org.br, 02/06/2010)